Dois mil e quarenta e nove dias depois, o primeiro passo para que Justiça seja feita no caso da Chacina da Grande Messejana segue sem uma data definida. O grande número de recursos não permitiu que fosse feito o julgamento em primeira instância do crime. Até o Superior Tribunal de Justiça (STJ) foi acionado para reformar as decisões tomadas pelo Judiciário cearense. Na madrugada de 12 de novembro de 2015, 11 pessoas foram mortas e outras sete ficaram feridas na retaliação à morte de um policial militar em latrocínio um dia antes. Nenhuma das vítimas tinha ligação com o crime, porém.
Por meio de nota, o TJCE ressaltou a "alta complexidade" do caso devido à grande quantidade de réus. Conforme o Judiciário cearense, os réus e a acusação entraram com diversos recursos, inclusive, em instâncias superiores como o STJ. "O ingresso desses recursos, que são respaldados por lei, inevitavelmente, acabam fazendo com que o tempo de tramitação do processo seja mais extenso, já que são recursos cabíveis e que devem ser apreciados pelas instâncias superiores da Justiça", diz a nota. "Após a apreciação de todos os recursos e observadas as possíveis decisões oriundas deles, o Colegiado de magistrados que atua no processo deverá marcar as datas de julgamento para os que tiverem a decisão de pronúncia mantida".
Inicialmente, o MPCE havia denunciado 45 PMs pelo crime. A Justiça aceitou a acusação contra 44. Nas sentenças de pronúncia, proferidas ainda em 2017, foi entendido haver provas suficientes para levar 34 dos réus a Júri Popular. Desde então, os acusados recorrem, em liberdade, contra a decisão. Data de outubro de 2019 a última grande decisão do processo. A 3ª Câmara Criminal do TJCE manteve a sentença de primeiro grau que determinava que os 34 réus fossem julgados pelo Tribunal do Júri.
O TJCE ainda destacou ter se empenhado para aumentar a celeridade processual e que, no caso da chacina, ações como o desmembramento do processo foram tomadas. Entre as alegações das defesas contra a decisão de pronúncia estão: ausência de fundamentação para manter as qualificadoras, incompetência do juízo que está com o caso, ausência de indícios de autoria e imprestabilidade do depoimento de testemunha de "ouvir dizer".
O promotor da 1ª Vara do Júri, Marcus Renan Palácio, explica que os réus interpuseram agravo contra o acórdão feito pelo TJCE e, após a negação, eles recorreram ao STJ. A admissibilidade do recurso ainda é analisada pela presidência do TJCE. Por isso, não é possível determinar uma data para o julgamento do caso, diz o promotor. "Pelo Ministério Público, se não fossem esses recursos, que são previstos em Lei — são direitos dos acusados, o contraditório e a ampla defesa —, se fosse da minha vontade pessoal, esses acusados já teriam sido submetidos a Júri. Agora, considerando a complexidade do processo, a multiplicidade de acusados, eu não posso [...] estimar um prazo, porque eu não sei como vai ser a celeridade (do julgamento dos recursos)".
Edna Carla Souza, mãe de Álef de Souza Cavalcante, 17, uma das vítimas da chacina, diz que as mães dos mortos na chacina se sentem impotentes diante da espera. Além da condenação dos acusados, ela exige um pedido oficial de desculpas do Governo do Estado e da Polícia Militar. Ela lembra que o filho estaria completando 23 anos neste ano, mas não resta mais nada a celebrar — assim como outras datas comemorativas perderam o sentido. "Depois que nós perdemos nosso filhos, nós nunca mais voltamos ao normal. Não tem mais: 'ah, eu estou feliz'. Não tem mais felicidade. Se você fica feliz pelo momento, a felicidade é momentânea. E, mesmo momentânea, ainda não é uma felicidade completa, porque você não tem o seu filho".