Nos últimos anos, o audiovisual brasileiro tem ganhado força com as produções que vêm sendo lançadas. Com personagens diversos, os lançamentos audiovisuais acabam por desenvolver um sentimento de identificação entre público e obra.
Conforme o Anuário Estatístico do Audiovisual Brasileiro 2024, publicado recentemente no Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA), pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), os números são positivos ao setor de exibição em comparação com o ano de 2023.
Houve um aumento de 9,8% no público total das salas de cinema, representando 125,3 milhões de pessoas. A renda total cresceu em 11,3%, o que significa um aumento de R$ 2,5 bilhões considerando a correção inflacionária.
No comparativo da variação de público em relação ao ano anterior, com uma amostra de outros países selecionados, o Brasil apresentou o segundo melhor resultado, atrás somente da Indonésia (10,7%).
Conforme o relatório, 2024 foi um ano de conquistas, com a retomada da Cota de Tela Obrigação de as empresas exibidoras incluírem na sua programação obras cinematográficas brasileiras de longa-metragem. O número de sessões para o cumprimento da cota, a diversidade de títulos que devem ser exibidos e o limite de ocupação máxima de salas de um mesmo complexo pela mesma obra são estabelecidos anualmente, por um Decreto do Presidente da República. A redação original da MP 2.228-1/2001 previa que a obrigação duraria apenas por 20 anos, ou seja, até 2021. No entanto, a Lei 14.814/2024 restabeleceu a Cota de Tela, agora com validade até o ano de 2033. e a marca de cinco títulos nacionais acima de 1 milhão de espectadores. Veja abaixo:
Já o número de títulos brasileiros constituintes de espaço qualificado veiculados na TV Paga aumentou. Em 2023, eram 5.618, e em 2024, 5.779. A participação destas obras no tempo total de programação aumentou em 19,8%.
Para o professor do curso de Cinema e Audiovisual da UFC, Marcelo Ikeda, o cinema não só reflete como molda as características da identidade nacional, e “também influencia a formação da nossa identidade”.
“Em vez de uma identidade nacional ou regional, na verdade, a mim acho que a cultura expressa essa pluralidade de pontos de vista, e também dos embates do que é o Brasil hoje em termos de um conceito único", acrescenta.
Conforme Marcelo, a representação do cinema historicamente no Brasil sempre foi produzida pela elite. “Aos poucos começam a surgir movimentos de fato da produção do cinema na periferia”.
Ele cita como exemplos o filme “Amado”, gravado na Ceilândia, região do Distrito Federal (DF) e dirigido por Adirley Queirós; e o livro “Cineastas E Imagens do Povo”, escrito por Jean-Claude Bernardet.
“A gente tá num movimento ainda incipiente, mas acho que aos poucos a gente começa de fato a ver um cinema autenticamente popular. Uma representação, de fato, da periferia pela periferia", acrescenta.
Para ele, há uma diferença entre “cinema comercial” e “cinema popular”. Ikeda explica que, o primeiro termo refere-se a uma franquia que vende uma grande quantidade de ingressos.
Já a segunda expressão diz respeito a um cinema produzido pelas massas populares. “Feito pelas periferias e pelo Interior”, adiciona.
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Para a professora da Casa de Cultura Francesa (CCF), da Universidade Federal do Ceará (UFC), Gleyda Cordeiro, ultimamente o cinema nacional tem se dedicado a essas temáticas, que vão “mostrando as várias caras do Brasil”.
Ela cita a adaptação de “A Hora da Estrela”, da escritora e jornalista Clarice Lispector, feita pela cineasta Suzana Amaral, como um dos exemplos de produção audiovisual que cria uma identidade no povo brasileiro. “Ela trata essa questão do nordestino que vai para a região Sudeste em busca de melhores oportunidades.”
Gleyda pontua que outras obras também criaram essa percepção da personalidade nordestina no audiovisual. “Se você for analisar, o Nelson Pereira adaptou várias obras do Graciliano dos Santos, como ‘Vidas Secas’ e ‘Memórias do Cárcere’ (...) Algumas obras do Jorge Amado de certo modo contribuíram para essa criação, desse imaginário dos personagens ou de nós nordestinos no audiovisual", exemplifica.
O impacto de não se ter essa representação, conforme Gleyda, é o “perigo da história única”. O conceito foi criado pela autora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie.
“Quando você só tem acesso a um modelo que vem de fora e não necessariamente representa você, existe um apagamento (...) Quando você não tem uma indústria cultural consolidada e incentivada, o risco que a gente tem é de apenas copiar obras que vê de fora", conclui a professora.
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