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Etarismo: mais um preconceito a ser vencido
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Etarismo: mais um preconceito a ser vencido

Nos próximos anos, os idosos representarão a maior parte da população. Contudo, ainda é comum serem discriminados em diversas áreas, como no ambiente de trabalho e na busca por saúde de qualidade
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Em muitos países ao redor do mundo, a população está envelhecendo a passos largos. Em 2023, conforme projeções da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil, em específico, passou a ter 33 milhões de idosos, representando 15% da população. Estima-se que, até 2030, a população idosa vai superar a de jovens. Esse fenômeno demográfico, contudo, acompanha um preconceito que muitas vezes passa despercebido: a discriminação com base na idade.

Conhecido como "etarismo", “ageismo”, “idadismo” e até “velhofobia”, essa forma de discriminação etária pode se manifestar de diversas maneiras. De acordo com o pós-doutor em Psiquiatria Geriátrica Gilberto Sousa Alves, esse preconceito se fundamenta em noções do que seria o papel do idoso na sociedade.

“Essa concepção geralmente segue noções culturalmente distorcidas. Em geral, se atrela a uma ideia de envelhecimento associada a menos valia, ou seja, a perda de capacidade. Além de associarem a uma dependência, uma perda da capacidade de contribuição social”, explica o professor colaborador da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Formas de etarismo:

  • Desconsiderar a opinião e decisões de uma pessoa por causa da idade;
  • Considerar que uma pessoa é incapaz de fazer algo pela sua idade;
  • Julgar uma pessoa idosa por não ter conhecimentos de tecnologia;
  • Demitir uma pessoa por considerá-la “velha demais” para uma função;
  • Falta de políticas públicas em benefício de pessoas de determinada idade;
  • Na área da saúde, não analisar a individualidade de um paciente, baseando-se unicamente na idade.

Fonte: Paulo Carvalho (doutor em Ciências Jurídico-Políticas) e Gilberto Sousa Alves (Psiquiatra Geriátrica).

Quem são os idosos?

A Organização Mundial da Saúde (OMS) divide os idosos em três categorias:

Pré-idosos (entre 55 e 64 anos);

Idosos jovens (entre 65 e 79 anos);

Idosos em idade avançada (com 80 anos ou mais).

Nesse contexto, segundo a legislação brasileira, uma pessoa pode ser considerada idosa a partir dos 60 anos, independentemente de seu estado de saúde física, capacidade de interação social ou atividade intelectual.

O envelhecimento e o mercado de trabalho

Uma das questões mais alarmantes do etarismo é a relação entre o envelhecimento da população e o mercado de trabalho.

Números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que de 2012 para 2023, a participação de pessoas com 40 anos ou mais na força de trabalho do País passou de 38,6% para 45,1%. Em números absolutos, são quase 11,5 milhões a mais de trabalhadores nessa faixa etária. Já são mais de 7,6 milhões entre os trabalhadores com 60 anos ou mais.

Ao mesmo tempo, conforme explica Paulo Carvalho, doutor em Ciências Jurídico-Políticas da Universidade de Lisboa e professor da UFC, apesar da maior presença dessa população nos ambientes trabalhistas, esses idosos podem sofrer uma série de discriminações.

Paulo Carvalho ressalta que existem diversas legislações nacionais que asseguram direitos e podem ser acionadas em casos de discriminação por idade no ambiente de trabalho.

“O artigo 7° da Constituição Federal considera ilegal a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão e demissão motivada exclusivamente pela idade. Dessa forma, esses idosos que se sentirem fragilizados podem recorrer ao (1) Sindicato da categoria do empregado; ao (2) Ministério do Trabalho e a (3) Auditoria Fiscal do Trabalho”, explica Paulo Carvalho.

PRECONCEITOS CONTRA IDOSOS NO MERCADO DE TRABALHO

- No período pré-contrato: com a preferência em selecionar candidatos mais jovens;

- Práticas discriminatórias no ambiente de trabalho: comentários ou insultos relacionados à idade;

- Falta de promoções e incentivos para funcionários mais velhos

- Demissão em razão da idade.

Fonte: Paulo Carvalho, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC)

Saúde

O etarismo também interfere em uma área delicada para muitas pessoas em uma idade avançada: o acesso a serviços de saúde. Segundo a Pesquisa Idosos no Brasil, realizada em 2020, 18% dos idosos afirmaram terem sido discriminados ou maltratados em um serviço de saúde.

Segundo o especialista em Psiquiatria Geriátrica Gilberto Sousa Alves, isso ocorre porque “a pessoa idosa pode ter dificuldade de expressar o que deseja numa consulta médica e pode ter suas opiniões depreciadas, além de ser vítima de abuso físico e verbal”, aponta.

Legislação brasileira de proteção à pessoa idosa

Estatuto da Pessoa Idosa - Instituído pela Lei nº 10.741, a legislação é destinada a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos. 

- Art. 9° - É obrigação do Estado garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade.

- Art. 10. - É obrigação do Estado e da sociedade assegurar à pessoa idosa a liberdade, o respeito e a dignidade, como pessoa humana e sujeito de direitos civis, políticos, individuais e sociais, garantidos na Constituição e nas leis.

- Art 27 - Na admissão do idoso em qualquer trabalho ou emprego, é vedada a discriminação e a fixação de limite máximo de idade.

Você sabia?

Em 14 de dezembro de 1990, a Assembleia Geral das Nações Unidas designou o dia 1º de outubro como o Dia Internacional das Pessoas Idosas. Em homenagem à data, o Estatuto brasileiro da Pessoa Idosa foi lançado no dia 1º de outubro de 2006. Neste dia também é comemorado o Dia Nacional do Idoso. 

Fique por dentro do tema

Filmes:
1. Eu, Daniel Blake, de Ken Loach 
2. Um senhor estagiário, de Nancy Meyers
3. O fim do Sem Fim, de Cao Guimarães e Lucas Bambozzi

Livros:
1. A arte de envelhecer - Schopenhauer
2. Etarismo, um novo nome para um velho preconceito - Fran Winandy
3. A máquina de fazer espanhóis - Valter Hugo Mãe

Músicas:
1. Velhos e Jovens - Adriana Calcanhotto
2. Envelhecer é uma arte - Adoniran Barbosa
3. Envelhecer - Arnaldo Antunes

Podcasts:
1. O etarismo em um país cada vez mais velho - Café da Manhã (Spotify)
2. Etarismo: Uma análise completa para vestibular - Podcast Atualizando (Spotify)
3. Etarismo, uma luta de todas nós - Prazer, Renata (Spotify)

Redação Enem: Chego Junto, Chego a 1.000

O tema desta inforreportagem foi escolhido por professores que compõem a banca do Concurso "Redação Enem: Chego Junto, Chego a 1.000", uma realização da Fundação Demócrito Rocha em parceria com a Secretaria da Educação do Ceará (Seduc-CE). A partir deste tema, estudantes da 3ª série do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) das escolas públicas estaduais são convidados a escrever uma redação no modelo dissertativo-argumentativo, o exigido no Enem. A publicação das cinco inforreportagens, referentes aos cinco temas do concurso, serão publicadas às quartas-feiras.

O próximo tema será "Os desafios para conter a demência digital no Brasil", lançado no próximo dia 20 de setembro. 

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