Fortaleza, Caucaia e Juazeiro do Norte evoluíram quanto a investimentos realizados para garantir o fornecimento de água e esgoto mas, em contrapartida, municípios têm perdido a qualidade do serviço. Cenário é apontado na 17ª edição do Ranking do Saneamento, realizado pelo Instituto Trata Brasil (ITB).
Divulgada na última semana, a pesquisa analisou dados do Ministério das Cidades, referentes a 2023, e atribuiu notas de zero a dez para os quesitos de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto e investimentos por habitante nas 100 cidades mais populosas do País, entre elas as três cearenses.
Balanço considera ainda perdas sofridas pelas prestadoras de serviços, como água não cobrada dos clientes devido à desvios irregulares ou vazamentos, água que não chega aos clientes e falhas nas ligações das residências.
O melhor posicionado entre os três municípios do Ceará é Fortaleza, que com média 7,19 ocupa a 62° posição, seis à frente do ano passado. A cidade registrou avanços em investimentos por habitante (R$125 para R$147 por pessoa), percentual de moradores com abastecimento de água (84% para 98%), coleta (62% para 66%) e tratamento de esgoto (60,76% para 60,94%), entre outros.
Os indicadores de qualidade do serviço, entretanto, caíram na Capital, com maiores percentuais de água gerada que se perde no caminho para a casa dos clientes e perdas de água por ligação nos imóveis.
O cenário foi parecido em Caucaia e Juazeiro do Norte, que com médias 5,51 e 4,43, saltaram seis posições cada e ocupam respectivamente a 79° e a 85° posição. As cidades evoluíram em investimento e tiveram piora nos rankings de eficiência.
Thomaz de Almeida Ortiz, Coordenador de Projetos em Saneamento da GO Associados, parceira do ITB na produção do ranking, explica que os investimentos nem sempre emitem resultados imediatos na qualidade do serviço, e assim como aconteceu em Fortaleza, é possível se ter mais dinheiro aplicado, eperdas constantes de água.
"A elevação dos investimentos e a ampliação da cobertura não necessariamente reduzem imediatamente os níveis de perdas. Problemas estruturais, como redes antigas ou mal dimensionadas, furtos de água (ligações clandestinas), fraudes em hidrômetros e dificuldades de faturamento, podem impactar negativamente os indicadores", afirma.
A cidade da Região Metropolitana de Fortaleza é quem traz o recorte mais positivo do Estado, tendo obtido nota máxima e figurado entre os dez municípios no País com menor perda na distribuição.
Caucaia reduziu de 44% para 20% a quantidade de água que é gerada, mas não chega na residência dos clientes, o que segundo a gerente de perdas da Companhia de Água e Esgoto do Estado do Ceará (Cagece), Isabel Lima, ocorre após unificação do sistema de atuação da Cagece na cidade, que antes era feito por três unidades diferentes da Companhia.
“Tendo essa gestão unificada dessa distribuição de água a gente consegue trabalhar de maneira mais eficiente. Antes eu tinha três áreas atuando dentro de um mesmo município. Hoje essa atuação está concentrada e a gente consegue fazer uma distribuição de água mais eficiente e equalizada”, explica Lima.
Questionadas pelo O POVO se possuem atuação no acompanhamento e fornecimento de água e esgoto para a população, as Prefeituras de Fortaleza e Caucaia afirmaram monitorar constantemente a atuação da Ambiental Ceará, empresa que atua em ambas as cidades através de parceria público-privada com a Cagece.
Ainda segundo Lima, as perdas são o grande desafio para as prestadoras de serviço em saneamento do país. Entre as medidas adotas no Estado para mitigar os efeitos desses problemas estão a troca do quadro de hidrantes, melhorias no sistema de pressão e fiscalização de fraudes.
Os trabalhos são direcionados a atender a meta do Marco Legal do Saneamento Básico, publicado pelo Governo Federal em 2020 e que prevê 99% da população brasileira com acesso a água potável e 90% ligada à rede de esgoto.
“Os investimentos em infraestrutura foram intensificados de 2022 para cá, principalmente a partir de 2023, e vão se estender até 2033, que é o prazo para atingimento das metas do Marco. Nos próximos anos a gente vai intensificar essas questões de infraestrutura para atuar nessa gestão de pressão e na questão da submedição e fraudes”, conclui Lima.
O quadro mais alarmante apresentado pela pesquisa é o acesso à esgoto. Dentre as três, apenas Fortaleza tem mais de 45% da população ligada à rede de coleta, sendo Juazeiro do Norte o município de maior preocupação, com apenas 22% dos moradores dispondo do serviço.
A cidade no Cariri, inclusive, está entre as 10 piores do ranking nos serviços tanto de coleta, quanto de tratamento de esgoto. Para o pesquisador em saneamento ambiental Michael Barbosa, a falta do serviço pode acarretar em problemas não só para os moradores da cidade, mas também para outros seres vivos da região.
“Quando esse esgoto é lançado no corpo d’água a gente tem problemas ambientais como mortandade de animais aquáticos e marinhos, geração de odores, impossibilita esse corpo d’água de ser usado para diversos usos. Quando esgotos domésticos são lançados em corpos d’água sem tratamento adequado, tem ali uma série de micro-organismos causadores de doenças”, pontua o doutor em Engenharia Sanitária e professor do Instituto de Ciência do Mar da Universidade Federal do Ceará (UFC).
O pesquisador também destaca o papel dos serviços de água e esgoto como pré-requisito para uma melhor qualidade de vida da população e também economia em saúde pública, já que segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cada real investido em saneamento pode evitar o gasto de até R$9 em internações e outros cuidados de medicina curativa.
“Universalizar o acesso a água potável significa você permitir que a população consuma água com padrões adequados e assim reduzir doenças de veiculação hídrica, sobrecarga de hospitais, gastos com medicina corretiva e também aumentar o bem-estar da população”, afirma Barbosa.
Procurada pelo O POVO, a Ambiental Ceará, empresa responsável pelo serviço de esgoto na área urbana de Juazeiro do Norte, informou que o índice apontado pelo ranking não representa em totalidade o serviço prestado no município, já que não considera o número de pessoas que optam por não ligar a casa à rede de esgoto.
Segundo a empresa, a rede de esgoto já instalada no município alcança 41,42% da cidade, mas só 22% já efetivaram a ligação. A Ambiental ainda prevê R$ 130 milhões em investimento no saneamento da cidade até o fim do ano, aumentando a cobertura da rede de esgoto para 46,3%.
Também está prevista a implementação de infraestrutura de esgoto em outros municípios do Estado, possibilitando que 100 mil imóveis tenham o serviço disponível, o equivalente a 235 mil cearenses beneficiados.
Também questionado, o Sistema Integrado de Saneamento Rural da Bacia do Salgado (Sisar-BSA), atuante na zona rural de Juazeiro, não emitiu resposta.
Também questionada sobre o saneamento básico na cidade, a Prefeitura de Juazeiro do Norte reforçou que os serviços na cidade são prestados pela Cagece em áreas urbanas e Sisar na parte rural da cidade, e que os acompanha, em especial as obras que afetam vias públicas.
"A Prefeitura Municipal, por meio da Secretaria de Infraestrutura (SEINFRA) e da Autarquia de Meio Ambiente (AMAJU), acompanha e realiza o monitoramento dessas ações, principalmente no que diz respeito aos impactos nas vias públicas, licenciamento de obras, fiscalização de intervenções, além do diálogo constante com os prestadores sobre a ampliação e a qualidade dos serviços", disse a gestão, em nota.