A elevada fila de espera para cirurgias eletivas de ortopedia no Ceará continua sendo um problema para a saúde pública do Estado. Para lidar com o volume de pacientes que aguardam pelos procedimentos, a Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) deve contratar hospitais com e sem fins lucrativos para atender a especialidade.
O edital de contratualização, lançado em março de 2025, prevê R$ 37.156.310,59 para atender as cinco maiores filas de ortopedia, conforme a lista congelada em janeiro de 2025:
Como justificativa para buscar hospitais privados para realizar as cirurgias, o documento cita a baixa oferta ambulatorial relacionada a pré-consultas na rede da Sesa, a pequena rotatividade da fila cirúrgica eletiva de ortopedia e a alta demanda de processos judiciais relacionados a procedimentos cirúrgicos em tramitação.
“As cirurgias ortopédicas são os serviços mais judicializados”, registra o edital, publicado no Diário Oficial do Estado. Entre os procedimentos pactuados, com fila de 5.026 pessoas, 139 estão judicializados.
“A gente tem 17 hospitais que mandaram suas propostas para credenciamento. Já tem cinco que estão bem adiantados, onde a gente já está fazendo a análise do plano de ação, que é a quantidade de cirurgias que vão ser pactuadas para executar”, diz a coordenadora do Programa Estadual de Redução de Filas de Cirurgias Eletivas, Melissa Medeiros.
As propostas contemplam diversas regiões, como o Cariri, Norte e Sertão Central. As contratações devem respeitar a regionalização dos casos, evitando o deslocamento de pacientes para a realização das cirurgias.
Segundo a coordenadora, o maior gargalo envolve as cirurgias de mais alta complexidade, feitas em poucos dos hospitais da rede. “Pacientes mais velhos têm mais comorbidades, então não é qualquer hospital que pode realizar essas cirurgias. A gente precisa investir em alternativas”, afirma.
Estão inclusos no valor dos procedimentos repassado aos hospitais as consultas e exames pré-operatórios, serviços profissionais, medicamentos, órteses, próteses e materiais especiais, diárias em enfermaria ou leito de UTI e assistência pós-operatória.
Não há uma quantidade exata de cirurgias que devem ser feitas por cada unidade. O que vai definir o teto são os recursos disponíveis no edital, oriundos do tesouro estadual, e a capacidade instalada dos hospitais. Mesmo assim, Melissa Medeiros explica que é possível angariar mais verbas, caso seja necessário.
Dos R$ 52 milhões em recursos enviados pelo Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas, Exames Complementares e Consultas Especializadas (PNRF) ao Ceará em 2025, 20% serão destinados para a ortopedia. A proporção foi acordada em reunião da comissão bipartite, que reúne membros da Saúde estadual e federal.
“[O edital] tem duração de um ano. Os hospitais têm um ano para se credenciar e também para executar. À medida que a gente for executando, esses contratos podem inclusive ser aditivados para aumentar esse quantitativo”, diz a coordenadora.
Pacientes e familiares vivem a agonia da demora
Enquanto o processo de contratação temporária de hospitais é analisado, quem segue na fila de espera por uma cirurgia eletiva de ortopedia no Ceará ainda vive a agonia da demora. É o caso de Sônia Irene, 62, residente em Maracanaú, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), que aguarda há quase dois anos por uma prótese de joelho.
Ela passou a necessitar do procedimento devido a uma queda que levou em setembro de 2023. Na ocasião, foi levada para um hospital da região e um exame apontou que a mesma havia quebrado o fêmur.
De acordo com informações de familiares, como a instituição de saúde não tinha uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), Sônia foi inserida na Central de Leitos para ser transferida a outro hospital.
No relatório médico, ao qual O POVO teve acesso, consta: "A paciente sofre riscos de complicações graves, como perda de mobilidade do quadril esquerdo, bem como pneumonia e tromboembólica que podem levar a morte". Depois de algumas semanas, ela foi levada ao Instituto Doutor José Frota (IJF), um dos principais centros de referência em ortopedia do Estado.
Na unidade de saúde, foi identificado que Sônia tinha um grau elevado de artrose, sendo necessária uma cirurgia de artroplastia total. "Dessa forma, foi optado por alta hospitalar, com encaminhamento, via unidade básica de saúde, para realização de prótese de joelho esquerdo", aponta o relatório médico.
No documento, mais uma vez é acentuada a necessidade de urgência do procedimento, destacando que caso a cirurgia não fosse feita a paciente poderia sentir dor intensa e perder a movimentação do membro.
Mas Sônia nunca chegou a ser chamada. "Já vai fazer quase dois anos que botei (o caso) na Secretaria da Saúde esperando essa vaga e não surgiu nada, nem vaga, nem consulta. Minha mãe se encontra em cima de uma cama, se enchendo de ferida. É uma senhora obesa, hipertensa", diz Fernanda Vasconcelos, 38, filha de Sônia, que vive atualmente em dedicação total para os cuidados da mãe.
"Desde o dia que ela deu entrada no hospital, se encontra com sonda urinária, pois não temos condições de ir atrás de fraldas, e nem isso a gente é assistido", desabafa Fernanda.
O POVO entrou em contato com a Secretaria Estadual da Saúde (Sesa) na noite deste domingo, 18, detalhando o caso e questionando ações da pasta a respeito. O órgão informou que conseguiria apurar mais informações sobre o caso somente nesta segunda-feira, 19. (Colaborou Gabriela Almeida)