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"Críticas ao MST não surtiram efeito"
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"Críticas ao MST não surtiram efeito"

Deputado estadual eleito, Missias do MST projeta mandato na Assembleia e diz esperar PT e PDT trabalhando juntos na Casa
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Fortaleza, Ce, BR - 06.10.05 Na foto: Manoel Missias Bezerra, 40, do MST,  eleito duputado estadual pelo PT (Fco Fontenele/O POVO) (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Fortaleza, Ce, BR - 06.10.05 Na foto: Manoel Missias Bezerra, 40, do MST, eleito duputado estadual pelo PT (Fco Fontenele/O POVO)

Nascido em Ipueiras, mas criado em Crateús, no interior do estado, Manoel Missias Bezerra, 40, é o primeiro deputado estadual eleito no Ceará a levar o nome do MST na urna. No último domingo, 3 de outubro, “Missias do MST” recebeu 44.853 votos, assegurando uma das 46 cadeiras na Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE).

Numa campanha eleitoral cuja tônica foi de ataques à organização da qual faz parte, Missias avalia que, hoje, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra é visto de outra maneira pela população.

“Tenho a alegria de ser formado em Administração com as parcerias que o MST tem com mais de 60 entidades. No meu assentamento, por exemplo, temos duas médicas, temos agrônomo, temos pedagogo, tem jornalista, tem pessoas formadas em Direito. O movimento tem se tornado uma referência no estado e no Brasil”, afirma.

Em entrevista ao O POVO, o deputado eleito considera que, embora o movimento tenha sido alvo de críticas, de forma a atingir a candidatura de Elmano Freitas (PT) ao Governo, a entidade saiu mais fortalecida da disputa.

“Se alguém achou que falar do MST prejudicaria”, diz, “foi o contrário, inclusive na propaganda do Roberto Cláudio e do Capitão Wagner, ganhei um espaço gratuito que achei foi bom. Eu passava lá todo dia com o bonezinho do MST porque tentavam dizer que o MST era baderneiro, mas não surtiu muito efeito”.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

O POVO – O senhor se elegeu deputado estadual numa campanha em que a imagem do MST foi mobilizada de maneira negativa pelos candidatos ao Governo Capitão Wagner e Roberto Cláudio. Como avalia isso?

Missias do MST – O MST no Ceará tem 33 anos. Toda a luta do MST foi para que os camponeses tenham dignidade. Se hoje estou aqui, antes de ser deputado, eu fui um sem-terra. Não tinha terra pra morar, não tinha casa pra trabalhar, não tinha o que comer, vivia na miséria sendo submisso às vontades dos patrões. O MST vem pra isso, pra dar dignidade pra aqueles ou aquelas que vivem da terra pra ter uma vida melhor. Tenho a alegria de ser formado em Administração com as parcerias que o MST tem com mais de 60 entidades. No meu assentamento, por exemplo, temos duas médicas, temos agrônomo, temos pedagogo, tem jornalista, tem pessoas formadas em Direito. O movimento tem se tornado uma referência no estado e no Brasil, tem se fortalecido e fortalecido muitas bandeiras de luta que era papel do Estado fazer. Um exemplo, agora, na pandemia: distribuímos mais de 70 toneladas de alimentos quando as pessoas estavam passando fome na periferia de Fortaleza e em vários municípios do Ceará. Parece que isso incomoda elites. Um movimento que não pede a bênção a ninguém, tem sua autonomia e faz aquilo em que a gente acredita. Hoje no estado do Ceará muitos camponeses não vão trabalhar mais pros patrões como meu pai trabalhava antes, uma semana todinha. Levava a gente pra trabalhar. Quando chegava, só comia o feijão com farinha limpo e seco. No final da semana, o patrão dava o feijão de três anos, que minha mãe botava pra cozinhar seis horas da manhã e meio dia não tava cozinhado. Hoje nossa turma não vai trabalhar mais dessa forma. Por quê? Por causa dos programas sociais do governo Lula, criaram uma nova consciência. Muitos dos que estão nos assentamentos hoje estão nos assentamentos da reforma agrária e sabem se valorizar. Quando entramos numa candidatura, isso foi um patamar mais avançado para o MST no Ceará. Nós dizíamos na nossa campanha que íamos ocupar o Parlamento cearense. Também queremos ocupar um espaço que é direito nosso. Isso me parece que assustou o Capitão Wagner e assustou o Roberto Cláudio, que fizeram críticas ao MST, trazendo um histórico com muitas falácias pra confundir a sociedade e tentar queimar a imagem do companheiro Elmano, por ter sido um advogado do MST, que, de forma voluntária, ajudou não só o MST, mas ajudou vários movimentos pobres do Ceará.

OP – Apesar dessas críticas, o senhor se elegeu e o Elmano venceu ainda no primeiro turno, surpreendendo muita gente. Acha que as críticas não tiveram efeito e as pessoas têm hoje outra imagem do MST?

