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Quando sorrir é o melhor remédio: os benefícios do bom humor para a saúde física e mental
Ciência e Saúde

Quando sorrir é o melhor remédio: os benefícios do bom humor para a saúde física e mental

Especialistas comentam sobre descobertas recentes da Ciência e dão dicas para promover o bem-estar cotidiano
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FORTALEZA, CE, BRASIL, 15.10.2021: Ciencia& Saúde - Matheus Sebbe faz parte do projeto
Foto: (Thais Mesquita/OPOVO) FORTALEZA, CE, BRASIL, 15.10.2021: Ciencia& Saúde - Matheus Sebbe faz parte do projeto "doutores palhaços" do Projeto Nariz.

Desde a Antiguidade, os humores fazem parte da compreensão do estado de saúde do ser humano. Hoje a Ciência compreende o humor como o estado emocional determinado por um conjunto de fatores do bem-estar, podendo estar voltado para tendências positivas ou negativas. Para além de uma gargalhada, o bom-humor é uma expressão de satisfação emocional e de equilíbrio da saúde.

A psiquiatra e psicóloga Karina Saboya explica que falar sobre o bom humor é falar sobre o equilíbrio entre os humores. “A gente não vai nunca deixar de sentir as outras emoções, a gente só tem que saber equilibrar e tentar fazer a positiva ser preponderante”, aponta.

Para isso, é preciso entender que o bom humor está ligado tanto à satisfação consigo mesmo e com a própria vida, quanto, por exemplo, com a presença de momentos alegres, o sentimento de ter um propósito no cotidiano e a manutenção de hábitos saudáveis. Assim, se o bom humor traz equilíbrio para a saúde, a saúde equilibrada também ocasiona o bom humor.

Pesquisas recentes mostram o que o ditado popular já ensinava: às vezes, sorrir é o melhor remédio. Um estudo publicado em 2020 por pesquisadores da universidade de Basel, na Suíça, apontou que pessoas que riem mais frequentemente sofrem menor influência negativa de eventos estressantes. Psicólogos mediram a frequência e a intensidade do riso de 41 pessoas durante duas semanas, junto com suas avaliações de estresse físico e mental. Eles descobriram que quanto mais risadas, menor o estresse relatado. Não importava se as instâncias de riso eram fortes, médias ou fracas em intensidade.

Outros estudos, realizados em 2015 na Coreia do Sul, em 2013 no Reino Unido e em 2009, na Índia e no Canadá, mostram que o riso pode ser um importante agente terapêutico contra o stress e a depressão, além de auxiliar os sistemas cardiovascular, metabólico e imunológico.

Diversos benefícios vêm sendo reconhecidos por cientistas ao redor do mundo. Os efeitos positivos vão desde aumentar a tolerância à dor devido à produção de endorfina e serotonina até diminuir as inflamações e melhorar a ventilação pulmonar. “Por muito tempo, os estudos da saúde focaram nas questões em que a saúde está em falta, nas ações para evitar ou combater doença. É recente esse movimento de olhar para os aspectos que contribuem para o bem-estar que trazem a saúde”, aponta Karina.

“Gastamos muita energia para manter fora de vista nossas verdades constrangedoras, ridículas, maravilhosas e sofríveis, que se olhadas com sendo de humor poderiam causar menos sofrimento”, aponta o psicanalista Yan Victor. Nessa perspectiva, uma pessoa bem humorada é alguém com uma certa facilidade de recusar uma parte do sofrimento ao produzir uma piada sobre si mesma ou uma situação penosa. “Recusa-se o sentimento imposto e o coloca a serviço do riso; uma espécie de teimosia contra o sofrimento, retirando de uma situação difícil algum prazer”, expõe.

FORTALEZA, CE, BRASIL, 15.10.2021: Ciencia& Saúde - Matheus Sebbe faz parte do projeto
FORTALEZA, CE, BRASIL, 15.10.2021: Ciencia& Saúde - Matheus Sebbe faz parte do projeto "doutores palhaços" do Projeto Nariz. Matheus brinca com o reflexo no vidro.

Bom humor também é conexão com o outro

No dia a dia, Matheus Sebbe e os "doutores palhaços" do Projeto Nariz, da Universidade de Fortaleza (Unifor), mudam o dia a dia de hospitais em Fortaleza. Atuando como palhaçoterapeuta, o dentista entende que "o bom humor é a quebra positiva do cotidiano".

