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A forofa, a ostentação e os algoritmos: o legado da GKay
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Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha

A forofa, a ostentação e os algoritmos: o legado da GKay

O que fica visível nesses encontros é que a ostentação junta-se aos algoritmos e o resultado é esse monstro que se chama indiferença.
Tipo Análise
Farofa da Gkay acontece novamente em Fortaleza (Foto: Reprodução/Instagram@afarofadagkay)
Foto: Reprodução/Instagram@afarofadagkay Farofa da Gkay acontece novamente em Fortaleza


Nunca saberia da Farofa da GKay se não fossem os comentários incessantes em praticamente todos os lugares desta cidade. Ainda no sábado, enquanto a moça lixava minhas unhas, o assunto seria a festa que começaria domingo e que reuniria meio mundo. Até terça, caixas de supermercados, os vizinhos, os porteiros, os motoristas do Uber, todos estavam ligados na festa de três dias. Fiquei curiosa.

O que seria GKay, meu Deus? Era gente? Empresa? Um novo voo ao espaço, a partir de Fortaleza? Um carnaval fora de época para convidados exclusivos? Festa de três dias me remete a algumas comemorações populares tipo carnaval mesmo ou a cavalhada – com aquele ritual da luta entre cristãos e mouros – ainda comemorada no Brasil, pelas bandas de Goiás. Também pensei nas festas da Grécia antiga que marcavam o início da primavera e festejavam o deus grego Dionísio e que duravam três dias com direito a desfiles abertos, concursos de quem bebia mais rápido o vinho numa vasilha chamada choé, sacrifícios e oferendas aos deuses.

A festa da influencer Gessica kayane acontece desde 2017 e, pelo que eu li, se tornou um dos eventos mais “esperados do ano”. (Sério?) Ou seja, eu passei quatro anos para saber que ele existia, (mas esse é um problema meu). E comemora apenas um aniversário. Coisa simples. Reúne a nata dos influencers e youtubers e artistas pop. Tudo de graça para os convidados. Os sites de fofocas garantem que a conta deve ter ficado em torno de R$ 2,8 milhões, ou seja, cerca de R$ 933 mil por dia.

Fiz uma busca no Google por festas de três dias no mundo e descobri que é tendência. Em plena pandemia, o jogador Gabigol abriu o ano de 2021 com uma festança de três noites. Há menos de um mês, o casamento de Paris Hilton com o milionário Carter Reum também durou três dias.

Durante a pandemia do coronavírus iniciada em 2020, muito futurólogo apostou que o evento mundial, que dizimou só no Brasil mais de 600 mil pessoas, iria aperfeiçoar o humano contemporâneo, dando-lhe mais consciência, maior empatia, melhor disposição com o outro. Nunca acreditei nessa bobagem. E as festas dionisíacas de agora demonstram bem isso. Aliás, festas clandestinas durante o auge dos decretos de distanciamento social levou ao cancelamento de muita gente.

O que fica visível nesses encontros é que a ostentação junta-se aos algoritmos e o resultado é esse monstro que se chama indiferença. Nasce como qualquer humano, prenhe de uma falta extrema, que se amplia como uma barulheira sem fim. Não há milhões de dinheiro que deem conta disso. E a vida segue até a farofa seguinte. Ou até a próxima peste.

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