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Desafios e avanços da IA no sistema de saúde brasileiro
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Desafios e avanços da IA no sistema de saúde brasileiro

Ferramentas digitais inteligentes têm sido desenvolvidas para atuar no sistema sanitário do País, mas o uso delas ainda enfrenta barreiras
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Excesso de conexão digital pode prejudicar saúde mental 
(Imagem: nensuria | Shutterstock) (Foto: )
Foto: Excesso de conexão digital pode prejudicar saúde mental (Imagem: nensuria | Shutterstock)

O Brasil ainda engatinha quando o assunto é a criação e o uso de ferramentas de Inteligência Artificial (IA) na Saúde. Iniciativas prometem revolucionar a medicina brasileira, promovendo da transcrição de consultas ao aumento da segurança do paciente, mas esbarram em desafios para avançarem. 

Conclusão sobre o País estar em estágio inicial no desenvolvimento de tecnologias que reproduzem capacidades humanas é do estudo Inteligência Artificial na saúde: diagnóstico qualitativo sobre o cenário brasileiro, lançado em setembro último pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br).

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Para a pesquisa, foram ouvidos gestores e especialistas do segmento, entre outros, e coletadas informações a respeito de iniciativas e práticas em áreas diversas da saúde no País. Como resultado, foi identificado ainda que o assunto tem sido debatido de forma intensa no Brasil, sob uma “ótica otimista”.

Um exemplo de debate do tipo ocorreu em setembro recente, durante a MV Experience Fórum 2024, o maior evento de inovação e tecnologia para a saúde do Brasil, realizado pela MV Saúde Digital. Palestras discutiram temas como processos digitais que já são usados no exterior, entre eles a Inteligência Artificial. 

Conforme Andre Médici, economista sanitário e um dos palestrantes do encontro, a digitalização no segmento sanitário pode ajudar a quebrar barreiras como a distância. Ele pontua, por exemplo, que a telemedicina ajuda no atendimento de populações rurais que não têm acesso ao serviço de saúde.

Economista sanitário participou do movimento de construção de SUS no Brasil
Economista sanitário participou do movimento de construção de SUS no Brasil Crédito: Divulgação MV

Profissional cita ainda como outros avanços digitais observados no exterior o prontuário eletrônico de pacientes, a intorepabilidade (capacidade da comunicação entre sistemas) das bases de dados e a IA. Procedimentos, conforme Médici, podem melhorar a atenção ao paciente e também baratear custos.

Ele destaca ainda que por meio da tecnologia o paciente pode ter um registro único, possibilitando que todo o seu histórico clínico seja registrado e acessado independente do hospital em que seja atendido. 

Leia também: “O SUS precisa melhorar a forma pela qual ele está sendo organizado”

“A pandemia trouxe problemas como o represamento enorme de procedimentos. (...) Essa é uma questão que se exige efetivamente uma maior capacidade dos serviços, de começar a produzir esses tipo de processo, e ai a intorepabilidade e toda parte do registro eletrônico de saúde é uma estratégia fundamental pra isso”, destaca Médici, citando o acúmulo de cirurgias como um desafio.

Para suprir necessidades como essa algumas empresas já operam no desenvolvimento de tecnologias avançadas. Entre elas está a MV Saúde Digital. Paulo Magnus, fundador da multinacional, frisa que um dos objetivos do uso de Inteligência Artificial na saúde é “devolver o tempo do médico ao paciente”. 

Para isso a empresa criou ações como algoritmos que analisam exames e a ferramenta “Transcreve”. “Ela (ferramenta) capta a conversa entre médicos e pacientes, estrutura dados e registra dentro do prontuário, sem o médico precisar transcrever, recuperando a metade do tempo do médico”, explica o empresário.

Magnus ainda cita que a integração de dados permite a prevenção de doenças, uma vez que melhora o acompanhamento do paciente, e serve também como um apoio ao profissional da saúde.

