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Fóssil de crocodilo do Cariri pode ser o mais antigo descoberto no Brasil
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Fóssil de crocodilo do Cariri pode ser o mais antigo descoberto no Brasil

Réptil viveu entre 199 milhões e 155 milhões de anos atrás
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Parte de um crocodilo que viveu entre 199 milhões e 155 milhões de anos atrás, onde hoje se testemunha a Bacia do Araripe, é a mais nova evidência científica de que o Cariri cearense tem um universo paralelo. A relíquia, uma vértebra e outras interrogações investigadas por pesquisadores do Laboratório de Paleontologia da Universidade Regional do Cariri (LPU-Urca), deverá indicar que o réptil é o mais antigo fóssil do gênero descoberto no Brasil.

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O rastro do crocodilo do Jurássico, conta o paleontólogo Álamo Saraiva, continua sendo seguido em escavações no solo de Missão Velha - um dos seis municípios que esquadrinham o território do Geopark Araripe (geoparkararipe.urca.br), no Ceará. A busca é uma tentativa de achar o restante dos fragmentos do corpo da criatura pré-histórica que, já se sabe, era de água doce e pode ter medido entre 2 e 2,5 metros de tamanho. Um vertebrado mediano para uma era de criaturas gigantes.

É um quebra-cabeça iniciado há milhões de anos na Terra e que encontra na Bacia do Araripe encaixes importantes para se entender as transformações do mundo até aqui. "O fóssil precioso de um crocodilo ou de outro organismo nos ajuda a remontar um sistema do passado para estabelecer pontes e incursões com cenários atuais", simplifica Álamo Saraiva - coordenador do LPU. É uma autopsia do paleoambiente do animal arquivado na rocha para se saber a evolução e extinção de espécies.

Até hoje, das entranhas da Bacia do Araripe foram descritas três espécies de crocodilomorfos. Em 1959, o paleontólogo gaúcho Llewellyn Ivo Price batizou a primeira pedra de fóssil desse vertebrado: o Araripesuchus gomesii. Seguido, em 1987, pelo Caririsuchus camposi - descoberta de Alexander Kellner, atual diretor do Museu Nacional. E em 2003, o inglês David Martill e mais três cientistas deram nome e reconstituíram prováveis hábitos do Susisuchus anatoceps.

Há, fora da Cariri cearense, apenas dois fósseis associados às características do Araripesuchus gomesii. Pedras coletadas ou traficadas da Bacia do Araripe. É um crânio quase inteiro e uma mandíbula que fazem parte da coleção do antigo Departamento Nacional de Produção Mineração (atual Agência Nacional de Mineração), no Rio de Janeiro. E o fóssil de um "crocodilo juvenil", parcialmente completo, depositado no American Museum of Natural History, em Nova Iorque (EUA).

No próximo mês, revela Álamo Saraiva, um artigo científico sobre o crocodilo do Jurássico do Geopark Araripe será compartilhado pela revista Plos One. Uma plataforma online da Public Library of Science (https://journals.plos.org/plosone/) especializada em discussões sobre descobertas na ciência e na medicina.

Por enquanto, os detalhes sobre o achado e suas contribuições para o labirinto da história natural do planeta pedem discrição científica e sigilo. Há mais dúvidas do que respostas, completa Álamo Saraiva. "E isso é bom", afirma o cientista contra certezas traiçoeiras para a ciência que estuda vestígios do passado a partir de fósseis de bichos, micro-organismos, plantas e outras chaves para explicar existência.

Nas mesas do minúsculo e importante Laboratório de Paleontologia da Urca, cientistas do Ceará e da China se apertam para decifrar também mais três enigmas encontrados na jazida fossilífera do Geopark Araripe.

São fósseis de uma planta quase completa - uma gimnosperma do Cretáceo Inferior com aproximadamente 115 milhões de anos e garimpada nas pedreiras de calcário laminado de Nova Olinda. Há ainda a perna de um dinossauro, também do Cretáceo Inferior, escavado em Santana do Cariri. E a cabeça de um pterossauro apreendida pela Polícia Federal das mãos de traficantes especializados em passado.

O novo dinossauro, descoberto desta vez por cientistas do Laboratório de Paleontologia da Urca, se juntará a quatro já descritos da Bacia do Araripe. Esta semana, o paleontólogo e diretor do Museu Nacional, Alexander Kellner, desembarcará no Crato para se bater o martelo sobre anos de estudos em torno da espécie.

Alexander Kellner e Diógenes de Almeida Campos apresentaram, em 1996, o Angaturama limai. A criatura, ao lado do Irritator challengeri - descrito e desterrado pelo inglês David Martill, também em 1996 - representaram as primeiras descobertas da família dos spinossaurídeos na América do Sul. São dois dinossauros grandes, segundo Álamo Saraiva. Habitavam, provavelmente, o mesmo ambiente, possuíam focinho bem alongado e dentes desprovidos de serrilhas.

Para Kellner e Álamo Saraiva, os fósseis escavados na Bacia do Araripe têm notoriedade reconhecida no mundo dado o nível de conservação. Apesar dos milhões de anos debaixo da terra, apresentam partes de tecido mole - pele, vasos sanguíneos e fibras musculares preservadas em três dimensões.

O Santanarator placidus, decifrado por Kellner em 1999, é uma prova do incomum para a paleontologia e gatilho para o tráfico de peças raras saqueadas do Cariri cearense. O Mirischia asymmetrica, levado para ser descrito na Inglaterra por Darren Naish, em 2004, é outro exemplo.

A espécie, que poderia fazer parte da coleção do Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, em Santana do Cariri, possui "estruturas moles de parte do intestino", pronunciada assimetria dos ossos da cintura pélvica e um possível saco aéreo pós-púbico, de acordo com Guia de Trabalho de Campo em Paleontologia na Bacia do Araripe.

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