Missias – Eu tirei 44.853 votos em 45 dias de eleição, sem dinheiro, muito pela vontade dos nossos movimentos no Ceará, pelos amigos do MST. Ao mesmo tempo, eleger Elmano no primeiro turno, mesmo com todas as pancadarias que fizeram, não surtiu efeito. A gente se elegeu muito bem. Se alguém achou que falar do MST prejudicaria, foi o contrário. Inclusive, na propaganda do Roberto Cláudio e do Capitão Wagner, ganhei um espaço gratuito que achei foi bom. Eu passava lá todo dia com o bonezinho do MST, porque tentavam dizer que o MST era baderneiro, mas não surtiu muito efeito. Isso demonstra a importância que o MST tem hoje para a população brasileira. Se tiver tido efeito, foi com aqueles altamente de direita, que não gostam de pobre, não gostam de negro, não gostam de cigano, não gostam de LGBT, não gostam de povo, como o governo Bolsonaro hoje. Com essas pessoas a gente não tem muito com que se preocupar. Nossa preocupação é com os brasileiros e cearenses que querem ver um país melhor e um estado justo e que tenha igualdade para todos e todas.

OP – O PT elegeu oito deputados. Como projeta a sua atividade parlamentar na AL?

Missias – A nossa candidatura foi trazida com muito trabalho dos movimentos do Ceará, que já têm uma vida militante, um trabalho de base, têm suas bandeiras de luta e pautas. Nosso mandato vai ser para representar essas pautas e a luta dessa companheirada que faz isso muito bem. Claro que nossa luta vai para além disso, outros segmentos da sociedade, da área da educação, da cultura, da juventude. Queremos fazer um mandato o mais abrangente possível. Tenho dito que é pra fortalecer as pautas e bandeiras, aqueles e aquelas que mais precisam. Os invisibilizados, excluídos e marginalizados, aqueles que não têm oportunidade de se colocar e ser ouvido por alguém do estado e do parlamento.

OP – O cearense elegeu o senhor, mas também muitos candidatos ligados ao presidente Jair Bolsonaro (PL). Como imagina que vai ser o exercício parlamentar com uma bancada conservadora que sai bastante fortalecida das eleições? Acha que vai ter mais tensões do que em legislaturas anteriores?

Missias – O parlamento é um espaço democrático. Eu parto da ideia de que todos nós temos que saber ouvir, saber se colocar e saber se respeitar. Desde que não venha denegrir a imagem de ninguém, porque isso não acrescenta em nada, a exemplo do que vimos agora nos debates para presidente. Deixamos de discutir o Brasil para agredir um ao outro. Mas também digo que fui criado numa organização e não gosto de levar desaforo pra casa, no sentido de dizer que aquilo que vier pra construir e fortalecer o povo do Ceará, vamos estar debatendo. Mas aquilo que vier pra denegrir, não tenha dúvida de que não vamos admitir. Vamos para o debate. Eu tenho posição clara, tenho lado e tenho projeto. Sou da classe trabalhadora e vou defender a classe trabalhadora.

OP – Avalia que Elmano pode fazer um governo mais à esquerda do que o governo Camilo?

Missias – Elmano é um companheiro muito preparado. Sua militância toda foi com movimentos do campo e da cidade, vivenciou as realidades, como eu vivenciei. Sabe o que é pobreza, passou por muitos cantos onde as pessoas não tinham casa pra morar nem ter o que comer. O Elmano vivenciou isso como advogado que visitou essas populações. Isso conta muito, sua sensibilidade, sua história de vida, sua militância. Acho que vai ser um governo bom, acessível. Vai fazer um governo da esquerda, mas, pelo perfil do Elmano, vai governar para todos os cearenses. E deve ser assim. Ele é governador do Ceará e não deve governar só pros petistas, tem que governar pro povo cearense. Porém, acredito que vai fazer um bom governo, como o governo do Camilo foi um bom governo. Camilo passou por muitas crises grandes e teve muita habilidade, tivemos o problema da segurança, problema da seca, da pandemia, de corte de dinheiro. E fizemos uma boa gestão, não à toa que o povo reconheceu nas urnas dando uma grande votação a ele. Elmano vai fortalecer o que Camilo já vinha fazendo.

OP – Como vai ser a relação do PT com o PDT depois dessas eleições e do rompimento?

Missias – O que tenho acompanhado é que a relação do PT com o PDT tem sido muito boa nos governos Cid, depois no Camilo. Acredito que se não fosse uma coisa mais individual do Ciro Gomes, hoje a governadora seria a Izolda Cela com apoio do PT. Mas a circunstância da eleição nacional contaminou o Ceará, Ciro entendeu que deveria ser o candidato dele e por essa razão o Camilo ficou esperando até o último momento. O Cid e o Ivo Gomes têm tido uma postura muito respeitosa, não agrediram Camilo nem Elmano. Acho que isso demonstrou respeito ao trabalho do Camilo e do Elmano. Não tenho dúvida de que agora, nessa composição para o mandato do Elmano, vamos estar todos na base pra fortalecer o Ceará.

OP – Sobre o segundo turno presidencial. Dá pra aumentar a margem de votação de Lula no Ceará e no Nordeste?

Missias – Nós fomos bem e acredito que essa votação vai aumentar. Camilo e Elmano vão assumir a coordenação da campanha no Ceará pra elevar a votação em mais dois pontos ou até mais. Hoje é um papel de todos nós se empenhar nessa campanha. Não é uma campanha fácil, mas todos que são democratas e que defendem que precisamos ter um país mais justo, com menos ódio, menos perseguição, não tenho dúvida de que o lado tem que ser o lado do Lula. O que esse governo tem feito tem trazido muito sofrimento e dor pra muita gente.

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