
Historiador, pesquisador, escritor, editor do O POVO.Doc e ex-editor de Opinião do O POVO
Historiador, pesquisador, escritor, editor do O POVO.Doc e ex-editor de Opinião do O POVO
O Dia da Consciência Negra entrou como efeméride pela lei federal nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que instituiu nas escolas a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileiro. Na lei federal nº 12.519, de 10 de novembro de 2011, a presidente Dilma Rousseff oficializou definitivamente a data como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. O estabelecimento de feriados compete aos estados e municípios. No Brasil, aproximadamente 1.260 municípios aprovaram leis decretando feriado nesta data, e, cinco estados o fizeram em âmbito estadual, são eles: Alagoas, Amazonas, Amapá, Mato Grosso e Rio de Janeiro.
O reconhecimento oficial do Estado brasileiro deve-se à luta da população negra que não é de agora. Na verdade, vem desde o período colonial a partir da resistência dos negros aos portugueses que basearam a exploração do Brasil na escravidão dos africanos e afro-brasileiros.
Desde este período a população negra resiste, luta, pela sobrevivência, justiça, respeito e direitos iguais negados e camuflados ao longo dos séculos. De acordo com o Banco de Dados do Comércio Transatlântico de Escravos (The Transatlantic Slave Trade Database, em inglês), no período de 1501 a 1900, o Brasil recebeu 4.862.374 vidas como escravos.
O quilombo constituía o refúgio dos escravos que conseguiam escapar da opressão, se aliavam a outros fugitivos para constituir espaço de proteção, liberdade, respeito e prática das suas múltiplas culturas (lembremos que a escravização dos africanos ocorreu em várias partes da África com culturas próprias).
O mais famoso de todos foi o Quilombo dos Palmares, localizado na serra da Barriga (atual município União dos Palmares), em Alagoas, existiu de 1599 (ou 1600, há divergência) até 1694, ao longo dos quase 100 anos houveram diversas batalhas tentando aniquilar até que uma expedição comandada pelo bandeirante Domingos Jorge Velho conseguiu seu intento. O grande líder, estrategista e guerreiro do Quilombo dos Palmares foi Zumbi, escapou ao fim do quilombo, mas, traído, foi morto em 20 de novembro de 1695, data presumida e dada como consensual.
Ao longo dos séculos de escravidão diversas resistências, uma das mais conhecidas foi a Revolta dos Malês, em Salvador (BA), em 1835. Ao longo do século XIX cresceu o movimento abolicionista por todo Brasil, somado à decadência política e econômica do império brasileiro e às pressões da Inglaterra pelo fim do tráfico negreiro tornaram o Brasil o último país das Américas a abolir a escravidão em 1888.
O Estado brasileiro se eximiu de qualquer política pública pela forma como a abolição aconteceu, sem qualquer qualificação, recursos ou direcionamento a população negra foi colocada à parte da sociedade, como párias de uma Nação que não os reconhecia como cidadãos.
O modelo praticado desde então os relegou à semiescravidão, subempregos, empregos com baixos salários, moradores do subúrbio e favela, na grande maioria, com baixo esforço de inclusão pela educação, amparo da saúde e legal.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, através da pesquisa “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça”, mostra que a população negra ou parda corresponde a 56% da população brasileira e tem os piores indicadores de renda, moradia, escolaridade, serviços etc. O Atlas da Violência 2020 aponta que a taxa de homicídios, de 2008 a 2018, cresceu 11,5% na população negra, enquanto a de não negros diminuiu 12%. Por onde quer que se olhe os dados e as realidades são vergonhosos, demolem completamente a fantasiosa pseudoconstrução do mito da democracia racial brasileira.
Há muito que temos que melhorar como povo brasileiro, uma Nação é feita com a inclusão e os mesmos direitos para todos que a compõem. A resistência e a reflexão são feitas com ações e discursos todo dia, mas, reconhecer a data do Dia da Consciência Negra é simbólico no respeito que devemos ter com a cultura e população negra.
O surgimento do Dia da Consciência Negra no Brasil passa pela criação do Grupo Palmares em Porto Alegre (RS), em 1971, inicialmente constituído pelo poeta, pesquisador, professor e ativista Oliveira Silveira, Antônio Carlos Côrtes, Ilmo da Silva e Vilmar Nunes.
Dentre os debates do movimento negro gaúcho o 13 de maio como o grande referencial da população negra foi questionado, visto tratar-se de uma concessão pela sociedade que os alijava dos direitos fundamentais durante e pós escravidão. Três datas surgiram no Grupo Palmares para representar a população negra brasileira, 21 de agosto, morte de Luiz Gama; 9 de outubro, nascimento de José do Patrocínio; 20 de novembro, morte de Zumbi dos Palmares.
20 de novembro foi escolhido pelo símbolo de resistência e liderança de Zumbi, os outros dois citados também dispunham o mesmo perfil, a decisão foi baseada na influência de estudos sobre Zumbi naquele período.
Foi organizado para 20 de novembro de 1971 acontecer no Clube Social Marcílio Dias, em Porto Alegre, o encontro que debateria as questões relativas ao racismo, preconceito, os direitos e valores da população negra e homenagem a Zumbi. Vivíamos na ditadura militar, o nome do grupo foi confundido com a organização armada VAR-Palmares, perseguida pelos militares. Intimados pela Polícia Federal, foram liberados pela censura após apresentar o roteiro do ato sob a ameaça de não fugir da apresentação aprovado.
A adoção, à nível nacional, do 20 de novembro como Dia da Consciência Negra acontece sete anos depois, 1978, em São Paulo, quando o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNUCRD) acolheu a proposta do movimento gaúcho, realizando manifestações pelos direitos da população negra. Portanto, em 2021 celebra-se o cinquentenário do Dia da Consciência Negra.
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