Historiador, pesquisador, escritor, editor do O POVO.Doc e ex-editor de Opinião do O POVO
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O Jogo do Bicho tem origem no final do século XIX, exatamente em 3 de julho de 1892, no Rio de Janeiro. Mas, antes, vamos entender como aconteceu o que veio a tornar-se a escancarada, “amigável” e facilitada contravenção institucionalizada no dia a dia brasileiro.
João Batista de Viana Drummond era um proeminente empresário carioca na época do Império, das suas relações foi agraciado com o título de Barão de Drummond. Dentre seus negócios, constava como acionista do Jornal do Brasil, sócio da Companhia Arquitetônica e proprietário de grande parte do recém-inaugurado bairro de Vila Isabel.
Em 1884 propôs à Câmara Municipal do Rio de Janeiro criação do Jardim Zoológico na Capital do Império brasileiro, a ser localizado em Vila Isabel. Os argumentos baseavam-se em proporcionar modernidade, consonante com o espírito civilizatório almejado à época, valorização do novo bairro e movimentação de público nas linhas do bonde. Paralelamente, solicitava benefícios do poder público, como ausência de livre concorrência, isenção de impostos por décadas e ajuda financeira.
O Jardim Zoológico do Rio de Janeiro foi inaugurado em 1888, com o advento da República no ano seguinte o auxílio financeiro foi suspenso passando a manter-se com recursos do barão. O Brasil, no começo da República, vivia grave crise financeira, conhecida como “crise do encilhamento”, impactando negócios e vida de todos.
A invenção do Jogo do Bicho foi uma estratégia de manter funcionando o Jardim Zoológico, a ideia está associada ao Barão de Drummond e ao mexicano Manuel Ismael Zevada, seu gerente. Zevada mantinha já um jogo de azar na Rua do Ouvidor, conhecido como Jogo das Flores, daí, foi adaptado pelo barão com os animais do zoológico.
Cada ingresso recebia a imagem de um dos animais do zoológico, no começo do dia o barão escolhia a gravura a ser colocada numa caixa aberta as 17 horas. Cada vencedor recebia 20 vezes o valor do ingresso, no primeiro sorteio deu avestruz, 23 foram os vencedores daquele dia.
O sucesso foi imediato, o fluxo de pessoas ao Jardim Zoológico aumentou consideravelmente e, como reflexo dos jogos de azar (ou sorte), brigas contidas pelas forças policiais e contestação à liberação do funcionamento da loteria.
Vivíamos uma sociedade em ebulição política e econômica, o ordenamento público era imposto no controle de posturas aceitáveis e civilizatórias. Ao longo da História os jogos autorizados pelo Estado foram mantidos, àqueles que não se enquadravam no modelo desejável e não revertiam-se em tributos aos cofres públicos eram “cancelados”. Foi assim ontem, é assim hoje. Em abril de 1895 o Jogo do Bicho foi cancelado pelo decreto municipal 133.
O Jardim Zoológico foi perdendo público e receitas, transferido a outros proprietários ao longo do tempo. Quanto ao Jogo do Bicho, nunca mais parou, ganhou as ruas da Capital da República e exportado aos demais estados brasileiros.
A ilegalidade não surtiu efeito, o desejo de dinheiro fácil e rápido dos apostadores facilitou cair no gosto popular em todas as classes sociais. Em 3 de outubro de 1941, a lei 3.688 proibia em definitivo todos os jogos de azar no Brasil, quanto a pena relacionada ao Jogo do Bicho o artigo 58 orienta a quem pratica ou explora prisão de quatro meses a um ano, além de multa. Como se percebe ao longo dos anos, o combate à jogatina não conseguiu resultados eficientes.
O Jogo do Bicho, gradativamente, criou uma casta de bicheiros (também conhecidos como banqueiros) poderosos que dominaram os territórios de atuação com estratégias de corrupção, aliciamento e violência. Exemplo maior, no País, são os bicheiros cariocas envolvidos nas guerras por territórios e “patrocínios” (ou lavagem de dinheiro) das escolas de samba e clubes de futebol, travestidos de benfeitores da comunidade.
No Ceará atual, segundo reportagem publicada no O POVO pelo jornalista Demitri Túlio, em 4 de novembro de 2021: “A Loteria Popular, que opera com o Banco Paratodos e reúne pelos menos 13 bicheiros antigos da mais tradicional banca de apostas do jogo do bicho no Ceará, está autorizada a voltar a funcionar”. O juiz estadual Francisco das Chagas Barreto autorizou a operação baseado em Lei Complementar estadual 207/2019 e decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), com o recolhimento mensal aos cofres públicos de R$ 15 mil fixos.
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