Após a conclusão da primeira etapa do julgamento da Chacina do Curió, o governador Elmano de Freitas (PT) anunciou nessa segunda-feira, 26, que a Procuradoria-Geral do Ceará deve procurar os familiares das 11 vítimas assassinadas no massacre, ocorrido em novembro de 2015, para propor um acordo de indenização coletiva. O Estado é alvo de ações reparatórias movidas na Justiça pela Defensoria Pública do Ceará entre 2017 e 2019.
Elmano destacou que o ressarcimento financeiro às famílias é um dever do Estado diante da condenação dos quatro policiais militares pelo Tribunal do Júri. Cada um dos réus foi sentenciado a 275 anos e 11 meses de prisão em regime fechado por participação nos 11 homicídios, além de três tentativas de homicídio e quatro crimes de tortura.
O somatório das penas individuais passa de 1.100 anos, a maior punição já aplicada a militares do Ceará na esfera criminal. Também foi decretada a perda dos cargos para os quatro PMs, após o trânsito em julgado da sentença.
"Com a condenação ocorrida, o Estado deve buscar essas famílias para tentar um acordo na indenização. Evidentemente que nada vai superar o sofrimento dessas famílias, mas nós temos o dever de cumprir a decisão e buscar um acordo na seara judicial", disse o governador durante coletiva de imprensa no Porto do Pecém. Sobre o resultado da sentença, Elmano declarou: "Eu tenho o maior respeito à decisão do Tribunal do Júri, do nosso Poder Judiciário, e vamos efetivamente cumprir a decisão”.
A defensora pública geral do Ceará, Elizabeth Chagas, disse ao O POVO que o gesto do governador "é um passo inicial para a resposta que o Estado está devendo há anos para os familiares das vítimas". Ela frisou que as ações reparatórias pleiteadas pelo órgão em nome das famílias não envolvem apenas o aspecto financeiro. "Essas pessoas precisam de uma reparação ampla, desde acompanhamento psicológico a apoio social. A questão vai muito além do dinheiro", destacou.
Nas petições judiciais, a Defensoria requisita que o Estado seja condenado a pagar indenização de R$ 500 mil e pensão mensal no valor de um salário mínimo a cada uma das 11 famílias que tiveram entes assassinados, até que a vítima complete 75 anos de idade. "Foi muito difícil chegar a esses valores, porque nada paga pelas vidas que se foram", afirmou a chefe da Defensoria. Além da indenização pecuniária, o órgão também quer que o Governo do Estado financie a construção de um memorial em homenagem às vítimas.
O Tribunal do Júri que terminou com a condenação dos quatro PMs foi o mais longo já realizado pelo Poder Judiciário do Ceará, com mais de 60 horas de duração. Os sete jurados, cinco homens e duas mulheres, passaram quase 13 horas votando os cerca de 300 questionamentos sobre a conduta dos réus. O resultado do julgamento foi classificado pelo procurador-geral do Estado, Manuel Pinheiro, como "uma resposta civilizada à barbárie".
"Esse resultado passa uma mensagem importante: de que o sistema de Justiça é capaz de punir com efetividade os agentes públicos que se envolvem em crimes dessa natureza", disse o chefe do Ministério Público do Ceará (MPCE) em vídeo divulgado nesta segunda-feira nas redes sociais.
O julgamento foi acompanhado por um grupo de trabalho formado por oito promotores de Justiça. De acordo com Pinheiro, o colegiado irá se reunir ainda esta semana para avaliar detalhes da sentença e planejar as próximas etapas do processo.
A defesa dos PMs informou que vai recorrer da decisão. O julgamento da Chacina do Curió terá mais duas etapas no segundo semestre deste ano. Mais oito réus devem ir a júri popular no dia 29 de agosto e outros oito, em 12 de setembro. Há, ainda, outros 14 acusados aguardando apreciação de recursos em tribunais superiores. Todos são policiais militares.