Após dois dias de suspensão, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Ceará (Sindiônibus) voltou atrás e vai retomar operação que havia sido reduzida na segunda-feira, 29. De acordo com órgão, as 25 linhas que foram suspensas vão voltar a circular normalmente hoje, 1°.
Os coletivos que haviam sido reduzidos em 29 trajetos também voltam ao quantitativo normal. Em nota encaminhada ao O POVO, órgão destaca que "a decisão é fruto de um esforço adicional envidado pelas empresas de transporte para que o diálogo seja retomado, mesmo diante das dificuldades financeiras que impactam o setor, especialmente no cumprimento dos compromissos salariais com colaboradores".
Entidade reforçou ainda em documento a "urgência em ampliar o diálogo sobre o transporte coletivo, de forma a construir soluções conjuntas que garantam a continuidade e a qualidade da mobilidade urbana".
Sindiônibus também destacou que a decisão de reduzir linhas foi adotada em caráter emergencial, integrando "um conjunto de ações voltadas a viabilizar a manutenção do serviço em meio ao atual cenário de desequilíbrio financeiro", completando que "o estudo que embasou a decisão considerou fatores como dimensionamento da frota, análise de rotas e demanda de passageiros".
Momentos antes do anúncio do sindicato, o prefeito Evandro Leitão (PT) falou sobre o retorno da operação durante a entrega da reforma do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) do Serviluz.
"Estávamos em tratativa, fomos pegos de surpresa tanto quanto a população. E estamos anunciando que todos esses trechos que foram retirados estarão retornando amanhã”, afirmou. Assim como o sindicato, ele não explicou que tratativas foram realizadas para que se desse uma trégua ao imbróglio.
Pela manhã, o mandatário havia cumprido agenda no Conjunto Ceará para a entrega de um Posto de Saúde, onde falou que estudava incrementar o transporte complementar, composto de vans e topics, para suprir a demanda deixada pelas linhas de ônibus suspensas e mitigar prejuízos provocados.
“(Trabalhamos) para suprir essa ação desrespeitosa, de uma outra forma, com transporte complementar, para que a população não fique desassistida. Peço desculpas à população", disse em coletiva.
Outra medida mitigadora tomada durante suspensão foi o retorno das linhas 106 – Floresta/Centro e 020 – Campus do Pici. Em razão da exclusividade com a qual operam, a Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor) informou que elas seriam retomadas em horário reduzidos, com frota e itinerário feitos por veículos da Cooperativa dos Transportadores Autônomos de Passageiros do Estado (Cooptraps).
Prefeitura também tentou aumentar a pressão sobre o sindicato, buscando meios jurídicos. Ainda ontem o Município apresentou uma notificação extrajudicial contra o Sindiônibus por “infração contratual grave”. Conforme apuração do jornalista Carlos Mazza, na intimação, a Procuradoria Geral do Município (PGM) dava até 24 horas para a retomada das linhas. Também dentro desse prazo o sindicato deveria apresentar um "plano de operação com as medidas adotadas para garantir a continuidade plena do serviço".
O corte das linhas marca um momento de tensão da negociação entre Prefeitura e Sindicato pelo reajuste do subsídio mensal, que já perdura há meses. Grande impasse até aqui tem sido como mitigar o déficit das empresas, com alternativas entre o incremento do subsídio municipal ou das passagens.
Com informações de Alexia Vieira e Carlos Mazza
Os dias em que serviço esteve reduzido trouxeram prejuízos para quem vive em Fortaleza. Conforme levantamento exclusivo realizado pelo O POVO, pelo menos 167 paradas de ônibus ficaram inativas em Fortaleza após a suspensão de 25 linhas de transporte coletivo. Desse total, seis estruturas do porte eram exclusivamente compartilhadas no itinerário de mais de uma das linhas que foram extintas.
Os bairros que mais ficaram com paradas "órfãs" foram: Joaquim Távora (19), Mucuripe (16), Fátima (11), Passaré (11), Dionísio Torres (10), Bom Futuro (9), Engenheiro Luciano Cavalcante (8) e Pici (8).
