Sou jornalista de formação. Tenho o privilégio de ter uma vida marcada pela leitura e pela escrita. Foi a única coisa que eu fiz na vida até o momento. Claro, além de criar meus três filhos. Trabalhei como repórter, editora de algumas áreas do O POVO, editei livros de literatura, fiz um mestrado em Literatura na Universidade Federal do Ceará (UFC). Sigo aprendendo sempre. É o que importa pra mim
O crime organizado no País está tomando proporções assustadoras e não adianta fazer de conta que a história é com os outros
Querido Papai Noel, tenho certeza de que você lerá esta carta, porque sou a última pessoa no mundo a lhe escrever pedindo alguma coisa. Você sabe que mesmo na infância, passei a desconfiar da mágica da viagem de trenó, talvez porque na minha casa não havia chaminé. Mas, hoje é Natal. Lembrei-me de você ao ouvir quatro relatos esta semana.
O primeiro veio de uma amiga. Ela contou que o filho da mulher que trabalha como empregada na casa dela havia saído de casa às pressas com medo de ser morto por pessoas ligadas à facção no bairro onde a família mora.
Tudo porque o rapaz de 19 anos, mecânico de uma oficina, ouvia um tipo de música que teria desagradado o líder do grupo criminoso. Por se negar a desligar o som, ele foi arrastado para a rua e espancado.
No dia seguinte, a oficina recebeu novamente a visita de homens ligados à facção. Não encontraram o jovem agredido, mas deixaram-lhe o recado de nunca mais pôr os pés no bairro.
Enquanto fazia as unhas, a manicure, cuja família mora em Viçosa, estava inconformada com a falta de segurança que paira sobre o município. Além da sensação de perigo iminente, ela relatou o medo que todos, de repente, passaram a sentir.
Nascida e criada no município, ela acompanhou o irmão que montou dois salões em Fortaleza. Viçosa se transformou em refúgio de clima frio, lugar de descanso merecido junto à família. Agora, é tudo diferente. Ninguém sai de casa, ela disse. O medo está em todos os lugares. Neste Natal, Vera preferiu ficar em Fortaleza.
Deusiane arrumava meus armários da cozinha e me falava do filho de 13 anos que havia concluído o Ensino Fundamental II e do aperto no coração que ela estava sentindo. O menino precisaria mudar de escola.
Ela diz que morava numa área relativamente tranquila, numa casa construída aos poucos, num terreno comprado há 15 anos num bairro da periferia de Fortaleza. Vivia muito bem até começarem as brigas de facções. O filho terá de frequentar a escola na região mais perigosa do bairro. “A senhora sabe, ele é meu único filho e eu estou com medo”.
O quarto e último episódio, você sabe. Henrique Marques de Jesus, um garoto de 16 anos, estava de férias em Jericoacoara com o pai, quando foi cruelmente assassinado por, supostamente, ter feito um gesto interpretado como sendo de uma facção rival. O resto da história está nos jornais.
Meu pedido parece desproposital, mas eu queria muito morar num lugar livre de facções. O crime organizado no País está tomando proporções assustadoras e não adianta fazer de conta que a história é com os outros.
As organizações criminosas lançaram tentáculos em instituições, em setores econômicos e, sob o regime do medo, dominam espaços urbanos, impondo leis absolutas a moradores que se veem impotentes diante da violência explícita.
Caso você esteja muito ocupado, vou entender. Mas, receio que está passando da hora de esse ser um tema que precisa perpassar todos os governos, setores, instituições. O crime organizado precisa ser contido.
Um Feliz Natal e minha solidariedade às pessoas citadas neste texto. Que o medo que três delas sentem se transforme em esperança. Lamento profundamente pelo Henrique que não teve Natal este ano. Cuidado, Papai Noel, com as facções.
Turista filmado sendo carregado é encontrado morto em Jericoacoara | O POVO NEWS
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