Em meio a turistas e transeuntes que desde cedo estavam na avenida Beira Mar, em Fortaleza, na manhã de ontem, 24, um grupo se reuniu para uma “remada solidária”. Momento teve o objetivo de arrecadar fundos para custear uma cirurgia para o educador físico Vicente Cristino.
Segundo Galdino Malandrino, 43, representante da Kayakeria, seis canoas foram disponibilizadas. Trinta inscrições, que custavam R$ 30, foram recebidas.
O dinheiro arrecadado foi enviado para Vicente. Ele é fundador de projetos sociais que envolvem esportes e pessoas com deficiência e parceiro de longa data da Kayakeria e outras escolas.
A ideia da remada solidária veio no momento que o “mundo dos esportes náuticos descobriu que Vicente precisaria dessa cirurgia de valor alto.” "As pessoas precisaram, de alguma forma, retribuir o que ele faz."
Na visão de Galdino, as atividades de Vicente são uma “demonstração do amor”. Ele exemplifica isso com o fato do Projeto Remar ser composto por voluntários, mas, apesar disso, “nunca [diz] não, é sempre sim” para novos alunos. “Eles sabem o quão importante é o trabalho com as crianças.”
“Você vê, no brilho do olhar dele, que ele é uma pessoa que ama o que faz. Você vê que ele o esforço e a correria dele [mostram] a paixão por somar com famílias que precisam ser acolhidas”, finaliza o instrutor de caiaque.
A fortalezense Rafaela Pinheiro, 38, concorda: ela é mãe de Bento, criança autista não-verbal cuja socialização é promovida pela participação no Projeto Remar, fundado por Vicente Cristino.
Segundo a mãe — que participou da remada solidária —, o contato com a água por meio das aulas de remo servem “como terapia mesmo” para o filho. “Não falto, temos uma rotina na semana. Ajuda muito na socialização e nas questões sensoriais ao entrar em contato com água e areia. É muito benéfico”, relata.
Por isso, Rafaela demonstra “muita alegria e satisfação” por ajudar Vicente. "É escasso ter gente que se volta a esse público, por isso o professor Vicente merece tudo isso."
Vicente Cristino não compareceu à remada solidária, mas por um bom motivo: ele está em casa, em recuperação, após já ter passado pela cirurgia que precisava no tratamento contra câncer de próstata.
Por telefone, ele explicou que o procedimento foi realizado na última quarta-feira, 20. A previsão era que durasse quatro horas, mas durou três horas, segundo ele.
A cirurgia, de caráter robótico, custou R$ 22 mil e não era coberta pelo plano de saúde de Vicente; por isso surgiu a campanha de arrecadação.
Além dos alunos do Projeto Remar, outros fortalezenses tocados pelo trabalho de Vicente se solidarizaram, como as beneficiadas pelo Amar Rosa, grupo de apoio e prática de atividades físicas para mulheres que superaram o câncer de mama. Também houve uma rifa e contribuições individuais em dinheiro.
“Foi um sentimento geral dos ciclos que frequento”, analisa o educador físico. Ele lida, há mais de 35 anos, com reabilitação física e atende pessoas com deficiência e/ou com doenças que afetam questões como mobilidade. A maioria, segundo ele, pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
“A própria história diz: ‘se você planta, você colhe’. As pessoas tomaram conhecimento do que eu estava passando. Colegas e amigos abraçaram e fizeram a campanha, que foi se estendendo. Nada foi no meu nome, só repassavam as quantias para pagar os serviços”, explica Vicente.
Após a cirurgia — indicada para o caso dele por ser menos invasiva —, o educador está limitado a fazer caminhada, por prescrição médica. Ele contou que, meses atrás, quando recebeu o diagnóstico em uma consulta de rotina, intensificou exercícios físicos e respiração para auxiliar na recuperação.
A área em que ele atua, de atividade física adaptada, tem alta demanda. “Através do esporte, contribuímos para a quebra das discriminações e mostramos para as pessoas que elas têm capacidade”, conta.
"Para pessoas com deficiência, o esporte previne deficiências secundárias e mostra que a pessoa pode participar de atividades, pode fazer. Se não houvesse o preconceito, a gente ia quebrar ainda mais barreiras”, narra.
"Quero agradecer às pessoas que viram o que eu estava passando e estenderam as mãos. Ficaram do lado, apoiando. ‘Nós vamos te ajudar porque você nos ajuda e queremos que você volte o mais rápido possível’. É isso que estou fazendo, me cuidando para voltar logo e cuidar dos meus pacientes. Eu sei que eles precisam do meu trabalho"
Vicente Cristino, educador físico