A audiência pública do Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE) discutiu nesta quinta-feira, 22, o incremento de notificações de acidentes e agravos ocorridos com motoristas e entregadores vinculados às plataformas digitais.
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A terceira audiência abordando a temática visa garantir que, nos registros realizados pelos serviços de saúde, conste que a vítima é um trabalhador do setor de transporte por aplicativo.
A gerente do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), Eline Mara Macedo, comenta que no ano passado foi instaurada uma atualização na portaria que elenca todas as doenças e agravos de saúde pública de notificação compulsória.
"Nós temos os acidentes de trabalho, exposição com material biológico, intoxicações exógenas, dermatoses ocupacionais, perda auditiva induzida pelo ruído, as lerdotes, que são as lesões por esforço repetitivo e distúrbios musculares relacionados ao trabalho", adiciona a gerente do Centro de Referência.
Ainda conforme Eline, o distúrbio de voz relacionado ao trabalho, na última atualização da portaria entrou como “doença de notificação obrigatória”.
Ela afirma que o Cerest está trabalhando para que a rede tenha sensibilidade em enxergar e reconhecer a relação do agravo no trabalho. “Muitas vezes isso acaba sendo um fator limitante para que a gente tenha um sistema de informação expressivo”.
Eline afirma que “todas as doenças são previsíveis”. "São eventos sentinelas: se um trabalhador se acidentou, outros trabalhadores irão se acidentar da mesma forma. Então, todas elas são preveníveis e previsíveis, portanto, passíveis de evitá-las", pontua.
O Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) é responsável por fazer uma investigação: saber quais as atividades econômicas que mais incidem, maior prevalência para fazer ações in loco nos ambientes de trabalho, a fim de evitar novos casos de acidentes.
Conforme Mara, as regiões de Baturité, Crateús, Itapipoca e Maracanaú deverão receber unidades do Cerest até 2027.
Um comparativo de casos de Doenças e Agravos Relacionados ao Trabalho (DART) registrados em motoristas pelo Sinan, aponta que o ano com mais registros é 2024, onde 590 ocorrências foram registradas.
O ano com o segundo maior número de incidências é 2023, com 463 registros de acidentes. Atrás vem 2022 com 341 acidentes relacionados ao trabalho. Em seguida, temos o ano de 2020 com 238 ocorrências e por fim, 2021 com 193 casos.
Para entender melhor as siglas relacionadas aos incidentes, a Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde (BVSMS), disponibilizou um Manual de Procedimentos aos Serviços de Saúde.
A pesquisadora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Lívia Romero, revela que um estudo feito em 2022 pela instituição, apontou que de 100 entregadores por aplicativo, pelo menos 41% deles sofreram acidentes, seja no percurso, durante a atividade de entrega ou ambos.
“É um estado de alerta que vai produzir um cansaço mental”. Ela afirma que, além do cansaço físico, riscos mecânicos e de acidentes em longas jornadas de trabalho, sem o tempo de descanso em um local adequado, potencializam riscos para o trabalhador.
"A gente tem um cenário ainda de muito desemprego, muita informalidade e o trabalho por aplicativo ele entra ali como uma opção (...) Muitas vezes não é uma pessoa que tem uma longa história dentro daquela ocupação, isso vai trazer inúmeros riscos, especialmente de acidentes, tanto para o trabalhador quanto para o restante da classe trabalhadora, que somos todos nós", afirma.
A procuradora de justiça, Isabel Porto, destaca que a situação é preocupante, visto que há uma portaria ministerial, mas que evidentemente não é cumprida em relação às notificações.
"Nós estamos falando dessas notificações aqui, mas tem tantas outras que também existem há muito mais tempo que também não são efetivamente cumpridas. Isso traz um problema aos profissionais de saúde, que nós temos que fazer com relação às unidades [de saúde]".
Ela pontua que uma ação para chamar a atenção ao cumprimento da portaria ministerial por parte das unidades de saúde pode ser iniciada. “Podemos começar pelo município de Fortaleza (...) É importante a comunicação e fazer a publicização daquilo que efetivamente existe e que efetivamente tem que ser cumprido", ressalta.