 

Brasil enfrenta barreiras para aplicar IA na saúde pública

A pesquisa TIC Saúde 2024, lançada em outubro deste ano, mostrou em números como o uso de ferramentas digitais no setor sanitário tem crescido no Brasil. Conduzido pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), o levantamento foi realizado a partir de entrevistas com 2.057 gestores de estabelecimentos de saúde e 2.021 profissionais do segmento.

Documento aponta que a utilização de sistemas eletrônicos alcançou 92% das instituições de saúde, mas que apenas cerca de 4% dos estabelecimentos sanitários utilizam Inteligência Artificial. 

Entre aquelas instituições que não adotaram a IA, as principais razões dadas foram: a falta de necessidade (59%), o fato da tecnologia do porte não ser uma prioridade (61%) e os custos serem muito altos (49%).

No que diz respeito aos médicos, a adesão à Inteligência Artificial Generativa (um tipo de IA que consegue criar novos conteúdos) foi de 17% no geral. No entanto, nos estabelecimentos públicos foi de 14% e nos privados de 20%, mostrando que há uma abrangência maior no setor particular. 

Além disso, apenas 23% dos médicos ligados as unidades haviam realizado algum tipo de capacitação e formação na área de informática em saúde “nos últimos 12 meses anteriores às entrevistas”.

Luiz Roberto, professor do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal do Ceará (UFC), aponta que o Brasil está entrando no terreno de possibilidades da Saúde Digital (que pode ser compreendida como o uso de tecnologias na área) mas frisa que a iniciativa teve atraso em relação a outros países.

“Há uma nítida sinalização de que realmente o Governo decidiu entrar nisso que chamamos de Saúde Digital, só que foi uma menção feita 30 anos depois do mundo”, diz o docente. 

Profissional também destaca que o setor privado pode ter mais adesão a esses tipos de tecnologias por ser menos “burocrático” do que o público e cita que o País precisa reconhecer a Saúde Digital como uma “tecnociência” para avançar nesse setor, possibilitando a educação no tema para os profissionais da área. 

Roberto, que é ainda coordenador do Núcleo de Tecnologias e Educação a Distância em Saúde (NUTEDS), cita como barreira para esse avanço a falta de infraestrutura no País para que capacitações em Saúde Digital aconteçam e defende a criação de disciplinas obrigatórias em universidades sobre o assunto. Ele também aponta a necessidade de realizar pesquisas na área, junto a órgãos internacionais.

 

Inteligência Artificial pode substituir profissionais?

Outro ponto apontado na TIC Saúde 2024 foi relacionado a segurança de dados. Conforme pesquisa, em apenas 47% das unidades analisadas os funcionários haviam sido treinados em segurança da informação.

No Brasil vigora a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que controla a privacidade e o uso de dados pessoais. Conforme o professor Luiz Roberto, em paralelo ao regulamento é importante realizar discussões sobre o tema, para garantir a segurança e o avanço da aplicação da IA na saúde do País. 

“Os dados são do paciente e na saúde muitos desses dados são sensíveis, e (a exposição deles) pode levar o paciente a ficar constrangido”, aponta o docente. 

Nesse cenário, Roberto volta a reforçar a necessidade de preparar profissionais para lidar com tecnologias inteligentes, mantendo o senso ético. Docente estipula ainda que pessoas ligadas as áreas da tecnologia são necessárias no avanço da Saúde Digital e pontua que inteligências artificiais não vão “roubar” empregos dos profissionais de saúde, mas que eles precisam se adaptar a elas, como aliados. 

“Não tem esse risco. As pessoas que não se adaptarem, não apreenderem, correm o risco de ficar de fora do mercado, pois em todas as áreas a IA tem trazido benefícios”, diz o docente. 

 

Ceará aplica tecnologia nas redes de saúde

O Ceará tem dado exemplo de como tecnologia e profissionais podem atuar juntos. Estado faz investimentos em Saúde Digital e chegou a adquirir, em junho deste ano, ferramentas advindas da Alemanha para melhorar 13 salas de cirurgias em 11 unidades da rede da Secretaria da Saúde (Sesa).

