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Remédio para artrite, lúpus e malária está em falta nas farmácias após divulgação de eficácia para Covid- 19
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Remédio para artrite, lúpus e malária está em falta nas farmácias após divulgação de eficácia para Covid- 19

A busca estrondosa por reuquinol zerou estoque de remédio apontado como eficaz contra o novocoronavírus; há três caixas em uma das unidades consultadas pelo O POVO
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Fortaleza, Ceará Brasil 21.03.2020 Serviços Essenciais - funcionamento de farmácia durante o quarentena de combate ao corona virus.(Fco Fontenele/O POVO) (Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE Fortaleza, Ceará Brasil 21.03.2020 Serviços Essenciais - funcionamento de farmácia durante o quarentena de combate ao corona virus.(Fco Fontenele/O POVO)

Após a fala do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e artigos publicados apontando que a hidroxicloroquina (Reuquinol) teria eficácia contra a Covid-19, O POVO ligou para sete redes de farmácias e drogarias em Fortaleza para saber se ainda há estoque do remédio ou similares, como a cloroquina. A droga foi encontrada em apenas uma rede, em outras seis já não há mais. O medicamento é fundamental no tratamento de pessoas com artrite, lúpus, malária e doenças autoimunes. Mesmo com o discurso do líder americano, não está totalmente comprovado a eficácia do Reuquinol contra o novo coronavírus.

Um dos estabelecimentos contatados pela reportagem foi a Pague Menos. Na unidade, o atendente informou que desde a semana passada não há o medicamento. Ele não soube informar se há solicitação de nova remessa. Segundo o funcionário, um dos entraves é a travessia dos veículos por rodovias estaduais. O colaborador ainda afirmou sobre a escassez do produto na prateleira de outras unidades da empresa.

A preocupação do atendente da Pague Menos deve-se ao decreto do governador Camilo Santana (PT), divulgado na última semana, para bloqueio temporário das divisas com outros estados, para conter o avanço do novo coronavírus.

Um contratado da Drogasil informou que a baixa do estoque ocorreu após muitas pessoas, mesmo sem prescrição médica, buscarem pelo produto a partir dos rumores sobre o uso da medicação contra a Covid-19. Na rede de farmácias faltam unidades do material. Segundo o empregado, o Reuquinol custa R$ 77,20 enquanto a cloroquina é vendida por R$ 70.

Na última sexta-feira, 20, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) enquadrou esses dois fármacos como medicamentos de controle especial. Conforme o órgão, a medida é para evitar que pessoas não necessitadas da droga provoquem um desabastecimento no mercado. A partir de então, nas farmácias e drogarias, a venda só pode ser feita para pessoas com a receita especial, para que uma via fique retida na farmácia e outra com o paciente. Apesar disso, o medicamento pode ser vendido sem prescrição até 30 dias após a decisão.

Com o novo cenário, os estabelecimentos são obrigados a registrar todas as entradas e saídas do medicamento e o seu estoque, além dos dados dos consumidores. “Apesar de alguns resultados promissores, não há nenhuma conclusão sobre o benefício do medicamento no tratamento do novo coronavírus", informa a Anvisa. 

O POVO também consultou unidades da Extrafarma. Logo no primeiro contato, a atendente informou que a venda só estava sendo feito com receita médica. “Aqui nós não temos. Como está sendo muito procurado, também não informamos onde pode ter”. Apesar da recusa, a funcionária indicou dois números. Um de estabelecimento na Messejana, outro instalado na avenida Oliveira Paiva.

Na primeira unidade contatada, a colaboradora informou que não há itens do remédio no estoque da rede. Assim como nas outras empresas, sem previsão de chegada. 

Também não foi encontrado na Drogaria Iparana. Lá, quem atendeu foi pessimista. “Entregamos na mão de Deus, né?.” Sem entender muito o que aconteceu, a pessoa confidenciou incredulidade quando comentou sobre a busca inesperada pelo produto.

A equipe da reportagem também ligou para uma das unidades da Dose Certa. Um funcionário relatou as mesma impressões que os demais. Também não soube informar quando nova remessa do Reuquinol ou cloroquina chegaria. Na Farmácia Santa Branca, a mesma situação.

