Regiões mais intensamente afetadas no início pandemia, como Fortaleza, apresentam recuo da disseminação, mesmo com a reabertura. Apesar de longe de uma imunidade coletiva, é certo que a quantidade de pessoas já imunizadas é muito maior que os números oficiais. Soma-se a esse fator, as medidas de proteção como uso de máscara e proibição de aglomerações. Pesquisas recentes sugerem que o porcentual de indivíduos infectados para atingir a imunidade coletiva seria menor do os 60% a 70% estimados. Contudo, nada é garantia de tranquilidade, visto que o não se sabe por quanto tempo dura a imunidade do organismo humano ao novo coronavírus.
Além de a quantidade de testes realizados ser insuficiente, algumas pessoas infectadas podem ter redução de anticorpos pós-recuperação, o que resultaria em sorologia negativa, ou não ter desenvolvido anticorpos mas outros tipos de resposta imunológica. Cenários que contribuem para a subnotificação.
Em um cenário que o platô pode ter sido atingido mesmo sem a implantação de medidas de contenção efetivas como no Brasil, de forma geral, a quantidade de pessoas já infectadas pode ser 10 vezes maior que os números oficiais, conforme Alessandro Farias, pesquisador do Departamento de Genética, Evolução, Microbiologia e Imunologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). "O que não impede que tenha uma segunda. Acho que não vamos ter. Seria mais provável novos pequenos picos dentro de uma mesma onda que está caindo", aponta. O coordenador da Frente de Diagnósticos da Força-Tarefa da Unicamp contra a Covid-19, ressalta que muitas pessoas ainda estão fazendo isolamento ou realizando o mínimo de atividades possível, principalmente os mais idosos.
"Não acredito que haverá uma segunda onda. Porque não foi o que a gente viu em outros países. A gente vê picos isolados. Surtos localizados. Com a flexibilização (em Fortaleza), era esperado até um aumento de casos, o que não houve", corrobora Luciano Pamplona, biólogo epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC).
De acordo com a epidemiologista Lígia Kerr, professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da UFC, é possível ainda considerar imunidade cruzada com outros coronavírus. "Pesquisas dizem que alguns dos coronavírus que já circulavam no mundo têm 40%, 60% da parte genética similar do Sars-Cov-2", diz.
Um dos estudos que estima imunidade coletiva menor, publicado no final de junho pela revista Science, considera que heterogeneidade da população pode impactar a imunidade induzida pela doença, "pois a proporção de infectados nos grupos com as maiores taxas de contato é maior do que nos grupos com baixas taxas de contato".
A imunidade coletiva é a taxa de pessoas imunizadas em determinada população que pode conter a disseminação de uma doença. Uma imunidade de rebanho considerando pessoas que já foram infectadas, e não a imunização por meio de vacina, acarreta um "custo" alto em termos de mortes em decorrência da patologia. "Se a proteção for curta, não adianta atingir a imunidade coletiva porque as pessoas poderão ser infectadas de novo", alerta Keny Colares, infectologista do Hospital São José e integrante do Comitê Estadual de Enfrentamento à Covid-19.
A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS) considera que "o limiar para estabelecer imunidade de rebanho para a Covid-19 não está claro no momento". "Não há evidência de que o Brasil ou áreas do Brasil tenham atingido a imunidade do rebanho. Para atingi-lá, estima-se que pelo menos entre 50% e 80% da população precise estar imune ou ter sido exposta e infectada pelo vírus", afirma Marcos Espinal, diretor do Departamento de Doenças Transmissíveis e Determinantes Ambientais da Saúde da Opas. "Não recomendamos a abordagem de tentar obter imunidade de rebanho, porque o custo, em termos de perda de vidas, será enorme", acrescenta.
Escolas, bares, academias e cinemas estão fora da 4ª Fase
Escolas, bares, academias e atividades de entretenimento presenciais como shows, espetáculos e cinema estão fora da 4ª Fase do Plano de Retomada da Atividade Econômica em Fortaleza, adiantou nesta quarta-feira, 15, Camilo Santana (PT).
Segundo o governador, há preocupação por parte do Comitê Estadual de Enfrentamento à Pandemia em relação às aglomerações, principalmente no retorno presencial das escolas. Ainda haverá avaliação se Fortaleza realmente entrará na quarta fase do Plano. Ele afirmou que o Comitê irá se reunir com os setores deixados de fora da 4ª Fase para avaliar protocolos sanitários e fases de retomada.
"(Vamos avaliar a possibilidade) de forma híbrida de retorno às aulas, sendo remota e presencial, e apresentar as expectativas para um calendário futuro", disse em entrevista a um telejornal.
O Comitê tem reunião marcada no final da semana. De acordo com Camilo, tanto os números de contágio, quanto os de atendimento (como taxa de ocupação de UTIs) têm caído.
O Ceará chega aos 141.832 casos confirmados e 7.081 mortos por Covid-19, conforme atualização da plataforma IntegraSUS, da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), às 17h20min de ontem. Fortaleza segue com o maior número de casos no Estado, concentrando 38.754 confirmações da doença e 3.553 óbitos. (Colaborou Catalina Leite/Especial para O POVO)
Sistema imunológico: por que a imunidade não é garantida
Qual é a resposta imunológica do organismo ao novo coronavírus? É uma proteção completa ou parcial, definitiva ou temporária? Ainda não sabemos o grau de proteção para a enfermidade. Algumas doenças podem acometer os indivíduos várias vezes ao longo da via. Conforme Luciana Costa, virologista do Instituto de Microbiologia e do Laboratório de Genética e Imunologia das Infecções Virais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), outros coronavírus endêmicos já conhecidos apresentam imunidade transitória.
"O que faz com que uma pessoa tenha vários episódios de infecção ao longo da vida", afirma. Pesquisa feita pela King's College, em Londres, na Inglaterra, apontou que o novo coronavírus pode ser detectado novamente, assim como uma gripe.
"Não estamos utilizando os melhores testes (de sorologia). Algumas marcas não funcionam bem. Estudos estão sendo feitos com diversos tipos de teste. Precisa ser feito com testes sensíveis o suficiente e em número maior. E a gente não sabe qual é valor de imunidade que vai fazer com que naturalmente o vírus pare de circular", explica.
Outra questão é que nem todos que entram em contato desenvolvem anticorpos. Keny Colares, infectologista do Hospital São José, e integrante do Comitê Estadual de Enfrentamento à Covid-19, detalha que os anticorpos são apenas uma parte do sistema imunológico. "Tem sido observado que muitas pessoas têm a infecção e não desenvolvem os anticorpos ou desenvolvem e desaparecem", diz.
A resposta do sistema imunológico pode ser humoral, realizada pelos linfócitos B, que detectam o patógeno e produzem o anticorpo, que fica livre na circulação. A resposta também pode ser celular, pelos linfócitos T, que reconhecem uma célula infectada e libera substâncias para eliminá-la, além de também participar da ativação do linfócito B. Medir a exposição de uma população a um patógeno é mais fácil pela análise dos anticorpos, visto que identificar resposta celular demanda metodologia mais complexa e cara, difícil de ser aplicada em larga escala. (Ana Rute Ramires)
Título
Texto coluna fina