Um estudo da Confederação Nacional do Transporte (CNT) divulgado nesta quarta-feira, 24, mostrou que os avanços na sinalização nas rodovias federais do Brasil ocorridos entre 2013 e 2019 esbarram na falta de investimento e em problemas de fiscalização e execução. No Programa Nacional de Segurança e Sinalização Rodoviária (BR-Legal), os montantes executados representaram 63% do previsto.
O BR-Legal foi criado em 2013 para padronizar a sinalização rodoviária na malha federal sob jurisdição do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit ). Em sete anos, houve uma melhora de 17,8 pontos percentuais, em média, nos trechos rodoviários onde houve intervenções da iniciativa.
O projeto estava dividido em quatro etapas e previa melhorias na sinalização em 55 mil quilômetros de rodovias em todo o País. Essa extensão representava, em 2012, 87% da malha total das rodovias federais pavimentadas sob gestão pública. Cada etapa levava em consideração a logística de execução das obras e o nível de relevância de cada trecho.
Segundo os resultados da última Pesquisa CNT de Rodovias, a avaliação positiva dessas rodovias passou de 39,7% para 57,5%. Contudo, o levantamento ressalta que “há ainda trechos de rodovias em condições inadequadas de sinalização e que oferecem riscos aos usuários.”
"O programa também inovou na forma de licitar, na atribuição de responsabilidades às contratadas e na metodologia das soluções a serem empregadas", diz o estudo.
Na avaliação do professor Heber Oliveira, do Departamento de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Ceará (UFC), o BR-Legal foi uma boa iniciativa do Dnit no intuito de proporcionar maior segurança e conforto ao usuário do trânsito, além de melhorar a circulação viária.
Todavia, o especialista acrescenta que é necessário atentar para outros fatores que constituem a segurança viária. “De nada vai adiantar ter um programa que cuida muito bem da sinalização se você não cuida da conservação necessária para o pavimento. Não adianta ter placa, se tenho buracos na pista, defeitos. É um conjunto de tudo”, comenta.
De acordo com o estudo da CNT, nos três primeiros anos do BR-Legal (2015-2017), a União gastou R$ 1,49 bilhão com o programa, valor que supera o R$ 1,47 bilhão dispendido com os programas que o antecederam (Prosinal e Prodefensas), em seus oito anos de duração.
No entanto, a parcela de gastos com o programa apresentou significativa redução ao longo do tempo. Em 2015, o BR-Legal chegou a representar 17% dos investimentos da União com manutenção de trechos. O percentual caiu para 9,9% em 2016, voltou a subir com 13,1% em 2017, 14,9% em 2018 e recuou novamente a 7,6% em 2019.
Além disso, atrasos na execução do programa empurraram o encerramento da maioria dos contratos para 2021 (a previsão inicial era 2018). Ainda segundo a CNT, dos R$ 4,47 bilhões de orçamento previstos, foram investidos, entre 2014 e 2019, apenas R$ 2,82 bilhões em valores nominais – equivalentes a R$ 3,12 bilhões em valores corrigidos –, o que representa 63% do previsto.
A pesquisa da CNT também compila achados de auditorias ao programa BR-Legal realizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela Controladoria-Geral da União (CGU). Documentos apontam problemas de fiscalização, superposição do programa com outras ações, execução insuficiente ou inadequada, atrasos, priorização de trechos críticos e inconformidade de projetos.
Em alguns casos, por exemplo, os relatórios desses órgãos indicam que “não foram contratadas empresas para realizar serviços de supervisão e gerenciamento do programa e que houve carência de pessoal e de equipamentos para realizar os serviços de fiscalização.”
Além do mais, em alguns trechos rodoviários do BR-Legal em superposição com outras ações e programas de melhoria houve casos de duplicidade na contratação de serviços e ainda de ausência ou insuficiência de execução da sinalização horizontal devido à má condição do pavimento (sob responsabilidade de outro programa).
Foram verificados ainda “atrasos na elaboração e na entrega dos projetos básicos e executivos, com o consequente retardamento no início dos serviços de sinalização”. Por fim, o relatório indica que não houve priorização cronológica na execução de trechos concentradores de acidentes e demais pontos críticos.
O professor Heber Oliveira analisa que um planejamento bem feito poderia ter evitado boa parte das falhas mencionadas pelo programa. “É algo que deveria ser avaliado com o tempo, depende do órgão gerenciando isso, da empresa que vai fazer a verificação. Essa tarefa é complexa, mas se sei que vou fazer um serviço em determinado ponto, então tento prever condições para isso”, esclarece.
O POVO entrou em contato com o Dnit para saber sobre o posicionamento da pasta em relação os problemas no BR-Legal apontados pela pesquisa. Até o momento do fechamento da matéria, o órgão ainda não havia respondido.
As intervenções realizadas pelo BR-Legal tiveram percentuais de execução distintos, tendo a sinalização vertical alcançado o maior percentual (70%). A seguir, estão as intervenções de sinalização horizontal (com 58,1% de execução) e de dispositivos de segurança (45%).
A sinalização vertical engloba sinais colocados nas laterais ou acima das vias por meio de placas que transmitem uma mensagem aos usuários, enquanto a horizontal utiliza para o mesmo propósito linhas, marcações, símbolos e legendas, pintados ou apostos sobre o pavimento das vias.
“Foram registrados, ainda, atrasos no início da execução das intervenções do programa, com destaque para a sinalização vertical e os dispositivos de segurança – sendo assinalável, para este, a não execução em alguns lotes –, com prejuízos tanto à qualidade da sinalização quanto à segurança viária”, completa o relatório da CNT.
Para o professor Heber Oliveira, as falhas constatadas na primeira edição do programa podem ser utilizadas como base a o planejamento do Novo Programa Nacional de Segurança e Sinalização Rodoviária (o BR-Legal 2), proposto pelo Dnit em 2018.
"O que não foi feito no primeiro que pode ser melhorado no segundo e o que foi bem feito poderia ser incorporado. Esses programas geralmente ficam nesse aprendizado constante. Espero que o segundo aprenda com aquilo que o primeiro mostrou", afirma.
Aproximadamente 90 lotes serão licitados no novo projeto, com investimento estimado de R$ 3 bilhões e prazo de execução até 2023. O cronograma de licitação prevê uma implantação progressiva da sinalização em três etapas, totalizando cerca de 51 mil km de rodovias. O BR-Legal 2 está em fase de planejamento e há previsão para ocorrer em breve, o início da sua fase de licitação.