Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha
Regina Ribeiro é jornalista e leitora voraz de notícias e de livros. Já foi editora de Economia e de Cultura do O POVO. Atualmente é editora da Edições Demócrito Rocha
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Nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, as ginastas Rebeca Andrade e Simone Biles não só brilharam nas competições nas barras, solo, salto. O clima de cordialidade e torcida mútua, independente da disputa acirrada, dos olhos fixos nas notas e representarem equipes de países distintos, também chamou a atenção. Os jornais americanos abordaram o assunto enquanto noticiavam o embate entre as duas atletas. O francês “Le Figaro” pautou diretamente o tema do relacionamento amigável das ginastas na reportagem: “Entre soutien et rivalité, le lien si particulier entre Simone Biles et la Brésilienne Rebeca Andrade” (“Entre apoio e rivalidade, a ligação tão especial entre Simone Biles e a brasileira Rebeca Andrade” numa tradução livre).
O texto fala que as atletas poderiam ser as maiores “inimigas”, mas que a competição entre as melhores ginastas do mundo acontecia sem nenhuma “animosidade”. “Ao contrário das tensões que se observa com frequência entre atletas de alto nível, durante as competições, elas se encorajam mutuamente”, afirmou o texto publicado antes das provas da segunda-feira.
Depois da medalha de ouro no solo, Rebeca subiu ao pódio e foi reverenciada por Biles, que ganhou prata, e pela Jordan Chiles, da mesma equipe, que conquistou um bronze. Numa entrevista, ela falou que a ginasta americana lhe perguntava sobre as provas e ela desconversava. Pronto. A barulheira das redes tomou conta. Quem disse que elas são amigas íntimas, minha gente?
Não são. São atletas que decidiram não tornar o esporte um campo minado para o ódio, o rancor, a desavença, a rivalidade tóxica. Rebeca deu a resposta mais saudável do mundo quando a repórter perguntou se ela também tinha curiosidade sobre o que Biles ia fazer nas provas: “Eu não quero saber, ela já é gigante”. Elas optaram pela cordialidade, coisa muito incomum nesse mundo de tretas virtuais. O que poderia ser algo familiar, vira reportagem de jornal.
Quem disse que ser cordial, torcer genuinamente pela outra, ficar feliz pela felicidade dessa outra, mesmo estando em uma competição, não é amizade? E pode ser até mais representativo do que amigo de Facebook. Amizade é uma construção contínua, até chegar no ponto de a gente dizer: “Mulher, tu não imagina o que aconteceu...” leva tempo, muito tempo. E se esse tempo nunca chegar, ainda assim vale a amizade.
A amizade cordial entre Rebeca e Simone nos dá essa lição. Elas estavam ali não para se destruírem mutuamente, mas para competir no espaço onde cada uma delas faria o melhor e poderia até desejar isto uma para a outra. Essas meninas transformaram a ginástica num espaço de beleza e sorrisos, de gratidão e alegria, de sonho, esperança e choro compensador. Quem não chorou né? vendo a Rebeca ganhar a medalha de ouro na última segunda-feira?
E quanto às perguntinhas fora de hora da Biles? A moça é humana. Não esqueçamos. E para encerrar essa prosa, podemos lembrar do diálogo entre Oronte e Alceste em “O Misantropo”. Oronte pergunta a Alceste: “O senhor me credita sua amizade?” Alceste responde: “Senhor, a oferta que me faz é muito honrosa, mas a amizade deve ser misteriosa”.
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