Entre os equipamentos adquiridos estavam torres de vídeo que possibilitam cirurgias laparoscópicas com qualidade 4K, softwares que minimizam a possibilidade de erros na entrada dos dados e soluções para equipamentos cirúrgicos, que buscam diminuir o tempo de preparação da sala.

No mesmo mês, o Hospital Estadual Leonardo Da Vinci (Helv), vinculado a rede Sesa, passou a usar um programa que monitora os produtos que passam pela Central de Esterilização de Materiais (CME). Cada equipamento recebe agora tags com informações de uso do produto, como data da esterilização ou desinfecção, e quem realizou o serviço, sem precisar de um acompanhamento manual. 

“O sistema tornou o processo mais ágil, seguro, dinâmico e sustentável. Não é mais necessário escrever em tantos papéis, passar as informações para diversas planilhas, e ocupar tantas pessoas para a mesma função. Além de todo esse benefício esse sistema nos trouxe mais segurança para o paciente e equipes. A segurança do processo é poder acompanhar em tempo real toda a rastreabilidade, todo o passo passo de cada pinça, de cada bandeja”, diz Bianca Nogueira, coordenadora da CME do Helv.

Já no Hospital Geral Dr. Waldemar Alcântara (HGWA), também vinculado a rede Sesa, um sistema inteligente chamado noHarm tem sido usado desde novembro de 2023 para auxiliar em processos do setor de farmácia, beneficiando mais de mil pacientes só em cerca de cinco meses.

“O uso da noHarm tem nos ajudado ao permitir priorizar às prescrições por escore de risco, otimizando nossa rotina de análise. Desta forma, podemos avaliar primeiramente aquelas que teriam mais riscos ou oportunidades de intervenções farmacêuticas”, explica o farmacêutico clínico Emmanuel Paiva.

“A ferramenta gera alertas relacionados por exemplo a sobredoses ou doses máximas, interações medicamentosas, incompatibilidades. Avaliando estes alertas, o farmacêutico realiza a intervenção com a equipe assistencial para adequações na prescrições, promovendo maior segurança ao paciente”, completa o profissional, que atuou na implantação da ferramenta na unidade de saúde.  

Brasil enfrenta barreiras para aplicar IA na saúde

A pesquisa TIC Saúde 2024, lançada em outubro deste ano, mostrou em números como o uso de ferramentas digitais no setor sanitário tem crescido no Brasil. Conduzido pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), o levantamento foi realizado a partir de entrevistas com 2.057 gestores de estabelecimentos de saúde e 2.021 profissionais do segmento.

O documento aponta que a utilização de sistemas eletrônicos alcançou 92% das instituições de saúde, mas que apenas cerca de 4% dos estabelecimentos sanitários utilizam Inteligência Artificial.

Entre aquelas instituições que não adotaram a IA, as principais razões dadas foram: a falta de necessidade (59%), o fato da tecnologia do porte não ser uma prioridade (61%) e os custos serem muito altos (49%).

No que diz respeito aos médicos, a adesão à Inteligência Artificial Generativa (um tipo de IA que consegue criar novos conteúdos) foi de 17% no geral. No entanto, nos estabelecimentos públicos foi de 14% e nos privados de 20%, mostrando que há uma abrangência maior no setor particular.

Além disso, apenas 23% dos médicos ligados as unidades haviam realizado algum tipo de capacitação e formação na área de informática em saúde.

Luiz Roberto, professor do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal do Ceará (UFC), aponta que o Brasil está entrando no terreno de possibilidades da Saúde Digital (que pode ser compreendida como o uso de tecnologias na área), mas frisa que a iniciativa teve atraso em relação a outros países.

"Há uma nítida sinalização de que realmente o Governo decidiu entrar nisso que chamamos de Saúde Digital, só que foi uma menção feita 30 anos depois do mundo", diz o docente. O profissional destaca que o setor privado pode ter mais adesão por ser menos "burocrático". "O País precisa reconhecer a Saúde Digital".

