Por falta de verbas, a Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza, de forma provisória, suspendeu o recebimento de novos pacientes na unidade por problemas financeiros. A informação foi confirmada ao O POVO pelo provedor da unidade de saúde, Vladimir Spinelli na última sexta-feira, 6 de junho. Por conta de uma crise, o hospital tem dificuldade em manter os atendimentos com a segurança necessária para os pacientes.
“É um imperativo a que somos forçados, até que consigamos que o poder público nos ajude a cobrir os déficits mensais provocados pela defasagem da tabela SUS. As arrecadações que fazemos já não são suficientes. Como a saúde pública é um direito do cidadão e um dever do Estado (na sua acepção ampla), temos pleiteado que os valores defasados sejam compensados ou que se faça um aporte mensal como foi encaminhado no final de 2024, após reunião com a então Ministra, mas não teve continuidade”, disse.
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Ao O POVO, Spinelli diz que o grande desafio vem de um déficit mensal de aproximadamente 3,2 milhões de reais e, por isso, as dívidas têm aumentado e os salários não estão sendo pagos em dia.
“Temos tido contatos com todas as instituições envolvidas e parlamentares. Recentemente, por exemplo, tivemos reunião com as duas Secretarias de Saúde (Estado e Município) e representantes do Ministério da Saúde e, depois, quando colocamos as causas da crise, o que vimos fazendo, o que nos comprometemos a fazer e o que esperamos de apoio. Como houve mudança na Secretaria Municipal, precisamos aguardar que a nova gestão tome ciência de tudo para retomarmos as discussões”, apontou.
Além disso, o hospital publicou um vídeo nos perfis das redes sociais detalhando o que acontece com os valores repassados para a unidade e ressaltando que as doações são importantes para que o trabalho continue.
"O SUS paga apenas R$ 10 por uma consulta médica e R$ 996,34 por uma cirurgia de vesícula, que custa a Santa Casa R$ 2.413,20 ou uma diferença de 242%. Esse tipo de déficit se repete em todos os atendimentos de média complexidade", informa o vídeo.
A legenda da postagem traz informações sobre transparência e um pedido por doações: “No vídeo, mostramos com transparência como gastamos cada centavo que recebemos — e por que a sua doação é tão importante. O valor repassado pelo SUS não cobre nem metade dos nossos custos. É graças à solidariedade de pessoas como você que a Santa Casa de Fortaleza continua de portas abertas. Doe via PIX: financeiro@santacasace.org.br ou doe via conta de energia: 0800 042 0108".
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O POVO procurou a Secretaria Municipal de Saúde para um posicionamento. Em nota, a pasta informou que "não há débitos pendentes com a Santa Casa de Misericórdia. Somente em 2025, o poder público municipal repassou mais de R$ 22 milhões à instituição, sendo o último pagamento realizado na primeira semana de junho, no valor aproximado de R$ 2 milhões".
A reportagem também procurou a Secretaria de Saúde do Estado do Ceará (Sesa) que, em nota, informou que também está em dia com a Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza. "A unidade filantrópica, que não é de gestão do Estado, possui relação com a Sesa por meio da Política Estadual de Incentivo Hospitalar, sendo classificada como hospital estratégico".
O comunicado enviado ao O POVO diz ainda que a política prevê um aporte mensal do Estado para a manutenção dos serviços de Clínica Médica, Cirurgia Geral e Oncologia da Santa Casa. "De janeiro a maio deste ano, foram repassados R$ 1.950.000 à Prefeitura de Fortaleza, que é responsável por destinar os valores à instituição", informou a Sesa.
A pasta ressaltou ainda que aproximadamente de 25 milhões em verbas estadual e federal foram repassados para Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza.
"Em 2024, o Governo do Estado repassou R$ 14.401.114 à Santa Casa de Misericórdia, conforme prestação de contas de uso desse recurso, apresentada pela unidade. O valor diz respeito ao aporte de R$ 16 milhões voltado à subvenção social para a instituição, aprovada pela Assembleia Legislativa em dezembro de 2023. Além disso, o Governo do Ceará, por meio da Sesa, articulou junto ao Governo Federal o aporte de R$ 9,5 milhões, valor repassado em janeiro deste ano", finalizou
A Santa Casa de Misericórdia é um hospital filantrópico que funciona desde 1861. Na unidade, são realizados atendimentos ambulatoriais, cirurgias de pequena, média e alta complexidade, com o volume maior na média complexidade.
Em 2024, a unidade de Saúde realizou 3.434 cirurgias, 2.855 pequenas cirurgias, 19.287 consultas ambulatoriais, 1.006 internações, 3.549 internações na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e realizou 26.356 exames diagnósticos.
A casa de Saúde Eduardo Salgado, unidade particular da Santa Casa, realizou 1.632 cirurgias e 4.029 consultas.
De acordo com Marcelo Alcântara, diretor de inovação em saúde da Santa Casa Fortaleza e coordenador da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do local, desde 2024 a entidade vem diminuindo suas internações.
Ele destaca que a admissão dos pacientes que precisam de leitos de UTI foi suspensa na instituição, e que isso vai trazer consequências para a saúde pública, afetando principalmente quem precisa do serviço.
"Como consequência a gente tem uma diminuição de leitos de UTI para os pacientes que precisam disso, isso impacta nas Upas, nas emergências, nas filas dos pacientes (em estado critico)", frisa.
Procurada pelo O POVO nesta segunda-feira, 9, a Santa Casa de Misericórdia disse que a suspensão segue enquanto não houver um encaminhamento. O hospital informou que as cirurgias pelo SUS já estavam suspensas, salvo em casos extremos.
"As cirurgias se fazem quando temos as condições adequadas, que vão do enxoval à equipe completa. Portanto, dependem também dos recursos pleiteados", disse.
Na manhã de ontem, 9, os representantes da Santa Casa se reuniram com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) para discutir possíveis soluções. Aporte adicional foi considerado urgente.
Colaborou a repórter Gabriela Almeida