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Luta contra discurso de ódio
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Luta contra discurso de ódio

Lola Aronovich narra trajetória contra discurso de ódio na internet e expõe expectativas sobre como o novo governo federal irá combater os ataques cibernéticos
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FORTALEZA, CEARÁ, 01-03-2023: Aguanambi entrevista a professora e escritora Lola Aronovich, que recentemente recebeu o convite para participar do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, do governo Lula. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo) (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS FORTALEZA, CEARÁ, 01-03-2023: Aguanambi entrevista a professora e escritora Lola Aronovich, que recentemente recebeu o convite para participar do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, do governo Lula. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo)

Discurso de ódio é definido como um ato de comunicação que inferiorize ou incite ira contra uma pessoa ou grupo, tendo por base características como raça, gênero, orientação sexual, entre outras. Banhado numa falsa noção de liberdade de expressão, esse tipo de incitamento se proliferou nos últimos anos, principalmente através da Internet. Há 12 anos, Lola Aronovich é uma das vítimas do discurso de ódio nas redes sociais.

Professora da Universidade Federal do Ceará, no Departamento de Estudos da Língua Inglesa, Suas Literaturas e Tradução (DELILT), e ativista feminista, Lola ficou conhecida através do blog "Escreva Lola Escreva", criado em 2008. Através da plataforma, escrevia sobre cinema, literatura, feminismo, política, entre outros temas. Chegou a atingir mais de 200 mil visitas mensais, conquistando internautas interessados em debater os assuntos que abordava, mas também atraindo "trolls", termo que usa para se referir aos homens que entram em sua página para proferir discursos de ódio.

"O que tem de crimes contra mulheres na internet… é gigantesco", afirma Lola. Os ataques que a ativista recebe diariamente incluem ameaças de agressão física, estupro e morte. A situação da professora levou o Governo Federal a sancionar a Lei Lola (13.642/18), em 2018, destinada a investigação de casos de misoginia na internet pela Polícia Federal.

A experiência de Lola nessa luta também a fez ser convidada para integrar o novo grupo de trabalho criado pelo governo federal, no final de fevereiro, vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Apesar do grupo representar um avanço na sociedade, também trouxe ainda mais ataques a Lola. "Desde que meu nome foi anunciado, aqueles velhos inimigos de sempre aparecem. Vem falar que eu que faço discurso de ódio. Para eles, lutar pelas mulheres, é discurso de ódio", comenta.

A equipe é formada por especialistas de diversas áreas, estudiosos, comunicadores, influenciadores digitais, entre outros, que deverão propor formas de combate ao discurso de ódio e ao extremismo. A ex-deputada Manuela d'Ávila preside a equipe, que também tem a participação do youtuber Felipe Neto, da antropóloga Debora Diniz Rodrigues e do psicanalista Christian Dunker. O grupo terá duração de 180 dias e, ao final, produzirá um relatório final das atividades, que será encaminhado ao ministro do MDHC, Silvio Almeida.

Até o momento, os integrantes não se reuniram, mas Lola celebra a criação da equipe e, em entrevista ao O POVO, avalia como o Brasil tem lidado com o discurso de ódio nos últimos anos e expõe suas expectativas sobre como o novo governo federal irá trabalhar o tema.

O POVO: Fazendo uma análise dos últimos anos, o discurso de ódio na internet melhorou ou piorou?

Lola - Piorou muito com a eleição do Trump nos Estados Unidos, em 2016, e com a eleição do Bolsonaro em 2018. Porque é como se vários grupos neonazistas, de ódio, tivessem saído do armário. Para eles, o Bolsonaro e o Trump são ídolos. Então, eles idolatram esses caras, eles veem que esse cara tem todo um histórico de declarações misóginas, declarações e atuações misóginas, e também racistas e homofóbicas, e o cara não só nunca é punido, como também é eleito presidente. Então, eles começam a pensar: "Bom, se o cara não é punido, eu posso começar a fazer vídeo com a minha cara". Porque até então, se você analisar bem, os canais de YouTube de "masculos" já existiam antes, mas eles mudavam a voz, eram anônimos, apareciam fantasiados, o cara tinha muito medo que a identidade real dele fosse revelada. E com o Trump isso acabou. Os canais cresceram e a gente sabe como funcionam as plataformas também. As plataformas impulsionam conteúdo de direita, conteúdo misógino.

