Um povo que cultua diversas formas de enxergar a morte, praticar o sagrado e se relacionar com a natureza. A diversidade cultural marca a identidade do Brasil, mas essa riqueza de costumes não é ampliada em razão de preconceitos fortalecidos por uma visão eurocêntrica que imperou no País.
Quem traz a reflexão é o historiador e cientista social Hilário Ferreira, que descreve a diversidade cultural como "diferentes manifestações de culturas que estão intimamente ligadas a diferentes grupos éticos". Nesse contexto, o profissional lembra que antes da chegada dos portugueses ao Brasil, em 1.500, a nação já era diversa, em razão dos diferentes povos originários que viviam na região.
Com a chegada dos europeus e africanos, as demonstrações culturais em território brasileiro se expandiram e resultaram em outras, por exemplo, o maracatu — manifestação folclórica com elementos africanos e indígenas. No entanto, segundo Hilário, a dominação imposta pelos portugueses trouxe uma visão eurocentrada, onde só a cultura europeia é que devia prevalecer.
"O europeu se constrói como o ser humano e esses povos (originários) são os 'outros', só que esses outros também são seres humanos e são produtores de cultura, sao produtores do sagrado", diz o historiador.
Principais causas que contribuíram para a diversidade cultural do Brasil:
A presença de povos originários, como os indígenas;
O processo de colonização brasileiro, influenciado por povos europeus como os portugueses;
A chegada de milhares de africanos ao território brasileiro;
A entrada de diversos imigrantes ao território brasileiro ao longo do tempo;
O fenômeno do êxodo rural, que contribui para a chegada massiva das populações rurais e suas tradições ao meio urbano brasileiro;
A presença de diversas ondas migratórias internas.
Fonte: Mundo Educação
Enfrentar preconceitos para enxergar o País
Segundo Hilário, no processo de colonialismo os europeus criaram um conceito único de belo e de relacionamento com o sagrado, negando a existência da diversidade que já havia no Brasil e, consequentemente, perpetuando preconceitos de todos os tipos, como o racial e o religioso.
Yasmim Rodrigues, professora de História, destaca que o Brasil "insiste em negar sua própria história, sob quais origens foi fundado e as consequências disso".
"Embora muitas pessoas se animem com o Carnaval, com um maracatu, uma roda de samba, de coco, as chamadas 'festas populares', por exemplo, existe um processo de negação da origem dessas manifestações culturais intentando apagar seus precursores, e está nesse ponto a perversidade do racismo, é fazer uso desses fazeres culturais, tornando invisíveis seus agentes", pontua.
Ela acredita que o enfrentamento ao racismo é "um ponto-chave para a democratização da cultura" no País, pois vai possibilitar a compreensão da diversidade cultural brasileira.
Importância do fomento à cultura no processo de reconhecimento
Yasmim Rodrigues reforça que o preconceito pode ser enfrentado por meio de políticas públicas culturais, desde que se considere a presença de fazeres africanos e indígenas na cultura brasileira. Ela aponta, por exemplo, que existe "um desrespeito" do Governo Federal com os mestres e mestras da cultura brasileira, em sua maioria negros e pobres, pois eles envelhecem sem segurança.
"O que a gente tem assistido é um processo cada vez maior de burocratização do acesso aos recursos de fomento à cultura nas agendas do Estado, o que cria, a meu ver, um abismo entre as pessoas que sustentam a cultura nesse país e as políticas públicas que eram para garantir a manutenção desses saberes e fazeres que nos caracterizam enquanto nação", destaca ainda.
"A concentração dos recursos culturais tem estado cada vez mais na mão de uma minoria que não representa o reflexo das nossas práticas culturais. Assim, eu penso que, enquanto não reconhecermos esses pontos que atravessam e compõem a cultura brasileira, não avançaremos no enfrentamento às mais variadas formas de preconceito", completa.
Leis sobre o preconceito
O artigo 208 do Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei 2.848/1940), estabelece que é crime "escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso".
Pena para ações como essas podem ser de detenção de um mês a um ano ou multa, podendo aumentar em caso de de violência. Já a Lei 7.716/1989, conhecida como Lei do Racismo, estabelece punição para "os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".
Sugestões de filmes sobre o tema
Menino 23: Infâncias Perdidas no Brasil, de Belisário Franca
Medida provisória, de Lázaro Ramos
Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade
Leituras recomendadas
O Povo Brasileiro: A Formação e o Sentido do Brasil, por Darcy Ribeiro
História Social da Intolerância Religiosa no Brasil: Desafios na Contemporaneidade, por Ivanir dos Santos
Como o racismo criou o Brasil, de Jessé Souza
Podcasts sobre o assunto
O assunto: Racismo no Brasil - e educação antirracista
Àkará, no fogo da intolerância (2020), por Claúdia Chávez
Café com Sociologia - episódio 10 - Diversidade Cultural
Redação Enem: chego junto, chego a 1.000
O tema desta inforreportagem foi o último escolhido por professores que compõem a banca do Concurso "Redação Enem: chego junto, chego a 1.000", uma ação da Secretaria da Educação do Ceará (Seduc-CE) para alunos da 3ª série do ensino médio e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) das escolas públicas estaduais. Os alunos são convidados a escrever uma redação no modelo dissertativo-argumentativo, o exigido no Enem.