
Historiador, pesquisador, escritor, editor do O POVO.Doc e ex-editor de Opinião do O POVO
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Serra Pelada foi considerado o maior garimpo a céu aberto do mundo nos anos 1980, localizado na Serra do Carajás, no Pará, o “formigueiro humano” abrigou, segundo variadas fontes, de 80 a 116 mil pessoas. Representou o sonho de fazer fortuna em um Brasil que vivia grave recessão econômica, representado pelo ocaso do “milagre econômico” da ditadura militar que vinha definhando nos últimos anos de poder.
A saga inicia nas terras de Genésio Ferreira da Silva, em 1979, após fortuita descoberta e comprovação da veracidade da pepita de ouro, nos meses seguintes chegaram milhares de garimpeiros, numa onda cada vez mais crescente.
Historicamente, a exploração dos recursos naturais tem origem na própria colonização brasileira, começando pelo pau-brasil e, nos anos e séculos seguintes ampliaram a procura e a invasão das terras dos povos originários até os dias atuais sob diferentes matizes, justificativas e discursos. A descoberta de Serra Pelada trouxe o inebriante sonho da riqueza num País dominado pelo desemprego e inflação, levas de brasileiros de todas as regiões e retirantes nordestinos assolados pela seca lá chegaram movidos pela ambição e esperança.
O governo federal, na Presidência de João Figueiredo (1979-1985), temendo descontrole em região praticamente abandonada pelo Estado envia ao garimpo, em 1980, como interventor o militar Sebastião Rodrigues de Moura (também conhecido como Major Curió), experiente na região por ter participado da repressão à Guerrilha do Araguaia.
Armas, mulheres, jogos de azar e bebidas alcoólicas foram proibidos no garimpo. Mas, a 30 quilômetros do local, em Vila Trinta campeava o clima de terra sem lei com todos os tipos de contravenção e criminalidade, o índice mensal de mortes girava em 80 pessoas. Ironizava-se a situação da Vila com a seguinte frase: “de dia é Vila Trinta, à noite é Vila Trinta e Oitão”.
Na tentativa de aparelhar a região garimpeira de Serra Pelada e controlar a saída dos recursos a presença de vários órgãos públicos se fez presente com a chegada da Rio Doce Geologia e Mineração, subsidiária da estatal Companhia Vale do Rio Doce, Serviço Nacional de Informações (SNI), Receita Federal, Caixa Econômica Federal, Empresa de Correios e Telégrafos (ECT), Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (Sucam), Fundação Serviços de Saúde Pública (FSESP), Telepará, Companhia Brasileira de Abastecimento, Polícia Federal e Policia Militar.
Destaque-se que, oficialmente, a comercialização do ouro deveria ser exclusiva da Caixa Econômica, que aplicava uma defasagem de quinze por cento do valor de mercado. Por essa e outras diferenças o tráfico burlava o fraco controle estatal do garimpo.
Percebendo a capacidade de desgaste para o governo e descontrole da região de Serra Pelada a gestão João Figueiredo tenta fechar, sem sucesso, o garimpo em 1983. Major Curió elege-se, no ano anterior, deputado federal e passa a representar as forças ligadas ao garimpo.
A partir de 1984 a extração do ouro entra em declínio, ano após ano a quantidade vai diminuindo drasticamente. Do início ao fechamento do garimpo, em 1992, na Presidência de Fernando Collor (1990-1992), o controle oficial do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) calcula em trinta toneladas de ouro extraído. As estimativas não oficiais projetam em cem toneladas, aí incluindo o que não passou pelas mãos do governo.
Após o fechamento de Serra Pelada, a Companhia Vale do Rio Doce foi indenizada pelo governo federal por ser a detentora dos direitos de exploração negados com a invasão dos garimpeiros. Quanto aos garimpeiros, organizados em sindicato, tentaram reativar, ao longo dos anos, a exploração do garimpo associando-se com várias empresas. Sem sucesso. No momento, fiam-se nas palavras de Jair Bolsonaro, um presidente da República apoiador da exploração sem sustentabilidade da região amazônica, que promete dar-lhes apoio e remover os impeditivos legais que impossibilitam a reabertura do garimpo.
Com o declínio de Serra Pelada, no final dos anos 1980, os garimpeiros foram estimulados a migrar para Roraima e invadir a reserva indígena Yanomami, poluindo rios com mercúrio e devastando a terra indígena na continua e descontrolada fúria da extração ilegal que domina grande parte da região Norte até hoje.
No final, o garimpo produziu um buraco de 200 metros de profundidade e 200 metros de largura com 24 mil metros quadrados no qual milhares de pessoas carregavam sacos de 40 kg nas costas, equilibradas em escadas apelidadas de “adeus, mamãe”, esperançosas de encontrar gramas de ouro que mudasse o rumo da vida. Poucos conseguiram.
Em 2002, Vila Trinta foi desmembrada de Marabá e vira cidade, ganha o nome de Curionópolis. Uma homenagem ao seu interventor e primeiro prefeito. Triste sina, definitivamente.
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