O POVO: Por que as plataformas impulsionam esse tipo de conteúdo?

Lola - É uma discussão antiga, uma cobrança muito antiga, que tem bem mais de dez anos, de ativistas em geral, em todo o mundo, em cima das plataformas, que eles têm que fazer alguma coisa. A gente entende por um lado que canais com conteúdo misógino, eles viciam, eles são viciantes. Você fica querendo voltar, ver a última loucura que eles falaram, a última teoria da conspiração, quem que eles estão difamando agora, a última barbaridade que eles estão defendendo. Então, isso gera muito mais engajamento do que se você recomendar sites de direitos humanos. Acho que tem alguma coisa muito sinistra na gente, ser humano em geral, não digo só brasileiro, que faz a gente ver um acidente de carro e todo mundo para, pra ver, os carros param pra ver. Por que tem que ver um acidente? Mas as pessoas têm esse lado de querer ver as piores coisas. Então, na internet, é isso. Essa atração por coisas bizarras, repulsivas, que faz com que a gente se engaje com canais de direita.

O POVO: O que é preciso fazer para mudar?

Lola - Precisa ter uma regularização, as plataformas precisam ser responsabilizadas, precisa ter um diálogo maior com as plataformas também. Tem que ter algum limite. Antes de ter o blog, eu era mais liberal, mas depois mudei, pensei que há coisas que não trazem absolutamente nenhum benefício para a sociedade, muito pelo contrário, espalham ódio, mentiras, desinformação e recrutam pessoas para fazerem massacres. Você quer dar liberdade de expressão pra um bando de gente com problemas? Não. Eu acho também que tudo passa pela educação. A gente tem que ter espaços nas escolas para que as crianças e os adolescentes possam conversar sobre isso, possam realmente falar sobre internet.

O POVO: Quais expectativas sobre como o novo governo irá combater o discurso de ódio na internet?

Lola - Eu tenho muitas esperanças com esse novo governo. Lutei para que esse governo fosse eleito. Já vejo muitas mudanças. Saiu uma Damares e entrou um Silvio Almeida, uma pessoa que é tão importante, inteligente. Então, a gente já vê muitas mudanças, no que esse governo quer propor. Se o Bolsonaro tivesse sido eleito, eu realmente estava pensando em sair do Brasil. A minha vida estava em risco. Minha vida sempre esteve em risco. As ameaças começaram durante um governo do PT. Continuei sendo atacada no governo Temer, no governo Bolsonaro e continuo sendo atacada agora. Acho que os ataques vão continuar independente do governo. Mas, por exemplo, tem uma lei no meu nome, a Lei Lola, que foi sancionada em abril de 2018 pelo Temer, com autoria de Luizianne Lins, e meio que faz com que a Polícia Federal investigue crimes contra mulheres na internet. Mas essa lei foi sancionada durante um governo que não tinha muito interesse pelos direitos humanos. Daí veio o governo Bolsonaro e piorou de vez. Então, a Polícia Federal, muito aparelhada, não teria interesse em investigar crimes muitas vezes cometidos por apoiadores do Bolsonaro. Espero que agora possamos impulsionar isso e criar novas leis. A gente certamente tem um governo comprometido com direitos humanos, com combate a violência contra mulheres, contra gays, contra negros. Acho que esse comprometimento é superimportante. Sinceramente, a gente estava num governo que era genocida. Tinha as piores intenções. Mas, só a intenção não é suficiente, a gente sabe que são muitos desafios e espero que o governo possa enfrentar muitos deles e trazer coisas boas.

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O POVO: Fazendo uma análise dos últimos anos, o discurso de ódio na internet melhorou ou piorou?

