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Ora, pombas!
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Professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, é especialista nas áreas de História da Arquitetura e do Urbanismo, Teoria de Arquitetura e Urbanismo, Projeto de Arquitetura e Urbanismo e Patrimônio Cultural Edificado. Escreve para o Vida & Arte desde 2012.

Ora, pombas!

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A Lana Araújo

Escrevo na manhã do sábado posterior à derrota do Brasil para a Croácia. Sim, caras e caros, torci e muito pela nossa seleção nesta Copa do Mundo, que é a minha 14ª, apesar de não ter alimentado maiores expectativas quanto ao nosso escrete. Um bando de jogadores bonzinhos, acomodados em suas zonas de conforto nos times europeus, mais um único craque, mascarado, sonegador de impostos, bozomínion e pipoqueiro profissional. Um treinador, aliás, um coach, com sua fala arrevesada arrastando-se nas suas modorrentas palestras motivacionais, que de futebol não entende lhufas. Sabíamos de tudo isso, mas, como a louca chamada Esperança do poema de Quintana, pensávamos que pousaríamos incólumes na calçada da glória. Vã ilusão, ledo engano, oh, dor...

Até então, a Canarinho havia enfrentado quatro timecos e perdido para um deles. Dirá o ufanista de todas as horas que jogamos com a equipe reserva contra Camarões. Responderei que não importa, pois estão todos ali para jogar e fazer o seu melhor. É só lembrar as atuações do Paulo César Caju na Copa de 1970, quando suplente do Rivelino. Enquanto isso, os patriotários, agora hidrófobos, deram para esculhambar a verde-e-amarelo na porta dos quartéis, com o beneplácito das autoridades militares. "Daqui a 72 horas", relinchou um deles, ainda fã, "o VAR vai anular o gol da Croácia". Seria hilário se não fosse ridículo. Mas, vida que segue, há mais o que fazer, isso aí já, já será página virada no agitado folhetim brasileiro. Todavia, segue o ranço em vestir o manto.

Por que perdemos para o time dos jogadores cujos nomes soam mais como inflamações e infecções? Simples: pela razão de que o nosso é mais fraco que o deles. Um goleiro que não inspira a menor confiança, laterais que não avançam, presos à sua mediocridade, uma zaga chorona, um meio-de-campo sem qualquer criatividade ou lampejo (onde estão, por favor, os lançamentos de 40 jardas que o Gérson fazia?), atacantes ciscadores sem muita rapidez e efetividade e um cara que quer a bola só para si, não marca ninguém e ainda reclama quando alguém desce-lhe a ripa. Agora, no quesito dancinha, somos imbatíveis, não? Foi duro ver o Modric e o Messi, dois gigantes, chamarem a responsabilidade para si logo no início da cobrança dos pênaltis. É, dignidade...

Contudo, como se diz no mundo dos negócios, as crises geram oportunidades para a mudança e a inovação. Penso que se fechou um ciclo, que já era para ter terminado há muito. Paulinho da Viola, octogenário outro dia, é quem dá a dica: "O jeito é criar um outro samba sem rasgar a velha fantasia". Temos que recuperar o futebol brasileiro como patrimônio, atualizando-o. Exterminar de vez a patriotada, as negociatas entre CBF, jogadores e empresários, escolher melhor os mitos (mito e futebol são inseparáveis), dar um fim ao preconceito contra o futebol jogado no Brasil (por que o Gustavo Scarpa não foi ao Catar?) etc. Saio para tomar um ar. A cidade lotada de pombos. Passa um carroceiro: "Vamos trabalhar, senão, em vez da do pombo, vai ser a dança da pomba, ui!".

Foto do Romeu Duarte

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