Jornalista e comentarista da área política, Vera Magalhães tem passagem por veículos como a Folha de S. Paulo, Veja e o Estado de São Paulo. Atualmente, é âncora do programa Roda Viva, além de colunista do O OPOVO, O Globo e da rádio CBN.
Jornalista e comentarista da área política, Vera Magalhães tem passagem por veículos como a Folha de S. Paulo, Veja e o Estado de São Paulo. Atualmente, é âncora do programa Roda Viva, além de colunista do O OPOVO, O Globo e da rádio CBN.
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Relatório da ONG Repórteres Sem Fronteiras contou 2,8 milhões de ataques contra jornalistas nas redes sociais no primeiro mês de campanha eleitoral oficial. Dessas investidas, a maioria esmagadora se destina a mulheres e, entre elas, os ataques dirigidos a mim lideram, disparado, o ranking, com a companhia de colegas como Míriam Leitão, Amanda Klein, Andréia Sadi e Mônica Bergamo.
No meu caso, a onda de ataques e agressões, inclusive a mais recente, de assédio presencial do deputado estadual bolsonarista Douglas Garcia, foi deflagrada a partir da investida de Jair Bolsonaro contra mim a uma pergunta feita a Ciro Gomes, com comentário do presidente, no debate de um pool de veículos de imprensa:
— Você é uma vergonha para o jornalismo brasileiro — disse Bolsonaro.
Foi a mesma frase reproduzida num cartaz com minha fotografia, içado num guindaste durante o 7 de Setembro em Copacabana. Também foi a mesma berrada por Garcia a poucos centímetros do meu rosto na última terça-feira, junto à mentira de que eu ganhava R$ 500 mil por ano para atacar o presidente.
Uniu-se ao pelotão de linchamento ontem a ministra Damares Alves, candidata ao Senado pelo Republicanos, que em entrevista à BandNews cometeu a leviandade de dizer que zombei do abuso sexual que ela relatou ter sofrido quando criança, algo que jamais ocorreu.
Esse assédio deflagrado pelo presidente, portanto autorizado, e continuado por seus apoiadores mais fiéis mostra uma campanha deliberada para minar a credibilidade da imprensa. Mais: trata-se de uma campanha de intimidação e acossamento permanente, brutal, violenta, não por acaso concentrada em mulheres, na expectativa de que nós, jornalistas, nos atemorizemos e, assim, consciente ou inconscientemente, nos autocensuremos, adotemos uma contenção ditada pelo medo físico e psicológico de exercer nosso ofício.
"Uma sociedade que, em qualquer proporção, se regozija de ataques desferidos contra profissionais que apenas exercem seu trabalho está doente, radicalizada, viciada em enxergar a política e o jornalismo como espetáculos sangrentos"
Esses expedientes não são invenção do bolsonarismo. Inscrevem-se na cartilha pela qual políticos populistas, com propensões autoritárias, agem para dilapidar a influência da imprensa nas sociedades e, com isso, gerar um ambiente em que o jornalismo profissional é substituído pela propaganda travestida de notícia e difundida por meio das redes sociais, de canais no YouTube e postagens em massa em aplicativos de mensagens.
Iniciativas de coalizões de imprensa, protocolos testados pela Justiça Eleitoral, acordos como o firmado pelo Ministério Público de São Paulo com entidades representativas dos jornalistas para tentar blindá-los de ataques são louváveis e necessários, mas, diante da virulência, da alta profissionalização, da falta de limites e da autorização oficial dos ataques por parte de autoridades, acabam sendo, por ora, uma forma de enxugar gelo.
Algo está muito errado com a democracia quando jornalista vira assunto ou, pior, personagem de uma campanha eleitoral. Somos ensinados, nas faculdades de jornalismo e ao longo da carreira, a reportar, entrevistar, analisar, questionar, sempre em terceira pessoa.
A fulanização de jornalistas, sobretudo mulheres, e dos ataques a eles e elas, a nós, na “pessoa física”, não é casual, é calculada. É muito grave que nossos nomes parem em hashtags acompanhados de palavras como “lixo”, “vergonha”. Uma sociedade que, em qualquer proporção, se regozija de ataques desferidos contra profissionais que apenas exercem seu trabalho está doente, radicalizada, viciada em enxergar a política e o jornalismo como espetáculos sangrentos, nos quais se tem de eleger todo dia “mocinhos” e “bandidos” para amá-los e odiá-los com intensidade.
Somos humanos, profissionais, falíveis, mas agimos segundo preceitos éticos e normas de jornalismo.
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