Na última segunda-feira, no primeiro dia útil de 2021, a adolescente de 13 anos Keron Ravache foi espancada até a morte em Camocim. Um início de ano que dá continuidade à realidade já vista em 2020, quando houve pelo menos 19 assassinatos de trans e travestis no Ceará, maior média desde 2017, ano do assassinato de Dandara Kettley.
Os números são do Centro de Referência LGBT Janaína Dutra e representam aumento de 57% no ano de 2020, em relação a 2019, quando foram contabilizados 11 crimes contra a vida de pessoas trans. Mais da metade dos 19 casos registrados — 10 — ocorreram em Fortaleza.
Keron foi a primeira vítima de transfeminicídio do ano, mas em Camocim foi o segundo caso em 10 meses. Em junho do ano passado, Luanny Kelly foi brutalmente assassinada pelo seu marido e seu corpo foi encontrado ao lado do prédio da Receita Federal em Camocim, há 354 km da capital. Segundo relatório da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (Antra), 64% das vítimas no ano de 2019 foram assassinadas na rua. O que tem demonstrado que as vias públicas não são espaços seguros para corpos trans.
Segundo informações do Centro de Referência LGBT Janaína Dutra, os dados ainda podem esconder casos subnotificados, visto que o Centro não tem acesso aos inquéritos dos crimes que ocorrem no Interior do Estado. Segundo informações repassadas, o Centro realiza esse levantamento de forma independente, pois isso não é atribuição do Município, mas sim, do Estado, por meio através da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). A SSPDS foi contatada, mas não houve resposta até a publicação desta matéria.
Yara Canta, membro da Associação de travestis do Ceará (Atrac), conta que, em agosto de 2020, foi criado grupo de trabalho para debater políticas públicas e segurança para pessoas LGBTQIA+ na capital. "Foi criado esse GT com representantes da Secretaria da Segurança Pública do Estado, as lideranças da Atrac e outras lideranças LGBT do Estado também participaram." Segundo Yara, depois dessa reunião, não houve mais nenhuma ação de continuidade. "É difícil, porque, às vezes, parece que não existe um interesse das instituições. Infelizmente, a gente tenta articular aqui e ali, marcou uma reunião, mas ficamos dependemos de burocracias e da boa vontade das pessoas. Estamos morrendo enquanto aguardamos esse GT", desabafa.