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O que une o Chico, de Xapuri ao Bruno, do Javari
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Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha

O que une o Chico, de Xapuri ao Bruno, do Javari

Chico Mendes se tornou ícone da luta contra o desmatamento da Amazônia. Ganhou dois prêmios internacionais, mas só ficou conhecido no Brasil após sua morte. Bruno Pereira trabalhou por quase 20 anos na Funai e lutava contra a devastação da Amazônia
Tipo Análise
O nome de Chico Mendes é reconhecido internacionalmente por seu ativismo. (Foto: Agência Brasil)
Foto: Agência Brasil O nome de Chico Mendes é reconhecido internacionalmente por seu ativismo.

O jornalista Zuenir Ventura começa o texto do livro "Chico Mendes, Crime e Castigo" confessando seu desconhecimento com o território para onde havia sido enviado a fim cobrir as consequências da morte do líder ambientalista Chico Mendes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, assassinado no dia 22 de dezembro de 1988.

Ventura desembarca no Acre no início de 1989 para uma série de reportagens sobre o homem que ficou conhecido como “herói dos povos da floresta” e havia sido condecorado pela ONU com o prêmio Global 500, em 1987, como reconhecimento pela sua luta contra o desmatamento da Amazônia desde os anos de 1970.
Chico Mendes morreu na porta de casa, em Xapuri, a cerca de 170 km de Rio Branco, capital do Acre. Tinha 41 anos quando foi assassinato por Darcy Alves da Silva, a mando de seu pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva. Em entrevistas, Chico Mendes havia denunciado várias vezes ameaças contra sua vida.

Zuenir ganhou o prêmio Esso com as reportagens e mostrou ao Brasil a Amazônia pela qual Chico Mendes lutava. Os assassinos foram presos, fugiram da cadeia, foram recapturados, cumpriram suas penas e voltaram a viver em Xapuri. Quinze anos mais tarde, Zuenir retorna a Xapuri e retoma a história para o livro "Chico Mendes, Crime e Castigo''.

Dom Phillips e Bruno Pereira, jornalista e indigenista mortos na Amazônia(Foto: Arquivo Pessoal / Reprodução )
Foto: Arquivo Pessoal / Reprodução Dom Phillips e Bruno Pereira, jornalista e indigenista mortos na Amazônia

A leitura desse livro se mostra muito atual diante do crime perverso cometido contra o indigenista Bruno Pereira, 41 anos, e o jornalista britânico Dom Philips. Também revela, de forma drástica, como o Brasil retrocedeu quanto ao meio ambiente e deixa cristalino que o discurso soberanista do presidente Jair Bolsonaro significa o abandono legal da Amazônia para consolidar práticas ilegais que afligem o ecossistema da floresta e os povos que ali habitam.

Em comum, Chico e Bruno tinham à sua frente uma luta insana, que travavam diante da indiferença da gorda maioria dos brasileiros. Chico era um desconhecido no Brasil tanto quanto Bruno até morrerem tragicamente. Ambos estavam na casa dos 40 anos e fizeram suas escolhas 20 anos antes. Ambos haviam denunciado as ameaças que sofriam. Ambos foram ignorados.

O agravante é que enquanto Chico Mendes atuava num sindicato de trabalhadores, Bruno era um agente do Estado, de licença, para poder fazer o trabalho que o órgão no qual era concursado – a Funai – deveria estar realizando.

Numa entrevista concedida à "Folha de S. Paulo" em abril deste ano, Bruno detalha os níveis de desmonte e abandono instituídos pelo governo Bolsonaro à Funai e desabafa: “É a administração do caos. Não sei não... Difícil, cansativo, perigoso. Vamos simbora”.

Chico Mendes, líder dos seringueiros em Xapuri, no Acre(Foto: )
Foto: Chico Mendes, líder dos seringueiros em Xapuri, no Acre

Em conversa com estudantes no Departamento de Geografia da USP, em maio de 1988, Chico Mendes conta detalhes do trabalho realizado entre os seringueiros e as denúncias feitas na ONU contra financiamentos internacionais na Amazônia que prejudicavam a região e a vida dos povos da floresta. 

“Nós não queremos transformar a Amazônia num santuário, nós só não queremos é a Amazônia devastada”, afirmou Chico e relembrou seis atentados vividos desde 1970. “Não adianta eles quererem me matar, porque temos umas 100 lideranças que podem continuar o trabalho”.

 

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