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4.683 trabalhadores da linha de frente morreram de Covid-19 no Brasil em dois anos
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4.683 trabalhadores da linha de frente morreram de Covid-19 no Brasil em dois anos

Levantamento inédito analisa dados federais registrados entre janeiro de 2020 e dezembro de 2021. Impacto maior foi entre mulheres e auxiliares de enfermagem
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COVID-19 trouxe impacto para os profissionais de saúde (Foto: Aurelio Alves/ O POVO)
Foto: Aurelio Alves/ O POVO COVID-19 trouxe impacto para os profissionais de saúde

Um total de 4.683 trabalhadores da linha de frente morreu em decorrência da Covid-19 no Brasil em dois anos de combate à pandemia. Foram cerca de seis mortes de profissionais da saúde por dia ou uma morte a cada quase quatro horas. Aproximadamente 80% dos profissionais mortos eram mulheres e 70% trabalhavam como técnicos e auxiliares de enfermagem.

Os dados revelam que as primeiras mortes causadas pelo coronavírus Sars-Cov-2 aconteceram em janeiro de 2020. Nos meses seguintes, enquanto os óbitos por outras causas se mantiveram em torno da média registrada em 2018 e 2019, os profissionais da saúde foram cada vez mais vitimados pela Covid-19.

Em maio, a doença chegou a constar como causa básica de 38,5% dos óbitos desse grupo profissional. Em 2021, os casos fatais da Covid-19 na linha de frente da saúde chegaram ao seu pico: as mortes registradas apenas entre março e junho superaram o total do ano anterior. Em março e abril, mais profissionais da saúde morreram pelo coronavírus do que por outras causas.


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O levantamento divulgado nessa quinta-feira, 13, foi encomendado pela federação sindical Internacional de Serviços Públicos (PSI, Public Services International, da sigla em inglês) e realizado pelo estúdio de inteligência de dados Lagom Data. 

“A importância de fazermos este levantamento vai desde o reconhecimento destes trabalhadores que deram sua vida para salvarem outros à luta para que o piso salarial de enfermagem seja de fato uma realidade”, afirma Marcelo Netto, chefe de comunicações da ISP mundial, em Genebra. 

Mulheres e auxiliares de enfermagem somam maior número

Quase oito em cada dez profissionais da saúde que morreram pela Covid-19 eram mulheres. Entre os atestados de óbito com sexo informado, 78% eram do sexo feminino (3.554 mortes) e 22% do sexo masculino (999 óbitos).

“Eram essas profissionais que estavam sempre lá, ao lado de quem sofria com a doença, da triagem de todos até a morte de alguns”, comenta Netto. “Podemos ainda destacar que quase a metade, 47%, eram mulheres pretas e pardas, que normalmente estão mais presentes nas atividades menos remuneradas.”

Ainda segundo a pesquisa, o impacto da doença foi maior nas ocupações com menores salários e mais próximas à linha de frente: 70% dos mortos trabalhavam como técnicos e auxiliares de enfermagem; em seguida vieram os enfermeiros (25%) e por último os médicos (5%).

Tanto nos dados oficiais de emprego formal quanto nos registros dos conselhos profissionais, médicos representavam 61% dos profissionais empregados no período. Enfermeiros eram 20% e técnicos de enfermagem, 18%.

A análise foi feita a partir do cruzamento de microdados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados e Registros de profissionais do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Os dados ainda são preliminares, pois as informações do SIM do final de 2021 ainda estão em investigação.

 

Movimentação de ambulâncias no Hospital Leonardo da Vinci
Movimentação de ambulâncias no Hospital Leonardo da Vinci

No Ceará, 89 profissionais da Enfermagem morreram durante a pandemia

No Ceará, 89 profissionais da Enfermagem, entre auxiliares, técnicos e enfermeiros, morreram em decorrência da Covid-19. O dado consta em levantamento realizado pelo Conselho Regional de Enfermagem do Ceará (Coren-CE) e contabiliza os óbitos registrados desde janeiro de 2020 até outubro de 2022.

O técnico de enfermagem Messias Carlos de Souza relata que a pandemia "causou bastante ansiedade, tristeza e apreensão entre os profissionais''. "Quando a regulação do Samu ligava para passar uma ocorrência, nós atendíamos o celular já pedindo a Deus que não fosse Covid-19", conta o técnico, que atende no serviço médico de urgência.

"Em algumas unidades de saúde houve muito sofrimento. Perdi vários amigos e causava uma tristeza enorme, porém, levantava a cabeça e a coragem de lutar contra essa pandemia aumentava", completa o profissional.

Para Ana Paula Brandão, presidente do Coren-CE, dois momentos foram os mais difíceis: os primeiros meses de 2020, quando havia poucas informações sobre o vírus e a doença; e o pico da segunda onda de casos e óbitos, quando mais pessoas foram afetadas gravemente pela Covid-19. "Nesse momento, apesar de os profissionais da saúde terem sido prioritários na vacinação, houve um atraso nas vacinas que prejudicou muito."

"Uma das questões que mais fez os profissionais irem a óbito foi a ausência e os modelos inadequados de equipamentos de proteção individual", avalia. "A nossa categoria é a maior da área da saúde e os nossos dados mostram que aqueles que mais morreram foram os auxiliares e técnicos de Enfermagem", detalha.

O perfil de profissionais vitimados pelo coronavírus no Ceará aponta ainda uma predominância de óbitos entre mulheres. "A nossa profissão é majoritariamente executada por mulheres", explica Ana Paula.

A presidente do Coren-CE entende que o número de óbitos é "gritante" e "ainda não é totalmente fidedigno". "Temos muitas relações fragilizadas de trabalho, em que o vínculo não é um vínculo empregatício formal; é só prestação de serviço. Então os números podem estar subnotificados", aponta.

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