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O governador, a CGD e a árdua missão de fiscalizar e punir
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Ricardo Moura é jornalista, doutor em Sociologia e pesquisador do Laboratório da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC)

O governador, a CGD e a árdua missão de fiscalizar e punir

Tipo Opinião

Criada em 13 de junho de 2011, a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD) é uma experiência pioneira no campo da segurança pública por reunir em um só órgão as atividades de fiscalização e correições preventivas e extraordinárias de policiais militares, bombeiros militares, policiais civis e agentes penitenciários.

Surgida inicialmente como Corregedoria Geral dos Órgãos de Segurança Pública e Defesa Social, a CGD passou a investigar os agentes vinculados à Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), ampliando seu alcance e suas atribuições. A manutenção desse trabalho apesar das mudanças ocorridas na gestão estadual é algo louvável e bastante raro.

Em 2018, 770 procedimentos foram instaurados pela Controladoria. Desse total, 677 processos foram arquivados enquanto 147 resultaram em punição. A quantidade de demissões e expulsões diminuiu na comparação com o ano anterior: 14 agentes foram demitidos, mas nenhum foi expulso. Em 2017, foram 26 demissões e uma expulsão.

Corrupção passiva e associação criminosa são os principais motivos para punição na Polícia Militar. As causas na Polícia Civil são mais variadas, passando por tráfico de drogas a extorsão qualificada. Os números, contudo,não conseguem traduzir a constante tensão pela qual o órgão atravessa.

Quando uma denúncia chega à CGD, muitas vezes o agente denunciado precisa ser afastado de suas funções até que o procedimento seja concluído. Pela análise dos dados, é possível perceber que o percentual de punição gira em torno de 20%, ou seja, não se trata de um índice tão elevado. Ainda assim, volta e meia surgem cobranças de parlamentares ligados à Bancada da Segurança Pública exigindo a extinção da Controladoria porque sua atuação estaria "prejudicando" o trabalho dos policiais.

Sob o argumento da "defesa da sociedade" o que se busca é conferir uma licença especial para a atuação dos agentes, reduzindo a possibilidade de um controle externo mais efetivo. Muitos desses discursos são, na realidade, uma defesa implícita da corporação travestida de interesse público.

É preciso que a atividade policial seja fortalecida, com melhores condições de trabalho aos profissionais e reconhecimento do trabalho. Mas é preciso também diferenciar os maus agentes dos bons e puni-los conforme as prescrições legais. Possíveis arbitrariedades ou perseguições precisam ser denunciadas e vir a público. É sabido que o recurso da denúncia pode ser mobilizado como uma estratégia de criar obstáculos à atuação policial. Essas falhas, contudo, em nada inviabilizam a existência do órgão.

"É preciso que a atividade policial seja fortalecida, com melhores condições de trabalho aos profissionais e reconhecimento do trabalho. Mas é preciso também diferenciar os maus agentes dos bons e puni-los conforme as prescrições legais"

A investigação das mortes por intervenção policial é extremamente necessária embora cause transtornos óbvios aos envolvidos. Não é aceitável naturalizar o fato de que, nos últimos quatro anos, 575 pessoas foram mortas dessa maneira. Cabe à Controladoria estabelecer a diferença entre o que se deveu a confrontos e o que pode ter sido mais um crime cometido por agentes do Estado. Não se trata de "defender bandido", mas de garantir a segurança dos próprios cidadãos. Casos como as chacinas do Curió e de Milagres devem ter uma resposta à altura do poder público sob o risco de entrarmos literalmente em um território sem lei.

O governador Camilo Santana tem um árduo desafio de manter os órgãos de segurança pública sob os ditames da legalidade. Transigir afrouxando o rigor dos controles externos certamente sinalizará uma demonstração de fraqueza diante de um contingente de profissionais com forte representação política nas mais diversas esferas de poder. O que está em jogo, portanto, é a própria capacidade do Governo do Estado manter o comando sobre seus agentes.

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