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Patrões recebiam aposentadoria de idosa resgatada  de trabalho análogo à escravidão, diz Sedih-Ce
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Patrões recebiam aposentadoria de idosa resgatada  de trabalho análogo à escravidão, diz Sedih-Ce

Idosa de 78 anos foi resgatada após 40 anos de serviços domésticos sem remuneração. Ela não tinha folga, férias e não recebia salário. Agora, mulher está em um abrigo
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Idosa de 78 anos trabalhava como doméstica em situação análoga à escravidão. É o primeiro resgate em ambiente doméstico no Ceará (Foto: Divulgação MTE)
Foto: Divulgação MTE Idosa de 78 anos trabalhava como doméstica em situação análoga à escravidão. É o primeiro resgate em ambiente doméstico no Ceará

Embora os patrões digam que é considerada uma "pessoa da família", uma idosa passou 40 dos seus 78 anos de idade trabalhando como empregada doméstica sem receber remuneração, sem ter férias ou folga. Ela foi resgatada das condições de trabalho análogo à escravidão esta semana em Fortaleza. Conforme representante da Secretaria dos Direitos Humanos do Ceará, a idosa tinha uma aposentadoria rural — por ter trabalhado na agricultura anteriormente — que era recebida pelos patrões. 

Ação foi realizada por auditores Fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com participação do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Polícia Federal (PF) e da Secretaria dos Direitos Humanos (Sedih-CE). A denúncia anônima foi feita via Disque Direitos Humanos - Disque 100.  

Normalmente, a atuação da Sedih se dá pós-resgate, contudo, casos de trabalho de análogo à escravidão no âmbito domiciliar têm um aspecto diferente: a relação de proximidade e vínculo afetivo — embora construído com base em uma relação desigual — entre a vítima e os patrões.

"Pela dinâmica do resgate, foi necessário chamar a equipe psicossocial, porque ela não se sentia nessa situação de escravidão, ela se sentia da família. Diante disso, a gente foi acionado", explica Jalmi Teles, articulador do eixo de combate ao trabalho escravo da Secretaria. 

Ele conta que, inicialmente, ela não queria sair da casa dos patrões. Após o trabalho dos profissionais de assistência social e psicologia, ela saiu da residência para ir para um abrigo. "Não tem como você desconsiderar um vínculo afetivo existente, né? Ela anulou a vida dela pra vivenciar todas as fases da vida nessa família. Inclusive, na criação dos filhos daquela família. Ela abdicou de construir a família dela, de ter a vida dela", afirma. 

Conforme o MTE, "a vulnerabilidade das trabalhadoras está presente em vários níveis: geralmente são mulheres, com baixa escolaridade ou analfabetas, várias delas idosas", perfil que se encaixa no caso em questão. Ela era a única da casa que não tinha plano de saúde. "Ela é franzina, você vê que não tem condições de cuidar de uma casa sozinha. Dá para ver que ela tem problemas na coluna, a dentição precisando de tratamento", explica. 

Um dos fatores que chamaram a atenção é que a aposentadoria dela não ia para ela, mas para os patrões. "Ela trabalhou na agricultura antes de vir. Não recebia salário e a aposentadoria ia para eles. Ai isso configurou mesmo", destacou.  

Carlos Pimentel, superintendente Regional do Trabalho no Ceará e auditor fiscal do trabalho, diz que esse é o primeiro caso de resgate análogo à escravidão doméstico no Estado. Ele frisa que para que um caso seja considerado trabalho análogo à escravidão não é necessário que haja cerceamento da liberdade. Ela dormia em um "quartinho", em uma dependência separada, onde ficava uma máquina de lavar e "guardava as coisas em uma caixa de sapatos", comentou o superintendente.

Os patrões eram um casal de idosos com filhos já adultos. Os órgãos evitaram passar mais detalhes sobre os envolvidos no caso para evitar identificação e revitimização da idosa. Segundo Jalmi, a equipe da secretaria está fazendo um levantamento para buscar familiares da vítima. 

Conforme o articulador da secretaria, a pasta analisa as possibilidades de moradia permanente após o resgate. "É necessário um tempo de escuta psicológica e de análise da equipe multidisciplinar. Precisa de uma adaptação e avaliar os vínculos entre a idosa e familiares que porventura existam para ver se existe um vínculo suficiente. A gente precisa dialogar e verificar as possibilidades para o bem estar dela", diz.

A idosa foi visitada pela equipe da secretaria dias após ir para o abrigo. "Apesar de dizer sentir saudade, ela estava com um aspecto bom. Ela passou a compreender que precisava se cuidar", compartilha. "A gente ficou feliz porque sentiu que ela conseguiu fazer novos vínculos lá dentro, conversar com outras pessoa. Ela tava sorrindo, elogiou a comida, as pessoas". 

Mais três casos estão sendo investigados em Fortaleza

Mais três casos de trabalho análogo à escravidão estão sendo investigados em Fortaleza. Nesta semana, além do caso citado, outra suspeita foi checada. No segundo caso, contudo, não havia indícios que comprovassem a situação. 

"Antes de deflagrarmos a operação, a gente faz um trabalho de investigação longo, amiúde, com muito cuidado. Esse durou uns dois meses. Houve o depoimento das partes. Depois de apurado, detectamos que havia realmente indícios", explica o superintendente Regional do Trabalho no Ceará, Carlos Pimentel, que também é auditor do Trabalho.

Ele explica que muitas vezes a operação de fiscalização é realizada, mas o crime não é detectado. "Quando há indícios, fazemos a visita in loco", frisa. O auditor afirma que o trabalho da Superintendência termina com o resgate da vítima e que as multas de contrato de trabalho estarão em ações judiciais feitas pelo Ministério Público do Trabalho. "E nesses cálculos têm vários fatores que influenciam", destacou.

Carlos detalha ainda que, após os autos de infração, os patrões têm 10 dias para apresentar uma defesa. Só depois disso é que a análise é feita e há aplicabilidade da pena pecuniária. O superintendente reforça que, quando se trata do trabalho análogo à escravidão doméstico, muitas pessoas sequer se dão conta da situação pela qual passam.

"Com as informações chegando, as ações realizadas, uma ou outra pessoa identifica isso (situações suspeitas). É muito difícil o resgate e a fiscalização do trabalho doméstico", destaca. (Sara Oliveira)

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