Essas estruturas perderem o uso a partir do momento em que os ônibus que passavam por elas deixaram de circular, o que trouxe consequências para passageiros e comerciantes. Na rua Rufino de Alencar, no Centro, por exemplo, o vendedor de frutas Arleane Nascimento, 45, viu o fluxo de clientes diminuir.
Há mais de 10 anos, o comerciante estaciona seu carrinho no entorno do Paço Municipal e da Catedral Metropolitana de Fortaleza, antes de seguir para as feiras da região. A localização era estratégica: em frente à parada de ônibus. Dali desembarcava a maior parte de sua clientela, passageiros das linhas 14 (Aguanambi / Rodoviária II / Centro) e 903 (Papicu / Varjota / Centro), ambas suspensas.
“Aqui a gente fazia umas vendas, porque ficava um povo ali (na parada). Depois dessa coisa dos ônibus, eu percebi que diminuiu. As pessoas que paravam aqui e vinham para as feiras daqui diminuíram muito. Depois dessas linhas cortadas eu não vi mais ninguém. Eu acho que prejudicou muito mesmo”, lamenta.
Próximo dali, na rua Vinte e Cinco de Março, é possível encontrar outra parada abandonada. O ponto, localizado em frente ao prédio da Secretaria Municipal de Relações Comunitárias, fica em frente à bodega comandada por Dimas Antônio Nascimento, de 68 anos.
Morador da região há mais de 40 anos, o bodegueiro conta que uma única linha circulava pelo local: a 14 (Aguanambi / Rodoviária II / Centro). A exclusividade do coletivo na região fez com que o vendedor chegasse a conhecer as duas motoristas responsáveis por fazer a rota.
“Quando passa, é só uma ou duas vezes por dia. Eu abro aqui às 6 horas da manhã e fecho às 15 horas. Quando o pessoal está ali (na parada), eu digo ‘sente aqui, almoce, e espere o ônibus passar’. Quando passa, porque passava quando eles queriam, a hora em que eles queriam. Então, não faz diferença nenhuma, só faz prejudicar as pessoas”, desabafa.
Na rua Francisco Lorda, no bairro Vila União, a suspensão da linha 513 (Parangaba / Uece / Luciano Carneiro) atrasou os planos da aposentada Francisca Passos, 79. Ela aguardou por uma hora a passagem do ônibus, sem sucesso. Foi quando resolveu mudar de parada e de ônibus, indo para o ponto localizado próximo ao Hospital Albert Sabin. “Pela manhã eu peguei foi o 44 (Parangaba / Montese / Papicu), que desce lá na (avenida) Borges de Melo. Aí eu vim andando para cá. Mas eu não consegui nada", lastima.
Gabriele Félix, Levi Lima
Ato estudantil contra redução de ônibus enfrenta resistência de motoqueiros no Pici
Estudantes da Universidade Federal do Ceará (UFC) se reuniram na noite desta terça-feira, 30, na avenida Humberto Monte, para protestar contra a redução e interrupção de linhas de ônibus em Fortaleza. Na ocasião, concentrados no semáforo, uma breve altercação com os motoqueiros, que tentaram forçar a passagem entre os estudantes, foi registrada.
A medida que culminou no protesto foi anunciada pelo Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindônibus) na última segunda-feira, 29. As 25 linhas suspensas devem retornar a circulação nesta quarta-feira, 1°.
Com faixas, cartazes e gritos de ordem, os manifestantes fecharam parte da via e entoaram: “Pelo busão, eu vou lutar. Sem transporte, não tem como estudar”. A concentração ocorreu na Praça Prisco Bezerra, em frente ao campus do Pici.
Veja vídeo da manifestação:
A principal queixa dos estudantes é a suspensão da linha interna 020 – Campus do Pici, responsável por interligar os blocos da instituição. O serviço era considerado essencial para garantir mobilidade dentro da cidade universitária.