"Nossa intenção não é fazer rir, mas promover o bom humor por meio da quebra da neutralidade do dia a dia", afirma. É a quebra do comum, da rotina a qual estamos acostumados para uma vivência que traga prazer. "O riso é uma das consequências, mas o principal é a conexão com as pessoas."

Outra dimensão que se destaca para o doutor "Cadu Marmota", como se apresenta quando está de nariz vermelho e maquiagem, é a possibilidade de reestabelecer a autonomia de quem está sendo cuidado. "Numa rotina de tratamento de uma doença, a maior parte do tempo você tem que seguir recomendações, mesmo que não queira fazer um exame ou comer naquela hora", pontua. "Quando a gente chega, damos a oportunidade de escolha de rir ou não rir. E mesmo não rindo, a pessoa já fica mais bem humorada."

E não são apenas os pacientes que terminam o dia beneficiados pelo bom humor. "O alvo é a rotina geral do hospital. As rotinas de toda a equipe de saúde, do segurança, da faxineira, da acompanhante, da recepcionista, de todo mundo que está ali", aponta Sebbe. "E muda a gente também."

Na percepção dele, para se tornar palhaço é necessário muita autocompreensão e autoaceitação. "A gente precisa fazer isso para externar características nossas e as pessoas rirem com a gente. Me torna uma pessoa mais compreensiva e mais paciente com outros porque eu tive que me entender."

Como lembra o Instituto do Cérebro de Brasília, estudos revelam que o senso de humor está associado a outras virtudes que facilitam as interações, como é o caso da empatia. Além disso, nosso estado de felicidade é um fenômeno de rede social, ou seja, está associado ao bem estar das pessoas com as quais estamos conectados. Dessa forma, o sorriso e o bom humor podem ser vistos como mecanismos evolutivos para a formação de grupos sociais ao promover sentimentos prazerosos, recompensar os esforços dos outros e encorajar a continuidade da relação social. (Colaborou Mirla Nobre/Especial para O POVO)

Projeto Nariz - Liga Universitária de Palhaçoterapia e Humanização da Universidade de Fortaleza (Unifor)(Foto: Arquivo pessoal)
Foto: Arquivo pessoal Projeto Nariz - Liga Universitária de Palhaçoterapia e Humanização da Universidade de Fortaleza (Unifor)

Após período mais crítico da pandemia, as atividades dos “doutores palhaços”, do Projeto Nariz, retornaram neste mês de outubro, com visita aos hospitais de Fortaleza. “A gente está voltando aos pouquinhos. Alguns hospitais estão abrindo para visitação, mas com algumas restrições para não lotar muito devido às medidas preventivas contra a Covid-19. Estamos retornando no Hospital Luís França, por exemplo, com limitação de seis palhaços por visita. Estamos voltando para a nossa imensa felicidade de poder continuar a fazer esse trabalho”. (Colaborou Mirla Nobre/Especial para O POVO)

E o mau humor? Nem só de satisfação se faz a vida

Tem dias em que a gente parece levantar da cama com o pé esquerdo ou algo indesejado acontece e muda o humor do dia todo. Uma situação desagradável pode puxar insatisfações que guardamos, e o momento de mau humor vai se prolongando. Todo mundo passa por isso de vez em quando, afinal, nem só de satisfação se faz a vida. Mas e aí? Podemos mudar? Devemos nos preocupar com o mau humor que não passa?

"O mau humor é a quebra negativa, é o descontentamento. Geralmente, quando uma expectativa não é atendida", aponta Matheus Sebbe. "É esse momento em que não conseguimos aceitar percalços da vida de uma forma mais natural ou com uma visão mais otimista."

Além de fatores ambientais, questões do próprio organismo podem estar relacionadas. Dores, desconfortos e sintomas de doenças aumentam a irritabilidade tanto quanto fatores genéticos. Em 2011, um estudo da Universidade de Michigan concluiu que a quantidade de uma substância que faz a comunicação entre os neurônios (o neuropeptídeo Y) afeta a forma como vemos o mundo. Segundo os cientistas, quem tem menos NPY tende a ter maior responsividade a estímulos negativos e tem dificuldades em lidar com situações estressantes.

