
Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha
Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha
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São suas essas meninas? Você nem parece que é mãe... Ouvi isso a vida inteira. Nunca compreendi muito bem essa identificação de ser mãe com um jeito ou corpo específico, e não parecer mãe, por vezes, me incomodou abertamente. Queria chegar à escola como outras mulheres que passavam pelo portão e ninguém colocava em dúvida, nem por um instante, que ali estaria rebentos à sua espera.
No início de cada ano, quando as aulas começavam e eu tinha de me apresentar nas reuniões gerais e as iniciações de conversas com professoras e depois, professores, era comum ouvir: “Ah, você é a mãe da fulana? Não parece”. E da sicrana também. “Duas?”. Uma vez tive de um diálogo impensável com a professora da turma de tempo integral da minha filha mais nova. Convidada para ir à escola, cheguei dizendo que estava lá para conversar sobre a Marília. A professora me recebeu e disse: “Claro, mas eu preferia falar com a mãe dela”. Pode falar. “Sim, mas seria muito importante que a mãe viesse conversar comigo”. Professora, eu sou a mãe da menina. A moça desculpou-se: “Olhei você assim... Bom, a Marília quer dormir muito após o almoço...” E começamos.
Lembro-me de uma amiga muito divertida que, no início da nossa amizade, numa turma de mestrado, ao saber que eu tinha três filhos, duas meninas e um menino, ficou surpresa. “Meu Deus, Regina, o Banco Mundial sabe disso?” Depois, ela me disse que eu fosse pouco à escola do meu filho, porque os meninos “não respeitavam mãe magra”. Eu falei, então, que deveria ser por isso que meu filho nunca tinha arranjado confusão com colegas na escola, porque sabia que não tinha mãe para defendê-lo.
A bem da verdade, até em casa sempre houve algum estranhamento sobre a minha maternidade. As meninas sempre falaram que eu era “diferente” das mães das amigas delas. A começar que em casa sempre fui tratada por “você”, e desde bem cedo parece ter ficado claro para elas a minha completa inaptidão para a “logística” da maternidade. Sofria imensamente com o balé doméstico de horário rígidos, com roupa pronta para uma família, com o supermercado, com inúmeras das exigências das escolas. Focava em saber se eles estavam felizes, brincando, lendo, se estavam bem alimentandos, quanto tempo ficavam na TV, se eu estava conseguindo dar atenção diante do tempo sempre escasso.
Até enquanto tive empregada doméstica, as mulheres que me apoiaram percebiam isso desde o primeiro momento. A casa era mais delas do que minha. Na partida da dona Edna, minha última empregada, chorei, pensando no que eu faria sem ela. O caos ficou às claras. Diarista, lavanderia, listas de tarefas compartilhadas com filhos e marido intermináveis, comida de restaurante, tudo exigia um planejamento metódico que em deixava exaurida. Me achava um desastre. Apesar de adorar cozinhar, além do tempo curto, meu marido alertava para o estado de pós-combate-de guerra em que ficava a cozinha depois que eu passava por lá.
As amigas das minhas filhas até hoje falam que eu não “pareço” (ser) mãe delas. Não ligo mais. Acho até bom se a marca da minha maternidade parece ser meio invisível. Não faz mal. Porque, no fim das contas, só meus filhos precisam mesmo vê-la.
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