Logo O POVO+
Sabrina Matos: O mal-estar na civilização
Foto de Sabrina Matos
clique para exibir bio do colunista

Psicóloga e psicanalista

Sabrina Matos: O mal-estar na civilização

O fato é que não dá pra fazer de conta que nada está acontecendo. É preciso abrir canais de fala, de escuta, seja de alunos, professores, familiares e a sociedade de maneira geral
Tipo Opinião
Sabrina Matos, psicóloga e psicanalista, professora da Unifor (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Sabrina Matos, psicóloga e psicanalista, professora da Unifor

Os ataques às escolas que ocorreram recentemente assim como as ameaças de novos ataques que povoam as redes sociais causando medo e apreensão, nos convocam, enquanto cidadãos, a pensarmos acerca do tempo em que vivemos. De causalidade sistêmica, mas também ancorada no neoliberalismo (modelo catalisador de injustiças), a violência está no cerne da nossa condição de sujeitos. Somos animais vorazes, violentos, selvagens. As tendências destrutivas e antissociais demarcam a condição humana e, portanto, o mal-estar é inevitável.

Sigmund Freud levantava uma questão acerca do destino da civilização em seu texto de 1929 "O Mal-Estar na Civilização". Será que os seres humanos seriam capazes de dominar a sua inclinação à agressividade mútua antes que a destrutividade exteriorizada levasse a humanidade à destruição?

Em vinte de abril de 1999, o massacre ocorrido na cidade de Littleton, no estado do Colorado, nos EUA, chocou o mundo. Transmitido em tempo real em vários canais de TV o episódio protagonizado por dois estudantes do ensino médio, considerados bons alunos, mas sem grandes amigos, chamou a atenção não somente pela frieza e pelos tiros disparados que tiraram a vida de dez estudantes e um professor, mas também pelo terror psicológico causado pelos dois jovens de 17 e 18 anos que, acuados, tiraram a própria vida em seguida.

As investigações concluíram que o crime teria sido estimulado pelo desejo de vingança dos dois alunos que não eram populares e sofriam bullying. Susan Klebold, mãe de um dos jovens, diz no livro "Acerto de contas de uma mãe" que seu filho era um garoto entusiasmado e afetuoso e que ela e o então marido eram pais carinhosos, atentos e comprometidos. No entanto, alguns fatos talvez tenham sido banalizados, como por exemplo quando seu filho e o amigo foram detidos por roubarem produtos eletrônicos, multados e suspensos em outra ocasião por riscarem a porta de um armário e quando seu filho pediu de presente de Natal uma escopeta.

O fato é que não dá pra fazer de conta que nada está acontecendo. É preciso abrir canais de fala, de escuta, seja de alunos, professores, familiares e a sociedade de maneira geral. O incremento nas medidas de segurança, o controle mais rigoroso de quem entra e sai dos muros das escolas, detectores de metal podem nos dar a sensação de maior segurança, embora saibamos que o terrorismo é o terror do singular contra o terror global, como diz Chul Han. Somos animais violentos? Sim. A violência está fincada no cerne da condição humana mas, certamente, enquanto sociedade e entregues à lei de mercado neoliberal, vamos nos tornando cada vez mais desumanos.

 

Foto do Sabrina Matos

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?