Por último, buscamos uma das unidades da Aldesul. No primeiro contato, a atendente afirmou que naquela unidade não havia o medicamento. Mas indicou outra, onde “com certeza” teria. Ao tentar o estabelecimento indicado, o funcionário informou que não havia mais a cloroquina, mas estavam com três caixas de Reuquinol.

“Tá acabando. Tem que ser rápido. Se vier, traga a receita. Tá de R$ 82,40”, disse apressado um dos vendedores.

O Ministério Público do Ceará (MPCE) requisitou, nesta segunda-feira, 23, informações à Secretaria Estadual da Saúde (Sesa) acerca das providências adotadas para a distribuição dos medicamentos para a rede privada de saúde, tanto para os hospitais privados, como para os pacientes que não são atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e precisam da medicação e não estão conseguindo encontrar nas farmácias. O órgão deve responder ao ofício da 137ª Promotoria de Justiça em até 48 horas por meio de peticionamento eletrônico no Sistema de Automação da Justiça (SAJ) do MPCE.

Dependentes

Na última semana, durante a estrondosa procura pelo Reuquinol, a comerciante Eliana Soares, 53, precisou comprar o medicamento para tratar a Lúpus, mas não conseguiu. Diagnosticada em 2015, a empreendedora usa diariamente o remédio. A aquisição só foi possível graças a uma doação de outros pacientes após intermédio de um dos médicos responsáveis pelo tratamento de Eliana.

Ela critica a fala “irresponsável” dos líderes políticos sobre a cura do coronavírus usando o Reuquinol. “Não é só a fala de uma pessoa. O pior é a solidariedade daqueles que têm maior poder aquisitivo. Eles vão nas farmácias e compram em grande quantidade. Por isso que falta”, comenta.

A comerciante relata que recebeu doações de várias pessoas. A quantidade foi tanta que decidiu doar para conhecidos que também estavam sem o medicamento. Mas garantiu o produto até maio para continuar o tratamento e impedir o avanço da Lúpus. O remédio também é usado contra artrite, malária e outras doenças autoimunes.


Especialista

O reumatologista Joerun de Carvalho frisa que o uso indevido do Hidroxicloroquina ou cloroquina tem efeitoS colaterais. Conforme o especialista, o indivíduo pode ter reação alérgica ao usar o Reuquinol, além de ser tóxico para retina e, potencialmente, causar fotossensibilidade.

Conforme Carvalho, vários pacientes relataram que não estão encontrando os medicamentos. A indicação dada é esperar um pouco mais. O médico frisa que o maior laboratório de produção do Reuquinol triplicou a produção após a demanda inesperada.

“Muitas pessoas compraram e estão estocando em casa sem a indicação de uso. Se os pacientes ficarem sem a medicação por alguns dias não terá muito efeito. Mas se prolongar, podem perder o controle da doença e ter complicações. As pessoas que compraram pensando na prevenção do vírus, ou mesmo no tratamento, deveriam disponibilizar para quem precisa no momento e não usar por conta própria”, sugeriu Joeron.

Apsen Farmacêutica

No Instagram, a Apsen, umas das fabricantes do medicamento com a molécula hidroxicloroquina, apontada por alguns estudos internacionais como eficaz no tratamento da Covid-19, afirmou ter triplicado a produção do material. Além disso, a empresa destacou “contato frequente” com as autoridades de saúde do país durante a pandemia do novo coronavírus.

A Apsen também afirmou que vai doar parte do estoque do medicamento para o Ministério da Saúde para que possam utilizá-lo de forma adequada no tratamento dos casos do Sars Cov-2 no País.

“É fato que aumentou a procura pelo medicamento nas farmácias por conta das notícias de seus possíveis benefícios contra o coronavírus, por isso implementamos um plano emergencial visando o aumento da produção do medicamento que será, neste primeiro momento, triplicada para cobrir as necessidades dos pacientes crônicos que já utilizam a medicação, reforçando que a compra deve ser feita sempre com prescrição médica”, diz o texto.

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