Lola: Piorou muito com a eleição do Trump nos Estados Unidos, em 2016, e com a eleição do Bolsonaro em 2018. Porque é como se vários grupos neonazistas, de ódio, tivessem saído do armário. Para eles, o Bolsonaro e o Trump são ídolos. Então, eles idolatram esses caras, eles vêm que esse cara tem todo um histórico de declarações misóginas, declarações e atuações misóginas, e também racistas e homofóbicas, e o cara não só nunca é punido, como também é eleito presidente. Então, eles começam a pensar: “Bom, se o cara não é punido, eu posso começar a fazer vídeo com a minha cara”. Porque até então, se você analisar bem, os canais de YouTube de "masculos" já existiam antes, mas eles mudavam a voz, eram anônimos, apareciam fantasiados, o cara tinha muito medo que a identidade real dele fosse revelada. E com o Trump isso acabou. Os canais cresceram e a gente sabe como funcionam as plataformas também. As plataformas impulsionam conteúdo de direita, conteúdo misógino.

O POVO: Por que as plataformas impulsionam esse tipo de conteúdo?

Lola: É uma discussão antiga, uma cobrança muito antiga, que tem bem mais de dez anos, de ativistas em geral, em todo o mundo, em cima das plataformas, que eles têm que fazer alguma coisa. A gente entende por um lado que canais com conteúdo misógino, eles viciam, eles são viciantes. Você fica querendo voltar, ver a última loucura que eles falaram, a última teoria da conspiração, quem que eles estão difamando agora, a última barbaridade que eles estão defendendo. Então, isso gera muito mais engajamento do que se você recomendar sites de direitos humanos. Acho que tem alguma coisa muito sinistra na gente, ser humano em geral, não digo só brasileiro, que faz a gente ver um acidente de carro e todo mundo para, pra ver, os carros param pra ver. Por que tem que ver um acidente? Mas as pessoas têm esse lado de querer ver as piores coisas. Então, na internet, é isso. Essa atração por coisas bizarras, repulsivas, que faz com que a gente se engaje com canais de direita.

O POVO: O que é preciso fazer para mudar?

Lola: Precisa ter uma regularização, as plataformas precisam ser responsabilizadas, precisa ter um diálogo maior com as plataformas também. Tem que ter algum limite. Antes de ter o blog, eu era mais liberal, mas depois mudei, pensei que há coisas que não trazem absolutamente nenhum benefício para a sociedade, muito pelo contrário, espalham ódio, mentiras, desinformação e recrutam pessoas para fazerem massacres. Você quer dar liberdade de expressão pra um bando de gente com problemas? Não. Eu acho também que tudo passa pela educação. A gente tem que ter espaços nas escolas para que as crianças e os adolescentes possam conversar sobre isso, possam realmente falar sobre internet.

O POVO: Quais expectativas sobre como o novo governo irá combater o discurso de ódio na internet?

Lola: Eu tenho muitas esperanças com esse novo governo. Lutei para que esse governo fosse eleito. Já vejo muitas mudanças. Saiu uma Damares e entrou um Silvio Almeida, uma pessoa que é tão importante, inteligente. Então, a gente já vê muitas mudanças, no que esse governo quer propor. Se o Bolsonaro tivesse sido eleito, eu realmente estava pensando em sair do Brasil. A minha vida estava em risco. Minha vida sempre esteve em risco. As ameaças começaram durante um governo do PT. Continuei sendo atacada no governo Temer, no governo Bolsonaro e continuo sendo atacada agora. Acho que os ataques vão continuar independente do governo. Mas, por exemplo, tem uma lei no meu nome, a Lei Lola, que foi sancionada em abril de 2018 pelo Temer, com autoria de Luizianne Lins, e meio que faz com que a Polícia Federal investigue crimes contra mulheres na internet. Mas essa lei foi sancionada durante um governo que não tinha muito interesse pelos direitos humanos. Daí veio o governo Bolsonaro e piorou de vez. Então, a polícia federal, muito aparelhada, não teria interesse em investigar crimes muitas vezes cometidos por apoiadores do Bolsonaro. Espero que agora possamos impulsionar isso e criar novas leis. A gente certamente tem um governo comprometido com direitos humanos, com combate a violência contra mulheres, contra gays, contra negros. Acho que esse comprometimento é super importante. Sinceramente, a gente estava num governo que era genocida. Tinha as piores intenções. Mas, só a intenção não é suficiente, a gente sabe que são muitos desafios e espero que o governo possa enfrentar muitos deles e trazer coisas boas.

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