A dopamina, serotonina e adrenalina são outros neurotransmissores importantes, pois regulam o humor e dão sensação de bem-estar e felicidade. Sua produção e liberação também é influenciada por aspectos endógenos (genética, neurotransmissores cerebrais, hormônios e glândulas endócrinas, saúde física e biótipo). Por isso, a depender desses fatores algumas pessoas são mais predispostas ao mau humor que outras.

"Isso, entretanto, não quer dizer que essa pessoa vai estar sempre mal humorada. O bom humor é uma potência que podemos treinar e desenvolver", ressalta Karina Saboya. "Uma questão importante é observar por quanto tempo esse mau humor, essa insatisfação permanece. A distimia é uma forma leve e crônica de depressão que pode se manifestar e existem maneiras de tratar."

Como dar uma força para o bom humor no cotidiano

Ainda que seja impactado por esse mosaico de ingredientes, o bom humor pode ser estimulado

Criar momentos prazerosos

Se o bom humor é o resultado de um conjunto de fatores que tornam os dias mais agradáveis, nada mais pertinente que buscar esses momentos em meio à rotina. “Trazer ou resgatar para a vida aquelas atividades que gostamos, por mais simples que sejam, nos ajuda a ter uma vida mais feliz e mais satisfeita”, pontua o palhaçoterapeuta Matheus Sebbe.

Experimentar o riso

Da infância à vida adulta, a maioria das situações leva a entender que pessoas adultas e respeitadas devem ser pessoas sérias. Com isso, nos fechamos para as possibilidades de rir. “Faço um convite a experimentarmos pequenas gracinhas, buscarmos o que nos toca risonhamente e talvez deixar um pouco de nos levarmos tão a sério”, chama o psicanalista Yan Victor.

“Quarteto da felicidade”

As sensações de bem-estar e prazer são produzidas nos seres humanos por quatro principais hormônios: serotonina, endorfina, ocitocina e dopamina. Especialistas recomendam ações diárias que auxiliam na produção equilibrada dessas substâncias do nosso sistema endócrino e hábitos que podem dar aquela força no dia a dia. Dentre elas, estão refeições balanceadas, boa noite de sono e exercícios físicos regulares.

Humor na história da Medicina ocidental

A teoria humoral

Considerado pai da Medicina ocidental, Hipócrates constituiu o principal corpo de explicação racional da saúde e da doença entre o século IV a.C. e o século XVII. A condição de saúde dos seres humanos seria mantida pelo equilíbrio entre quatro humores: sangue, fleuma, bílis amarela e bílis negra. Cada um teria diferentes qualidades e seriam produzidos ou alterados pelos alimentos assimilados pelo organismo.

Galeno e os temperamentos

Para o médico e filósofo romano, cada pessoa já nasceria com uma certa combinação dos quatro humores e na maioria dos casos haveria a predominância de um ou dois humores. Isso contribuiria tanto para a formação de tipos físicos diferentes como de personalidades diferentes. Com as descobertas da Medicina, essa concepção de humor foi deixada de lado.

O humor na psicanálise

No início do século XX, Sigmund Freud, o pai da psicanálise, estudou os chistes e sua relação com o inconsciente. Para ele, o humor é um mecanismo de defesa com o objetivo de proteger a pessoa de prováveis dores, sofrimentos e decepções.

Palhaçoterapia

A partir dos anos 1970, a presença de “doutores da alegria” começou a se difundir. Com base em achados científicos sobre os benefícios físicos e emocionais do riso e do bem-estar, passaram a ocupar as unidades de saúde. Mais que proporcionar sorrisos, seu objetivo é humanizar os ambientes hospitalares.

Psicologia positiva e as forças de caráter

Essa vertente da Psicologia, desenvolvida no final da década de 1990, foca nos elementos que podem trazer bem-estar. Nesse sentido, entende-se o bom humor como uma força da personalidade, bem como uma força do grupo social que está presente em todas as pessoas e pode ser exercitada.

 

Ao longo da vida

Pesquisadores descobriram um grupo de neurônios na amígdala — um importante centro de processamento emocional no cérebro — que permanece em um estado de desenvolvimento ao longo da vida. A descoberta abre novos caminhos para podermos manter nossas respostas emocionais flexíveis.

 

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