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Qual candidato se habilita a agir como Graciliano Ramos?
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Plínio Bortolotti integra do Conselho Editorial do O POVO e participa de sua equipe de editorialistas. Mantém esta coluna, é comentarista e debatedor na rádio O POVO/CBN. Também coordenada curso Novos Talentos, de treinamento em Jornalismo. Foi ombudsman do jornal por três mandatos (2005/2007). Pós-graduado (especialização) em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Qual candidato se habilita a agir como Graciliano Ramos?

Graciliano Ramos está entre os melhores escritores do Brasil (na minha opinião, o maior deles), fato de conhecimento mais ou menos geral. Mas pouca gente sabe que ele também foi um prefeito sem igual nos parcos dois anos no comando da prefeitura de Palmeira dos Índios (AL), entre 1928 e 1930.

Lição para os políticos
Nesse período - na época era preciso prestar contas ao governador do Estado -, Graciliano legou-nos dois relatórios cuja verve já demonstravam o escritor incomparável que viria a ser. Nos documentos ele expõe o seu método de trabalho, muito avançado, mesmo passados mais de 90 anos, e que deveriam servir de lição para os políticos de hoje.

Aumento da receita
No primeiro ano de mandato Graciliano aumentou em 43% a receita prevista para o município. Para conseguir o feito, agiu deste modo: “Não empreguei rigores excessivos. Fiz apenas isto: extingui favores largamente concedidos a pessoas que não precisavam deles e pus termo às extorsões que afligiam os matutos de pequeno valor, ordinariamente raspados, escorchados, esbugrados pelos exatores”. Quanto às “lamúrias, reclamações, ameaças, guinchos e coices” recebidas dos queixosos: “Fechei os ouvidos, deixei gritarem, arrecadei 1:325$500 de multas”.

Munícipes que não reclamam
O estilo do relatório nada tem a ver com documentos burocráticos: “Pensei em construir um novo cemitérios, pois o que temos dentro em pouco tempo será insuficiente, mas os trabalhos a que me aventurei, necessário aos vivos, não me permitiram a execução de uma obra, embora útil, prorrogável. Os mortos esperarão mais algum tempo. São os munícipes que não reclamam”.

Palmeira dos Índios
Assim, mestre Graciliano revolucionou a pequena Palmeira dos Índios: limpou a cidade, proibiu a criação de animais soltos nas ruas, investiu em bairros pobres, melhorou a educação e abriu estradas. De quebra, confrontou a corrupção: “Dos funcionários que encontrei em janeiro do ano passado restam poucos: saíram os que faziam política e os que não faziam coisa nenhuma. Os atuais (…) cumprem suas obrigações e, sobretudo, não se enganam em contas”.

Animais soltos
Ele tinha consciência do resultado de suas ações: “Se a minha estada na Prefeitura por esses dois anos dependesse de um plebiscito, talvez eu não obtivesse dez votos”. E ainda: “Perdi vários amigos, ou indivíduos que possam ter semelhante nome. Não me fizeram falta.”

Para Graciliano, o interesse público estava acima de questões pessoais e familiares. Ele não perdoou nem mesmo o pai, multado por deixar animais soltos, proibido pelo código de posturas do município. O velho foi queixar-se na prefeitura e ouviu a reprimenda do filho:

– Prefeito não tem pai, a lei vale para todos.

Algum candidato se habilita a agir como Graciliano?

Duvido que tenhamos algum político que, pelo menos, se aproxime dos métodos e da ética do velho Graça.

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PS. Trechos deste texto foram reproduzidos de um artigo publicado em meu antigo blog.

 

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