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Jovens LGBTQIA+ relatam mais impactos da pandemia na saúde mental, aponta pesquisa
Ciência e Saúde

Jovens LGBTQIA+ relatam mais impactos da pandemia na saúde mental, aponta pesquisa

Segundo relatório desenvolvido pelo coletivo #VoteLGBT, um em cada dois LGBTs de 15 a 24 anos apontaram a saúde mental como o maior problema durante o distanciamento social
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Impactos na populacao LGBTQIA+ no Brasill (Foto: luciana pimenta)
Foto: luciana pimenta Impactos na populacao LGBTQIA+ no Brasill

Conflitos com a própria família por conta de transfobia e homofobia, solidão, incerteza, interrupção de atendimentos médicos, dificuldade financeira e piora de quadros de ansiedade e depressão preexistentes. Esses, entre outros, foram alguns pontos citados em relatos coletados pela pesquisa “Diagnóstico LGBT+ na pandemia — Desafios da comunidade LGBT+ no contexto de isolamento social em enfrentamento à pandemia de coronavírus”, realizada pelo coletivo #VoteLGBT em colaboração com o escritório de pesquisa BOX1824.

Realizada virtualmente entre 28 de abril e 15 de maio últimos, a pesquisa contou com participantes de todas as regiões brasileiras. Piora na saúde mental foi o aspecto mais apontado pelas mais de 9,5 mil respostas à pergunta “qual a maior dificuldade você está enfrentando durante o isolamento social/quarentena?”. Ao todo, esse aspecto foi relatado por 42,72% das pessoas. Sem seguida, como maiores impactos foram relatados o afastamento da rede de apoio e a falta de fonte de renda.

Especificamente sobre os impactos na saúde mental, os resultados da pesquisa indicam que esse problema é maior entre os jovens, atingindo um em cada dois LGBTs de 15 a 24 anos. Entre as faixas etárias mais velhas, o problema foi relatado por 21% das pessoas com 45 a 54 anos e por 12% daquelas com 55 anos de idade ou mais.

Para além do contexto da pandemia de Covid-19, pessoas LGBTQIA+ são mais vulnerável aos problemas de saúde mental. Elas têm duas vezes mais chance de ter algum transtorno mental ao longo da vida, em comparação com homens e mulheres heterosexuais, segundo a Associação Americana de Psiquiatria.

Durante a pandemia de Covid-19, mais pessoas passaram a buscar a Casa Transformar, organização não-governamental que acolhe pessoas LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade ou exclusão familiar e social. Fundadora da Casa Transformar, a funkeira trans e cearense Nik Hot explica que a maioria das pessoas que buscam a ONG estão com a saúde mental abalada por conta de relacionamento abusivo, exclusão da família ou preconceito sofrido na rua.

"Independentemente da situação, sempre existe alguma fragilidade por conta de traumas ou de situações que essas pessoas passaram antes de chegar aqui", afirma. Ela mesma conta ter passado por uma crise de ansiedade "um pouco mais grave" que as anteriores. Além disso, aponta o uso de hormônios como um fator que, aliado ao contexto da pandemia, impactou a própria saúde mental.

Além de passar por um processo de autoaceitação para lidar com uma sociedade que não lida bem com a diversidade sexual e de gênero, jovens LGBTQIA+ também passam por um processo de lidar com a aceitação por parte do outro. “Quando não é uma pessoa que tem diretamente uma ligação comigo, é mais fácil”, afirma a psicóloga Andrise Freire, especialista em adolescentes.

Há os casos em que a família acolhe jovens LGBTQIA+, mas, quando existe a frustração dos pais em relação à sexualidade, ela aponta que “não tem como (o jovem) não ter a saúde mental abalada”. “O pai e a mãe sempre têm um ideal de filho, que passa a frustrá-los quando faz as suas (próprias) escolhas. Quando não envolvem as questões sexual e de gênero, parece que é mais aceitável para esses pais: ‘não virou o médico que eu queria, mas virou advogado’. Parece que essa questão sexual potencializa, e aí tem todo um contexto histórico nessas relações”, afirma.

“É uma população que merece atenção. Dados mostram que esse público acaba realmente sendo mais propenso a situações relacionadas ao próprio suicídio”, alerta o médico psiquiatra Rodrigo Freitas da Costa. Sobre os impactos atuais e futuros da pandemia na saúde mental, ele aponta que os grupos mais vulneráveis — e a população LGBTQIA+ é um deles — precisam ser acolhidos e apoiados, assim como os familiares dessas pessoas.

“Precisamos buscar outras formas de nos comunicar, de a nossa rotina ser readaptada, e mudar nossa forma de se perceber e de perceber o outro”, afirma o especialista em Psiquiatria da Infância e da Adolescência e preceptor da residência médica do Hospital Universitário Walter Cantídio, da Universidade Federal do Ceará (HUWC/UFC).

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