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Sobre mortes antes da hora
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Tânia Alves é formada em jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Começou no O PCeará e Política. Foi ombudsman do ornal por três mandatos (2015, 2016 e 2017). Atualmente, é coordenadora de Jornalismo..

Sobre mortes antes da hora

Tipo Crônica
Segundo testemunhas, as crianças brincavam na frente de casa, na comunidade do Sapinho, em Duque de Caxias (RJ); Polícia Civil afirmou que abriu investigação sobre o caso (Foto: Reprodução/TV Globo)
Foto: Reprodução/TV Globo Segundo testemunhas, as crianças brincavam na frente de casa, na comunidade do Sapinho, em Duque de Caxias (RJ); Polícia Civil afirmou que abriu investigação sobre o caso

A cidade inteira se viu melancólica quando a notícia da morte da jovem se espalhou rapidamente de casa em casa. Conviver com o morrer era muito comum por ali. Participar de velório era corriqueiro até mesmo para crianças, que frequentavam os enterros como para entender que a vida era finita. Mas aquele dia foi diferente. Enterrar os mais velhos, avôs e avós que geralmente morriam no aconchego de casa, próximo aos familiares, era natural. No entanto, saber que uma moça tinha morrido de repente trazia um aperto no coração e o clima na cidade ficava esquisito. Mesmo com sol, o dia parecia ficar coberto de tristeza.
O mesmo ocorria quando bebês morriam. E naquele tempo eram muitos. Acontecia, geralmente, sete dias após o nascimento. Para que a dor fosse mais contida, após a morte, as crianças eram tratadas como anjos. A cor do caixão, as mortalhas eram diferentes. As rosas não poderiam faltar no enterro. Muitas vezes almas caridosas visitavam as casas com jardim pedindo doação de rosas para cobrir o caixão.
A reverência e o respeito com que adultos e crianças tratavam as mortes de crianças e jovens me veio agora quando, meio que indiferente, o Brasil toma conhecimento da morte de duas crianças assassinadas a tiros em frente de casa, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro. Emilly Vitória, de 4 anos, e Rebeca Beatriz, de 7, estavam brincando quando os tiros, que teriam partido de policiais, começaram. Eram inocentes.
Não entendo um País onde a morte de duas crianças de forma violenta seja encarada como parte do dia a dia. Se o assassinato de duas meninas não traz comoção geral o que mais pode atingir os nossos corações? Morte de criança não deve ser tratada como normalidade. No Ceará, foram assassinadas 365 crianças e adolescentes somente até agosto deste ano. Não vejo as cidades parando em massa, ou todos se unindo para buscar justiça para essas mortes antes da hora.
Nestes dias, ao ler, ver e ouvir sobre a morte de Emilly e Rebeca sonhei que aquilo poderia ser um sinal para os brasileiros, seria um indicativo para união em torno de mais igualdade e justiça. Entendi, porém, que temos um longo caminho pela frente. Ele passa, necessariamente, por uma reformulação total na formação das forças de segurança e do nosso entendimento do que é ser cristão.

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