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Maracatus retratam resistência da mulher negra
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Maracatus retratam resistência da mulher negra

| Preparativos para desfiles | Quatro agremiações levam à avenida histórias de mulheres negras como símbolo de vigor, coragem e força
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ADERECISTA Paulo Cesar está na reta final da preparação no barracão do Maracatu Rei Zumbi (Foto: FABIO LIMA)
Foto: FABIO LIMA ADERECISTA Paulo Cesar está na reta final da preparação no barracão do Maracatu Rei Zumbi

São loas que entoam toda a força dos passos de quatro mulheres negras para o destino do seu povo. Em batidas cadenciadas, as músicas reproduzem uma parte das histórias narradas há séculos, mas desconhecida da maioria. Se, pela repetição dos causos, elas foram colocadas como coadjuvantes, parte das agremiações de maracatus do Carnaval de Fortaleza mostra o protagonismo feminino. Os próximos sábado e domingo, na avenida Domingos Olímpio, são dias de conhecer a santificada Anastácia, a guerreira Dandara, o casamento da rainha negra e a líder Tereza de Benguela.

Com tema Dandara, mulher guerreira, o Maracatu Kizomba leva à avenida narrativa sobre liderança quilombola fundamental para a história do País. Pouca gente conhece o papel da companheira de Zumbi dos Palmares e mãe de três filhos dele. Dandara terá a trajetória contada na perspectiva de ter aprendido capoeira e liderado mulheres e homens, na segunda metade do século XVII, na defesa do Quilombo dos Palmares. Batalhou pela liberdade até o fim da vida: preferiu a morte a voltar a ser escrava. "É sobre a força de mulher, na representação maior que foi a Dandara", diz Wellington Ferreira, vice-presidente do Kizomba.

No desfile, a agremiação faz uma ligação com a contemporaneidade ao incluir como assunto o combate ao feminicídio. "Não é tarefa fácil. Mas existe a possibilidade de tentar salvar vidas. É mostrar para as mulheres que sofrem violência doméstica que elas devem buscar ajuda", diz Ferreira.

Já o Maracatu Az de Ouro narra a resistência de uma mulher santificada, uma princesa do povo Bantu, nascida no Rio de Janeiro. Filha de uma princesa escravizada vinda do Congo e de um homem branco, Anastácia era uma mulher que fazia liderança junto aos negros na senzala. Marcos Gomes, secretário da agremiação, conta que ela, muito bonita, sofria com constantes assédios do capitães e do próprio senhor de engenho. Foi, então, sentenciada a usar uma máscara de ferro por toda a vida, que só era retirada na hora de se alimentar.

Anastácia teria o poder da cura. As narrativas contam que ela impunha as mãos sobre pessoas doentes e os males desapareciam. O dom que possuía acabou levando a mulher a salvar a vida do filho do fazendeiro que a violentou: em desespero, a família decidiu recorrer à escrava para salvar a vida do menino. A narrativa conta que ela suportou por anos a violência dos espancamentos, que só cessaram com a morte. A resistência diante da dor e dos maus tratos acabou por dar forças para luta a outras pessoas escravizadas.

A beleza dos desfiles inspirou o enfermeiro Téo Lima no tema deste ano. Presidente do Maracatu Rei Zumbi, ele decidiu fazer da festa da passagem pela Domingos Olímpio a celebração do casamento da rainha negra com a proteção do orixá que rege o maracatu. O resultado é o tema O Casamento da rainha com as bênçãos de Oxalá, que passa pela via no sábado, 2.

O Nação Fortaleza leva para o desfile a história de uma guerreira negra, Tereza de Benguela. Após a morte do companheiro que liderava o Quilombo do Quariterê, hoje cidade de Vila Bela da Santíssima Trindade, no Mato Grosso, Tereza se tornou rainha, líder e referência para seu povo. Não se sabe se Tereza de Benguela nasceu no continente africano ou no Brasil, muito menos a data. O que se compreende é que Tereza viveu durante o século XVIII no Vale do Guaporé, no Mato Grosso, e foi a maior liderança do Quilombo do Quariterê. Os escravos fugidos para o hoje município de Vila Bela da Santíssima Trindade formaram o maior quilombo do Mato Grosso e foram resistência às ações dos bandeirantes entre 1730 e 1795.

 

Desfiles de maracatus

OUTRAS APRESENTAÇÕES

Maracatu Rei de Paus - Tema: A ancestralidade africana, povo do ketu, os jêjes e os nagôs. A agremiação percorre a Domingos Olímpio falando sobre um povo africano que veio escravizado para o Brasil e se instalou nos estados da Bahia, do Ceará e do Rio de Janeiro.

Maracatu Vozes da África. Tema: Comida de Santo, Banquete Sagrado. Para a avenida, o grupo vai levar as comidas dos santos e panelas de barro.

Maracatu Solar - Tema: Para Minha Mãe, Iemanjá. A agremiação vai contar a história da orixá associada aos rios e desembocaduras, à fertilidade feminina, à maternidade e, primordialmente, ao processo de gênese do mundo e a continuidade da vida.

Maracatu Nação Pici - Tema: João Cândido - A revolta da Chibata.

Maracatu Nação Iracema - Tema: Afoxé filhos de Gandhy e o Maracatu

do Movimento, a f

orça da negritude.

Maracatu Filhos de Oxossi. Tema: No Batuque do Tambor, faz um louvor de amor, em homenagem ao continente negro, mãe de toda civilização.

Maracatu Nação Pindoba - Tema: Mãos que curam.

Maracatu Nação Iracema: Afoxé filhos de Gandhy e o Maracatu do Movimento, a força da negritude.

PROGRAMAÇÃO

2/3, a partir das 18h30min

Maracatus Solar

Nação Axé de Oxóssi

Nação Palmares

Rei Zumbi

Nação Fortaleza

Filhos de Iemanjá

Pindoba

Kizomba

3/3, a partir das 17 horas

Blocos Adeus Amélia e Papelão

Maracatu Nação Baobab

Nação Pici

Vozes da África

Rei de Paus

Nação Iracema

Az de Ouro

 

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