
Escreveu livros de literatura fantástica e de contos, como
Escreveu livros de literatura fantástica e de contos, como
I - TORRÃO
Desde que cheguei a Fortaleza no início da década de 1980 foram pouquíssimos os feriados que passei na cidade. No início de estudante secundarista ia com a mochila pronta pra última aula, dali pra estação João Felipe ou Rodoviária dos Pobres no Antônio Bezerra. Só retornava no último dia de férias, com lágrima nos olhos... uma saudade imensa do torrão natal, da comidinha da mãe, do zelo do pai, da zoada dos irmãos e futebol com os primos. A cidade grande sempre foi um exílio, apenas um exílio... quem é do interior vai morrer sendo do interior; mesmo que não reste mais um parente vivo, um amigo de geração... E ainda hoje, quando chega um feriado, me pego juntando as melhores roupas, o tênis menos gasto e arrumando minha mala imaginária. Ainda não me acostumei. Nunca vou me sentir daqui. (Dia desses, visitando meu torrão natal, um velho amigo me disse desolado que só voltava lá pra se desiludir mais uma vez de que a cidade nossa de infância não era mais a mesma, "jamais vai ser a mesma"... Não tive outra escolha senão concordar com ele: ela só existe em nossas lembranças… Em nossas boas lembranças)
II - BAIRROS
Com o tempo passei a perceber que os bairros funcionam como cidadezinhas do interior. Quem é do Montese (eu já fui) às vezes passa anos sem ir a Fortaleza, isto é, ao Centro ou aos outros bairros, quem é da Piedade (ou melhor, Joaquim Távora, também do Mucuripe...) Como mudei bastante de bairro durante estes 30 anos de exílio, conheci quase todos eles. Vão se formando pequenas castas e diversos locais, vão se aglomerando por afinidades ou apenas por oportunidades. Aqui no meu distrito da Gentilândia, capital da cidadezinha do Benfica, tem-se as castas mais variadas: a das senhoras que fazem ginásticas na praça de tardinha (entre elas se inclui o prefeito do bairro, o magricelo jornalista Tom Barros, e um que outro senhor menos machista), a dos sofredores que torcem Ferroviário, Ceará ou Fortaleza do Bar do Manoel (antigo reduto do Seu Luis Picas), a dos frenquentadores do saudoso Bar do Chaguinha, a fauna diversa do Bar do Assis e outros mais, a dos esforçados ginastas da Academia do Big, a das senhoras que tiram o terço de casa em casa, a dos bebuns inveterados (cujo patrono maior foi Zé Bolero, que recentemente entregou o cajado pro Pelezinho), a dos que fazem o Carnaval, a dos que apenas se sentam nas calçadas... Há até a dos que trabalham (pasmem!)... Acreditem, pois: também se trabalha na Gentilândia!
III - VIZINHANÇAS
Na contramão de toda a propalada globalização, humildemente proponho que cada vez mais sejamos regionalistas, bairristas!... Ainda mais: "ruístas", que cada vez mais nos apeguemos ao aconchego dos mais próximos, do vizinho do lado, do camarada do quarteirão, do vendedor de loterias, do entregador de gás... A impressão que temos é a de que ao tentarmos ser universais nos tornamos vazios, ao querermos ser cada vez mais cidadãos do Estado, do País, do Mundo... mais e mais nos fragmentamos, nos tornamos ninguém... Adoro quando alguém se refere a outro como sendo aquele, sim, aquele gordinho lá da Francisco Pinto, sim, aquele careca que só anda de boné. E cada dia mais detesto quem se refere a alguém pelo título hierárquico, pela "famosa" profissão... Sejamos, amigos, portanto, mais intimistas, menos sofisticados... mais compadres que sócios. Amem! Amém!
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