O POVO - Por que uma das principais frentes de pesquisa tem sido testar medicamentos para outras doenças quanto a sua eficácia contra o Sars-CoV-2?
Lúcio Freitas - Essa estratégia, o reposicionamento de fármacos, não é simples, mas encurta o tempo para chegarmos a uma resposta e reduz custos. Para desenvolver um medicamento do zero leva-se, geralmente, 12 anos e cerca de um bilhão de dólares. Com esses estudos, o tempo vai para 2 ou 3 anos e com meio milhão de dólares.
OP - Com os estudos desenvolvidos pela sua equipe, o quanto podemos dizer que estamos avançando?
Lúcio - Os testes em laboratório são a primeira fase de um longo processo. Colocamos milhares de células em placas, infectamos com o vírus e vamos adicionando doses progressivas dos fármacos. Depois disso, as substâncias que apresentam eficácia e segurança vão para testes pré-clínicos em animais, testes clínicos em um número restrito de pacientes e então testes com um maior número de pessoas. Existem progressos sim, mas é preciso segurar a agitação por uma resposta simples. A população precisa ter paciência e seguir as medidas que comprovadamente têm surtido efeitos positivos.
OP - Especificamente em relação à ivermectina, o que o laboratório está percebendo?
Lúcio - Nosso trabalho tem sido buscar uma substância que seja eficaz contra o vírus e que preserve a célula. De outro modo, o fármaco acaba sendo eficaz no laboratório porque, ao destruir a célula, o vírus desaparece sem ter de onde tirar sua sobrevivência. A ivermectina tem se mostrado prejudicial às células. Ela foi e é eficaz contra outras doenças, mas pela sua toxicidade ela não seria aprovada pelos padrões atuais de segurança em remédios. Contra o coronavírus ela é inócua.
Lúcio Freitas é coordenador da Plataforma de Triagem Fenotípica, laboratório do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP. Há 15 anos estuda estratégias de reposicionamento de fármacos.