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Como deputado Nikolas Ferreira representa os que odeiam a democracia
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Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha

Como deputado Nikolas Ferreira representa os que odeiam a democracia

Um dos deputados mais votados do País arrasta com ele ideias atrasadas sobre a sociedade, alimenta um discurso preconceituoso contra grupos que ele deveria reconhecer como legítimos – as mulheres transsexuais – e prega o patriarcalismo como se este não fosse uma das principais razões de tanta violência contras as mulheres no Brasil e no mundo.
Tipo Análise
Jacques Rancière, filósofo francês, autor de Ódio à Democracia  (Foto: Le Point)
Foto: Le Point Jacques Rancière, filósofo francês, autor de Ódio à Democracia

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Já citei esse livro várias vezes aqui e o farei mais uma vez. Trata-se da obra “Ódio à Democracia”, do filósofo francês, Jacques Rancière. Vira e mexe, volto a este texto, porque ele me ajuda a pensar a complexidade dos tempos em que vivemos e como alguns discursos que parecem tornar a realidade tão simples são enganosos, embora consigam iludir tanta gente. Rancière parte do pressuposto que a democracia está numa encruzilhada, e isso acontece porque a maioria das pessoas que sempre se viram no trono de todos os direitos emanados dos regimes democráticos estão tendo de dividir esses privilégios com grupos que historicamente ficaram à margem: mulheres, negros, homossexuais, transsexuais, só para citar alguns.

Segundo Rancière, a disputa no campo democrático por voz, direitos e representatividade de todos os grupos que entenderam que a democracia também precisava passar por eles é responsável pelo ódio que muitos sentem pelo regime. Alguns conservadores simplesmente gostariam que o poder político fosse encarnado por alguém que lhes fizesse todos os gostos, e que impusesse esses gostos socialmente a despeito das diversidades de pessoas que compõem a sociedade complexa que construímos.

Aliás, os desejos de uma maioria branca e estabelecida foram o marco do regime democrático. Porém, o país que se arvora de ser a própria essência da democracia, os Estados Unidos estiveram às voltas com Donald Trump empoderando supremacistas brancos, ressentidos com Barack Obama. No Brasil, uma pesquisa básica sobre a história do voto revela o quanto apenas um tipo de pessoas dominou o poder político historicamente e sempre comandou o restante. A democracia se transformou num incômodo para os eleitores de Jair Bolsonaro, por exemplo. Eles não entendem a sociedade em que vivem, querem ter privilégios excepcionais, ditar normas e modelos morais, embora minimizem o ex-presidente receber presentes ao portador que valham milhares de dólares.

O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) é um exemplo dessas pessoas. Ele fala em liberdade, que é própria de um regime democrático, mas, na verdade, e de forma contraditória, prega exclusivismos e é capaz de ver como ameaça aqueles que não se enquadram no modelo do conservadorismo ignorante estabelecido por ele para a sociedade. Quando ele afirma que as mulheres fariam melhor e seriam mais valorosas parindo e criando filhos, ele não faz mais do que o discurso que ergueu a acumulação no Ocidente, de acordo com a pesquisadora italiana Silvia Federici, autora de "Calibã e a Bruxa".

O trabalho de parir para ampliar e consolidar a força de trabalho, criar e educar filhos estabeleceu o sistema econômico desigual que temos hoje. De acordo com Federici, a feminilidade “foi construída”, ao longo dos séculos, com “uma função-trabalho que oculta a produção da força de trabalho sob o disfarce de um destino biológico”. Um dos deputados mais votados do País arrasta com ele ideias atrasadas sobre a sociedade, alimenta um discurso preconceituoso contra grupos que ele deveria reconhecer como legítimos – as mulheres transsexuais – e prega o patriarcalismo como se este não fosse uma das principais razões de tanta violência contras as mulheres no Brasil e no mundo.

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