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Segurança já pauta o debate sobre a Prefeitura de Fortaleza
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Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)

Segurança já pauta o debate sobre a Prefeitura de Fortaleza

Talvez o grande mote para as eleições do ano que vem seja a capacidade de trazer vida à cidade. Quem se mostrar mais capaz disso perante o eleitor sai na frente.
Tipo Análise

Estamos há menos de um ano das eleições municipais em Fortaleza e o tema da segurança pública já se mostra como o principal balizador do debate sobre a sucessão municipal. A convenção estadual do PSDB, ocorrida na semana passada, foi uma mostra de quais serão os principais pontos a serem explorados pela oposição.

Em sua fala, o ex-senador Tasso Jereissati (PSDB) afirmou estar "profundamente incomodado com o que está acontecendo no Ceará". "Não é normal recebermos todos os dias notícias de massacre, de violência de homicídio. Tem alguém aqui que nunca foi assaltado ou que não conhece alguém que foi
assaltado?", disparou.

Indo além das querelas partidárias, a discussão sobre segurança pública deixou de ser assunto restrito aos governos estaduais. Os municípios possuem hoje um papel de protagonismo inédito, haja vista o Sistema Único de Segurança Pública (Susp) colocar as prefeituras sob um papel de igual relevância aos demais entes federativos no que diz respeito à promoção da segurança à população.

A troca de farpas de olho nas eleições municipais de 2024 pode ser precoce? Sim, mas o debate não está mal colocado: dentro dos limites constitucionais das medidas que lhe cabem, os gestores municipais precisam ser cobrados sobre o assunto. De modo geral, contudo, a dimensão repressiva das forças de segurança, sob a orientação de um viés fortemente militarizado, tem sido a tônica das prefeituras a esse desafio. A gestão municipal passada instalou torres de vigilância em alguns bairros sob a alegação de se tratar de "células de proteção social". A presença ostensiva de um equipamento de vigilância não implica, necessariamente, na redução da criminalidade e da violência. A impressão que fica é a de um maior controle sobre segmentos da sociedade que já são socialmente estigmatizados, como os jovens negros periféricos.

No segundo turno, as propostas dos dois adversários, Sarto Nogueira (PDT) e Capitão Wagner (União Brasil), apresentavam mais semelhanças que diferenças. Escrevi uma coluna apontando esses elementos comuns naquela oportunidade. Mais que novos nomes, a compreensão sobre a cidade precisa ser ampliada. E isso só é possível com o envolvimento das mais diversas secretarias. Não é possível lidar com uma realidade tão complexa como a expansão do predomínio do mundo do crime sobre o cotidiano de comunidades inteiras de uma forma simplista.

Tudo está fortemente interconectado. Um exemplo disso é que os acusados pelas mortes ocorridas na chacina de Itarema foram presos no bairro do Barroso, em Fortaleza, distante mais de 200 quilômetros do local do crime. Na semana anterior, uma tentativa de chacina foi registrada na Areninha do João Paulo II, ou seja, em um território vizinho onde houve a captura. Em comum a ambos os casos: a rivalidade entre facções. As ações criminosas não se restringem apenas a um ponto específico: suas manifestações e interrelações são dinâmicas, fragmentárias e coordenadas por vezes à distância. A dor infligida é local, mas a origem do dano é global.

As prefeituras podem fazer muita coisa no sentido de proporcionar novas sociabilidades urbanas que superem o espectro da violência e da desolação. O receituário é diverso. A reportagem de capa do
O POVO de ontem mostra um caminho alternativo a ser trilhado pelos gestores: o da requalificação de espaços públicos na periferia de Fortaleza. São milhões investidos em parques e praças que se tornam, mais uma vez, locais privilegiados para a circulação de bens, serviços e pessoas.

Costumo passar pelo entorno da Lagoa do Mondubim aos fins de semana e é nítida a pulsão de vida que se apossou de uma área reconhecida apenas pela sensação de temor que causava aos transeuntes. O Parque Rachel de Queiroz, por sua vez, transformou um terreno de mata mal iluminado e repleto de riscos em uma área de lazer cheia de atrativos para as famílias da região. Em entrevista ao O POVO, o secretário municipal de Infraestrutura (Seinf), Samuel Dias, afirma existir uma "economia dos encontros, do lazer em áreas públicas".

Embora o secretário esteja falando da repercussão de tais medidas sobre a geração de empregos, há um sentimento de apropriação dos espaços urbanos que perpassa essa requalificação, mas que é soterrado pelo medo em nosso cotidiano. Segurança e cuidado são palavras que andam juntas. Talvez o grande mote para as eleições do ano que vem seja a capacidade de trazer vida à cidade. Quem se mostrar mais capaz disso perante o eleitor sai na frente.

 

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