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Os jovens de hoje são "quase velhos caretas"
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Plínio Bortolotti integra do Conselho Editorial do O POVO e participa de sua equipe de editorialistas. Mantém esta coluna, é comentarista e debatedor na rádio O POVO/CBN. Também coordenada curso Novos Talentos, de treinamento em Jornalismo. Foi ombudsman do jornal por três mandatos (2005/2007). Pós-graduado (especialização) em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Os jovens de hoje são "quase velhos caretas"

Segundo a pesquisadora Laura Bates, atitudes misóginas, antiquadas e obsoletas em relação às mulheres e meninas, "tornaram-se mais comuns entre os jovens do sexo masculino"
Campanha quer mobilizar sociedade contra misoginia (Foto: )
Foto: Campanha quer mobilizar sociedade contra misoginia


Neste fim de semana recebi uma mensagem do meu amigo Saraiva Jr., articulista eventual do O POVO (recomendo), com um link levando a uma declaração atribuída ao músico e compositor argentino Fito Páez. Em uma rede social ele, supostamente, se diz preocupado com o alto nível de domesticação e conservadorismo dos jovens, que os torna “quase velhos caretas”.

Não encontrei registro de que Fito Páez tenha se expressado sobre o assunto com essas exatas palavras. Entretanto, considerando-se que ele é um artista progressista ou “de esquerda”, é possível que ele tenha opinião parecida. Mas, levando-se em conta que “careta” é uma gíria da década de 1970, é possível que a frase seja de autoria de algum velhinho revolucionário, que convocou o nome de Fito Páez para dar-lhe mais autoridade. :)

E, de qualquer modo, serve à reflexão.

Por coincidência, logo depois da conversa, deparei com a seguinte reportagem no O POVO/BBC: “Pela primeira vez na história, o machismo é maior entre os mais jovens”, segundo análise da pesquisadora Laura Bates, “uma das principais vozes do feminismo no Reino Unido”.

“Isso é algo que nunca tínhamos visto. Ao longo de décadas, a parcela da opinião pública que lamentavelmente tem noções do tipo ‘lugar de mulher é na cozinha’ sempre se concentrava entre os mais velhos”, diz ela.

Segundo Bates, diferentes estudos mostram que as atitudes misóginas, antiquadas e obsoletas em relação às mulheres e meninas, “tornaram-se mais comuns entre os jovens do sexo masculino”.

Ela fala com a experiência de quem já escreveu vários livros sobre o assunto, como omo “Fix the system, not the women” (Conserte o sistema, não as mulheres); “Men who hate women” (Homens que odeiam as mulheres); Girl Up algo como 'empodere-se como garota'); Misogy nation (Nação misógina); e “The new age of sexism" (A nova era do sexismo).

Para a escritora, sempre houve reações conservadores à luta pelo direito das mulheres e por justiça social. No entanto, agora, trata-se "de uma geração de jovens que acessa determinados sites, aplicativos e outros ambientes online com algoritmos incrivelmente poderosos e treinados para servir conteúdos cada vez mais extremistas".

O avanço do conservadorismo e das ideias de extrema direita também podem ser observadas na política.

Estudo da agência internacional de pesquisas Glocalities (2024) mostra que aumentou o desespero e a desilusão dos jovens com a política tradicional. Essa é uma das razões que explica o crescimento do conservadorismo, principalmente entre os homens mais jovens. As informações foram publicadas pela agência Reuters

O estudo avaliou 20 paíes, incluindo o Brasil, apontando que “sentimentos de desesperança, desilusão social e revolta contra os valores cosmopolitas explicam em parte a ascensão de partidos radicais de direita contra o establishment”, afirmou Martijn Lampert, chefe de pesquisa da Glocalities, citando eleições em vários países europeus.

Segundo Lampert, os algoritmos das mídias sociais têm ampliado a tendência ao atrair “jovens moderadamente conservadores para modelos e visões de mundo masculinos conservadores mais extremos e radicais”.

No Brasil o fenômeno também pode ser observado na política. Na eleição de 2022 foi eleita uma leva jovens deputados de extrema direita, uma "nova" geração de políticos que defende o autoritarismo e a misoginia do discurso do ex-presidente Jair Bolsonaro. Esse segmento usa principalmente as redes sociais para difundir suas ideias de extrema direita de modo eficaz, conseguindo milhões de seguidores.

Voltando à conversa virtual que mantive com Saraiva Jr., lembrei a ele que, em uma de suas entrevistas, perguntaram para o dramaturgo Nelson Rodrigues qual conselho ele daria aos jovens. Ele, na lata, “envelheçam!”

Foto do Plínio Bortolotti

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