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Atuar apenas sobre os sintomas não tornará as escolas mais seguras
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Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)

Atuar apenas sobre os sintomas não tornará as escolas mais seguras

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Tipo Notícia

As escolas não são um enclave impermeável ao que ocorre na sociedade. Os antagonismos e as disputas que vemos nas ruas e nas redes perpassam as unidades escolares, apresentando-se como mais um desafio cotidiano para gestores e professores que têm de lidar com uma carga de trabalho extenuante e com um modelo de ensino que remonta ao século passado.

Os recentes ataques ocorridos às unidades escolares, cujo episódio mais recente ocorreu em Blumenau (RS), chocam pelo grau de perversidade e pela vulnerabilidade de crianças e adolescentes frente a tais atos de violência. Cenas que eram vistas apenas nos Estados Unidos passaram a estampar com certa regularidade nossos noticiários, em uma evidente importação de práticas e ideologias. Desde setembro do ano passado, pelo menos um caso de repercussão nacional de atentado em escolas é registrado no Brasil por mês.

É evidente que algo precisa ser feito e o Governo Federal já começou a se mover. Na semana passada, um Grupo de Trabalho Interministerial foi criado para propor ações de combate à violência nas escolas. Além disso, R$ 150 milhões foram destinados a estados e municípios, via Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), para prestar apoio à Guarda Municipal e à Polícia Militar.

Um grupo emergencial de monitoramento virtual, formado por 50 policiais, também será constituído com o objetivo de rastrear ameaças nas redes sociais e tentar evitar que os ataques ocorram ainda no seu nascedouro. Sabe-se que o planejamento e o recrutamento dos agressores ocorrem em fóruns, aplicativos móveis e, até mesmo, em plataformas digitais abertas. Processar e filtrar essa imensidão de dados, contudo, configura um esforço hercúleo que exige pessoal qualificado e recursos.

Em paralelo a essas medidas, cresce um movimento em torno da militarização das escolas por meio da implementação de sistemas de vigilância mais rigorosos e treinamento dos professores para enfrentar situações extremas. Essa é a solução adotada, sem sucesso, nas escolas estadunidenses. Um investimento bilionário tem sido feito por lá há anos sem resultados que comprovem sua eficácia.

Levantamento feito pela Omdia, consultoria especializada no mercado de tecnologia, revelou que, em 2021, as escolas dos EUA gastaram um valor recorde de US$ 3,1 bilhões em sistemas e serviços de vigilância e proteção. O Congresso americano aprovou, ano passado, um pacote de US$ 300 milhões em segurança para as unidades escolares. Não é preciso muita imaginação para saber que a indústria armamentista está lucrando e muito com esse cenário. No entanto, os anos de 2021 e 2022 registraram recordes sucessivos de atentados a instituições de ensino, com 42 e 47 ocorrências anuais, respectivamente.

Como pode ser percebido, os investimentos em equipamentos e sistemas de segurança nas escolas pouco têm servido para lidar com duas questões bastante arraigadas na cultura estadunidense: o armamentismo e a ideologia supremacista. Nunca se vendeu tantas armas de fogo nos Estados Unidos quanto no período do isolamento social. Boa parte desse arsenal é constituído de armas com elevado potencial de danos. Vale ressaltar que o fuzil AR-15 é o armamento favorito dos atiradores por seu fácil manuseio e capacidade de disparar vários tiros por vez, quando adaptado.

Em paralelo, o discurso do ódio e da intolerância foi amparado pelo governo Trump com consequências desastrosas. As palavras de um líder político e carismático possuem um peso imenso. Dificilmente se viu, na história recente, um megafone global de tamanho alcance na defesa de ideias que beiravam o fascismo.

O Brasil transplantou esses dois componentes da cultura dos EUA, nos últimos anos, no intuito de emular práticas e ideias da extrema-direita global em solo nacional. A derrota de Jair Bolsonaro fez com que esse movimento perdesse um aliado decisivo no Governo Federal. Contudo, as células extremistas proliferam nas redes e no submundo da internet. Ecos dessa ideologia são encontrados em discursos de parlamentares e governantes. Não à toa, a principal reação aos ataques é uma tentativa de despolitizar um fenômeno cujas raízes são eminentemente políticas.

O populismo penal, por sua vez, alimenta as ideias mais esdrúxulas em se tratando de prevenção às escolas. Exigir que os educadores façam aulas de defesa pessoal, por exemplo, é uma proposta que visa à terceirização da responsabilidade sobre a segurança dos estudantes, atribuindo mais um fardo aos profissionais.

A adoção de protocolos rigorosos de segurança, câmeras de vigilância, biometria e seguranças armados em nada diminuirá o problema se as causas que levam uma pessoa a executar esse tipo de crime não forem enfrentadas. É preciso atacar o coração das trevas, atingindo o núcleo da rede que inspira e motiva todas essas ações. Repressão qualificada em um ponto e desmobilização para o recrutamento em outro. Trata-se de uma atividade complexa, com medidas a curto, médio e longo prazo, e que não compete apenas aos governos, mas a toda a sociedade. A responsabilidade pela vida dos nossos alunos é de todos nós e não apenas de quem trabalha na educação.

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