Roberto, que é ainda coordenador do Núcleo de Tecnologias e Educação a Distância em Saúde (NUTEDS), cita como barreira para os avanços a falta de infraestrutura para que capacitações em Saúde Digital aconteçam. Ele defende a criação de disciplinas obrigatórias em universidades sobre o assunto.

Inteligência Artificial pode substituir profissionais?

Outro ponto apontado na TIC Saúde 2024 foi relacionado a segurança de dados. Conforme pesquisa, em apenas 47% das unidades analisadas os funcionários haviam sido treinados em segurança da informação.

No Brasil vigora a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que controla a privacidade e o uso de dados pessoais. Conforme o professor Luiz Roberto, em paralelo ao regulamento é importante realizar discussões sobre o tema, para garantir a segurança e o avanço da aplicação da IA na saúde do País.

"Os dados são do paciente e, na saúde, muitos desses dados são sensíveis. A exposição deles pode levar o paciente a ficar constrangido", aponta o docente.

Neste cenário, Roberto volta a reforçar a necessidade de preparar profissionais para lidar com tecnologias inteligentes, mantendo o senso ético.

O docente estipula ainda que pessoas ligadas as áreas da tecnologia são necessárias no avanço da Saúde Digital e pontua que inteligências artificiais não vai "roubar" os empregos dos profissionais de saúde, mas que eles precisam se adaptar a elas, como aliados.

"Não existe esse risco. As pessoas que não se adaptarem, não apreenderem, correm o risco de ficar de fora do mercado, pois em todas as áreas a IA tem trazido benefícios", diz o docente.

Estado aplica tecnologia nas redes de saúde

O Ceará tem dado exemplo de como tecnologia e profissionais podem atuar juntos. Estado faz investimentos em Saúde Digital e chegou a adquirir, em junho deste ano, ferramentas advindas da Alemanha para melhorar 13 salas de cirurgias em 11 unidades da rede da Secretaria da Saúde (Sesa).

Entre os equipamentos adquiridos estavam torres de vídeo que possibilitam cirurgias laparoscópicas com qualidade 4K, softwares que minimizam a possibilidade de erros na entrada dos dados e soluções para equipamentos cirúrgicos, que buscam diminuir o tempo de preparação da sala.

No mesmo mês, o Hospital Estadual Leonardo Da Vinci (Helv), vinculado a rede Sesa, passou a usar um programa que monitora os produtos que passam pela Central de Esterilização de Materiais (CME). Cada equipamento recebe agora tags com informações de uso do produto, como data da esterilização ou desinfecção, e quem realizou o serviço, sem precisar de um acompanhamento manual.

"O sistema tornou o processo mais ágil, seguro, dinâmico e sustentável. Não é mais necessário escrever em tantos papéis, passar as informações para diversas planilhas, e ocupar tantas pessoas para a mesma função. Além de todo esse benefício, o sistema trouxe mais segurança para o paciente e equipes. A segurança do processo é poder acompanhar em tempo real toda a rastreabilidade, todo o passo passo de cada pinça, de cada bandeja", diz Bianca Nogueira, coordenadora da CME do Helv.

Já no Hospital Geral Dr. Waldemar Alcântara (HGWA), também vinculado a rede Sesa, um sistema inteligente chamado noHarm tem sido usado desde novembro de 2023 para auxiliar processos do setor de farmácia, beneficiando mais de mil pacientes só em cerca de cinco meses.

"O uso da noHarm tem nos ajudado ao permitir priorizar às prescrições por escore de risco, otimizando nossa rotina de análise. Desta forma, podemos avaliar primeiramente aquelas que teriam mais riscos ou oportunidades de intervenções farmacêuticas", explica o farmacêutico clínico Emmanuel Paiva.

"A ferramenta gera alertas relacionados a sobredoses ou doses máximas, interações medicamentosas, incompatibilidades. Avaliando estes alertas, o farmacêutico realiza a intervenção com a equipe assistencial para adequações na prescrições, promovendo maior segurança ao paciente", completa o profissional, que atuou na implantação da ferramenta.

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