Entre 22 de novembro de 2023 e 31 de agosto deste ano, 228 imóveis foram identificados na Praia de Iracema, em Fortaleza, lançando seus efluentes em desacordo com a legislação, de acordo com a Prefeitura de Fortaleza. Foram encontrados, ainda segundo o Município, 167 casos de interferência da rede de drenagem e pontos de extravasamento de poços de visita sob a responsabilidade da Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece), que nega despejo irregular de esgoto. Tudo na região da Praia dos Crush, que em 2024 esteve imprópria em pelo menos 15 boletins de balneabilidade.
A presença de coliformes fecais no mar de Fortaleza não é recente e, semanalmente, é alvo de análise feita pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (Semace). As praias impróprias apresentam presença superior a 2.500 coliformes por 100 ml de amostra de água. Em 2023, a Praia dos Crush passou 78% do ano com contaminação fecal, situação evidente em vídeos que mostravam o despejo de dejetos no mar.
No último fim de semana, as imagens se repetiam: bolsões de esgoto próximos à água e pessoas, desavisadas, se divertindo. Como a turista Leila Alves, 49, que levou a filha pela primeira vez à Praia de Iracema. "Vim porque estou hospedada aqui perto, moro no Interior. Costumo sempre ir à Praia do Futuro", contou.
Para Leila, as praias deveriam ter aviso sobre a balneabilidade. "Muitas vezes a gente não sabe. E eu fico receosa porque tem vários lixos na praia: latinha, coco, plástico", descreveu. Para a Semace, além da quantidade de coliformes fecais, uma praia está imprópria para banho também quando "existirem ocorrências que possam ocasionar risco à saúde do banhista, tais como, presença de resíduos sólidos ou animais no entorno da área de banho".
Na Capital, o órgão responsável por localizar a origem dos lançamentos indevidos de esgoto é a Agência de Fiscalização de Fortaleza (Agefis), que afirma ter realizado 792 inspeções na região da Praia de Iracema e entorno neste ano. As autuações acontecem de acordo com o Código da Cidade e as multas variam entre R$ 90 e R$ 48.600.
A Prefeitura informou, através de nota, que atua em diferentes frentes em relação à balneabilidade da região. Readequação da rede de drenagem, obra de urbanização do Parque Riacho Maceió - com sistema de remoção de resíduos e limpeza periódica das bocas de lobo - com nova ação prevista para este mês. Município informa ainda que recolheu cerca de 590 toneladas das galerias pluviais, através do Projeto Vídeo Inspeção.
Questionada sobre os 167 autos de infração emitidos pela Agefis, a Cagece informou que a Ambiental Ceará realizou verificação dos pontos e não constatou despejo irregular de esgoto. Os casos de infração incluíam ainda o extravasamento de poços de visita - conhecidos como tampas de esgoto - e, de acordo com a Cagece, isso acontece "devido ao mau uso da rede de esgotamento sanitário pela população, que descarta itens como óleos, gorduras e resíduos sólidos, obstruindo a tubulação".
A Companhia reconhece que os extravasamentos prejudicam o funcionamento do sistema, mas garante que não afetam as redes de drenagem. De acordo com a nota, nos últimos três meses, foi realizada limpeza em 1.500 metros de rede de esgoto em Fortaleza. Levantamento recente da Companhia mostra que cerca de 300 imóveis na região da Praia de Iracema não estão conectados ao sistema de esgotamento sanitário. "Essa lista de imóveis já foi encaminhada aos órgãos responsáveis pela fiscalização que vai identificar como é feito o descarte do esgoto gerado nesses locais. A Ambiental Ceará reforça, ainda, que a operação e fiscalização das redes de drenagem são de responsabilidade da prefeitura de Fortaleza". (Colaborou Fabiana Melo)
Ministério Público definiu criação de plano de ação
Em maio deste ano, uma audiência pública no Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) reuniu representantes da Prefeitura de Fortaleza, do Governo do Ceará e da Cagece. O encontro foi parte do Inquérito Civil instaurado para averiguar as constantes denúncias de despejo irregular na Praia dos Crush.
Conforme informações do MPCE, a Agência de Regulação, Fiscalização e Controle dos Serviços Públicos de Saneamento Ambiental de Fortaleza (ACFor) destacou as ações dos órgãos da Prefeitura para tentar resolver
as irregularidades.
Representantes do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) defenderam a utilização de outras intervenções, além das iniciativas tecnológicas - como o projeto de vídeo inspeção -para combater a poluição.
Ficou definido que seria feito um plano de ação com as medidas que os órgãos responsáveis deveriam executar. O plano teria de conter prazos e etapas para implementação das medidas, além de detalhamento sobre como cada ação será efetivada.
O documento que estabelece as normas de gestão ambiental em Fortaleza é o Código da Cidade. Prevê, aos proprietários dos imóveis que não direcionam seus dejetos de forma correta, a possibilidade de multa, suspensão parcial ou total da atividade, reparação, reposição ou reconstituição e proibição de contratar com a Administração Pública Municipal, pelo período de até cinco anos.
2023
Após a repercussão de vídeos que mostravam despejo de esgoto na praia, Prefeitura de Fortaleza e Cagece trocaram acusações sobre responsabilidades