O assunto que mais ouvi neste início de semana diz respeito às 25 linhas de ônibus canceladas em Fortaleza. Dos grupos de WhatsApp dos quais faço parte, a reação de um deles me deu o tom do impacto dessa decisão e me surpreendeu por ser formado por pessoas que talvez nunca tenham andado de ônibus na vida, sendo que foi dele que partiu a relação das linhas canceladas. Na segunda pela manhã, uma ida rápida ao supermercado bastou para que ouvisse relatos e lamentações "do sumiço da 701, da 903, da 020, da 302", numa espécie de história contada a várias bocas, principalmente por mulheres funcionárias e outras trabalhadoras.
É um fato incontestável que a mobilidade em Fortaleza mudou consideravelmente com a chegada dos transportes por aplicativos. Da mesma forma, é a mais pura realidade que a retirada de uma única linha de ônibus pode mudar a vida de muita gente, imaginem 25 linhas.
Assisti a um vídeo de um representante do Sindiônibus nas redes sociais e o ouvi afirmar que cerca de 500 mil pessoas fazem uso diário do transporte urbano em Fortaleza e que, para “proteger o sistema”, foi necessário a retirada de linhas que atingem 9 mil fortalezenses. O rapaz usou o termo “lamento”, mas, para ele, 9.000 pessoas que, segundo sua estimativa, terão de andar mais para tomar outro ônibus, ou mesmo mudar a forma de chegar ao trabalho, à escola ou à universidade, parece ser algo absolutamente tranquilo em Fortaleza.
Boa parte das queixas que ouvi no supermercado veio de mulheres. Quando uma mulher precisa andar mais quarteirões numa rua pouco iluminada após concluir o trabalho num supermercado às 21h, faz muita diferença se a rota zero alguma coisa deixou de existir, sem que ela soubesse de véspera e pudesse se organizar. Se o marido, a filha ou filho desta mulher estiver em trânsito do trabalho ou faculdade e precisar chegar tarde da noite em casa, de ônibus, o percurso dessas pessoas tem um impacto considerável para esta mulher.
A frota foi reduzida num momento particular em que, infelizmente, não se pode dizer que Fortaleza dá segurança aos seus habitantes. Pelo jeito, o impacto das linhas deletadas se traduzem apenas em um mísero número, o que é pouquíssimo.
Quais as alternativas de transportes para esses 9 mil habitantes que de um dia para o outro precisam alterar um aspecto importante da sua vida? Qual a situação real desses bairros quanto à mobilidade, incluindo vias com iluminação pública adequada? Houve cruzamento de dados com a Segurança Pública quanto às ocorrências envolvendo assaltos? Houve, por fim, sensibilidade em preparar a população atingida, oferecendo informações de qualidade, sugerindo soluções? Onde estava o poder público municipal que não negociou essa decisão para dar maior possibilidade de planejamento aos cidadãos desta cidade?