Maria Luísa, estudante de Economia Ecológica e representante discente no Conselho Universitário, relatou as dificuldades enfrentadas:
“Muitos não conseguem se alimentar, chegar às aulas ou se locomover entre os blocos, especialmente estudantes com deficiência física. Temos relatos de alunos que se arriscam caminhando grandes distâncias no campus mal iluminado. Alguns chegam atrasados ou deixam de assistir aulas por completo.”
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A falta de transporte seguro e eficiente, especialmente no período noturno, também foi apontada pelos alunos como um risco. Levi Rabelo, estudante de Engenharia de Produção e diretor do Diretório Central dos Estudantes (DCE), destacou o impacto:
“Sou estudante noturno e muitos colegas tiveram que jantar no RU e voltar às 18 horas ou 18h30min, no breu do campus do Pici, sem garantia de que estariam seguros. Mesmo andando em grupo, não havia certeza de segurança em todo o trajeto. O 020 ajudava muito, mas com sua redução, os estudantes estão expostos a riscos maiores à noite.”
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A linha 020, que operava dentro do campus do Pici, era geralmente atendida por um veículo do Sindônibus, seguindo o padrão das demais linhas da cidade, e contava com o reforço de uma topic da Cooperativa dos Transportadores Autônomos de Passageiros do Estado do Ceará (Cootraps) nos horários de pico.
“Só restaurar o 020 não resolve; os ônibus continuam superlotados e sem condições adequadas de uso, especialmente para pessoas com deficiência”, reforçou Levi.
Esse é também o caso de André Luiz, 59 anos, estudante de Economia Ecológica na UFC, que tem deficiência visual. Morador da Messejana, ele explicou que a redução do 020 impacta diretamente seu deslocamento, que já envolve várias conexões de transporte.
“O campus do Pici é grande, e sem o 020 vai ser complicado. A gente defende que haja o retorno do 020 como era antes, até com mais ônibus, porque o deslocamento de quem está no início do campus, como no ICA, RU e av. Humberto Monte, não tem condição de ser feito a pé”, lamentou.
Durante a manifestação, estudantes chegaram a queimar palhas em frente a um semáforo. A ação, organizada pelos movimentos estudantis, buscou chamar atenção para os cortes das 25 linhas e suspensão de outras 29, e sensibilizar motoristas sobre a importância do transporte coletivo para quem não possui veículo próprio.
Allisson Bruno, graduando em Gestão de Políticas Públicas, destacou que o protesto foi também uma forma de se solidarizar com os colegas prejudicados:
“Quando eu vejo os meus colegas tendo que andar a pé pelo campus ou perdendo um direito que é deles, isso também me afeta. Mesmo não utilizando a linha 020, eu participei por dever acadêmico e profissional, mas também por empatia”, afirmou. (Colaborou Penélope Menezes)
25 linhas que tiveram operação suprimida
14 Aguanambi/Rodoviária II/Centro
20 Campus do Pici
22 Jardim das Oliveiras/Centro
81 Cj Ceará/Antônio Bezerra II
91 Expresso/Antônio Bezerra/Parangaba
97 Antônio Bezerra/Siqueira
106 Floresta/Centro
200 Antônio Bezerra/BRT/Centro
217 Estação/Pio Saraiva II/Antônio Bezerra
302 Rodolfo Teófilo/José Bastos/Centro
307 Parangaba/Itaóca/Jardim América/Centro
352 Solar das Águas/Green Park/Parangaba
374 Aracapé/Centro
400 Osório de Paiva/Siqueira
404 Aeroporto/Rodoviária/Benfica/Centro
501 Bairro de Fátima/Rodoviária/Centro
513 Parangaba/UECE/Luciano Carneiro
614 Curió/Terminal Washington Soares/Messejana
633 Passaré/Centro
653 Santa Fé/Messejana
668 Parque Betânia/Messejana
701 Parque Americano/Centro
835 Papicu/Câmara Municipal/Defensoria
903 Papicu/Varjota/Centro
1310 Siqueira/Hospital Universitário Do Ceará