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Transformar Michelle Bolsonaro numa megera é machismo  
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Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha

Transformar Michelle Bolsonaro numa megera é machismo  

O fato de ser radicalmente contra a forma de atuação político-religiosa de Michelle Bolsonaro, não me impede de ver como o machismo encruado na sociedade brasileira e em muitos setores da imprensa se manifestam e como isso reverbera com rastro de pólvora nas redes sociais.
Tipo Análise
Michelle Bolsonaro (Foto: Reprodução/TV Brasil
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Foto: Reprodução/TV Brasil Michelle Bolsonaro

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A Internet esteve bem movimentada, no fim de semana, com os bastidores do Palácio de Planalto e as descompensações dos seus ex-ocupantes. Uma matéria ampla, publicada pelo site Metrópoles, cheia de vídeos, traz à luz a contradição entre a figura pública de Jair Bolsonaro, “imbrochável” macho alfa, cheio de valentia – e vilania – e sua esposa espiritual, Michelle. No privado, surge um homem atormentado e quase servil a uma mulher com dotes autoritários, patrimonialista e ágil na prática dissimulada de possíveis desmandos com dinheiro público.

Quem acompanha meus artigos nos últimos tempos, sabe quantas críticas diretas eu fiz à Michelle Bolsonaro, principalmente, por considerar que ela instrumentalizou a religião com intuito meramente político, defendendo uma personagem pública submissa ao marido, se passando por tão “biblicamente correta” que qualquer pessoa no uso dos seus atributos mentais em perfeito estado, haveria de duvidar de tanta santidade. No entanto, transformar Michelle Bolsonaro numa megera, numa falsa religiosa ou numa versão à brasileira de Lady MacBeth é machismo. E explico.

Historicamente o mundo não consegue enxergar uma mulher separando sua vida pública da privada como acontece com os homens. E não é de hoje e não apenas nas proximidades. Catarina, a Grande, que governou o império russo no século XVIII, por várias décadas, entrou para história pelo que acontecia na sua alcova, enquanto as vitórias das batalhas foram fixadas em Gregório Potemkin, seu general de confiança e ex-amante.

Se Michelle Bolsonaro se apropriou de dinheiro público, que seja julgada por isso na forma das leis. Mas discordo completamente do desmonte contra ela baseado apenas na sua vida privada, de uma forma que os homens nunca são desconstruídos. A vida privada dos homens costuma ser sagrada. Na grande maioria das vezes, são julgados por suas condutas públicas. Ninguém vai atrás de briga de homem com empregados, se ele os trata mal ou bem, se é uma beleza ou um tirano com os subordinados ou a própria mulher. Na maioria das vezes, isso, inclusive, chega a ser elogiado como aconteceu recentemente com Elon Musk e a forma como tratou e demitiu seus executivos.

Michelle Bolsonaro precisa ser combatida pelas suas ações públicas, pelo modelo limitado de país que demonstra ter, por ter sido relapsa enquanto exercia poder e brincava de Pátria Voluntária como quem está no grêmio da escola, usando narizinho de palhaço nos stories. É verdade que o tipo Michelle ecoa como modelo para milhões de mulheres que se apegam a ferro e fogo ao seu jeito aparentemente manso. Mas este, mais uma vez, não é o problema. A questão está em discutir as ideias que ela defende, que eu, particularmente, não concordo, por considerá-las atrasadas demais, sem contar que Michelle não consegue ver a complexidade brasileira, não se permite ampliar um pouco a sua visão de mundo tão pequena.

O fato de ser radicalmente contra a forma de atuação político-religiosa de Michelle Bolsonaro, não me impede de ver como o machismo encruado na sociedade brasileira e em muitos setores da imprensa se manifestam e como isso reverbera como rastro de pólvora nas redes sociais. Inclusive impulsionada por muitas mulheres, o que é uma pena.

 

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