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Incontinência urinária: uma realidade para 5% da população mundial
Ciência e Saúde

Incontinência urinária: uma realidade para 5% da população mundial

Queixa é mais comum entre pacientes com idade avançada e tem maior incidência também entre mulheres. Profissionais explicam o porquê de vazamentos involuntários de urina não serem algo natural
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incontinencia urinaria (Foto: GETTY IMAGES)
Foto: GETTY IMAGES incontinencia urinaria

 

 

Incontinência urinária é mais uma doença invisibilizada que se tornou problema de saúde pública. A condição é definida por qualquer perda involuntária de urina. Ou seja, se um paciente relata que, em determinadas circunstâncias, perde xixi sem querer, independentemente de qualquer exame físico ou de qualquer exame complementar, isso já pode ser diagnosticado como sintoma de incontinência urinária.

A próxima segunda-feira, 14 de março, é a data escolhida para disseminar a conscientização da doença que afeta 5% das pessoas no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), sobretudo mulheres. Todos os anos, profissionais da urologia se unem em campanhas para reafirmar que perder urina não é algo normal e que todos precisam, sim, falar sobre incontinência urinária.

Dados divulgados pelo Ministério da Saúde em 2020 revelaram que tratamentos cirúrgicos para tratar a incontinência urinária diminuíram 60% em relação ao ano anterior. Essa redução se tornou mais uma alavanca que impulsiona a necessidade da discussão sobre a doença. Com o início da pandemia de Covid-19, o tratamento de várias enfermidades apresentou baixas consideráveis, com leitos dedicado à infecção e adiamentos e cancelamentos de cirurgias elegíveis. O cenário está se normalizando agora. 

 

incontinencia urinaria(Foto: GETTY IMAGES)
Foto: GETTY IMAGES incontinencia urinaria

 

Para além do estigma do "xixi na cama" infantil, a incontinência pode ocorrer tanto em crianças como adultos, jovens e idosos, mas há tendência acentuada de aumento em pessoas com idade mais avançada. Dependendo da faixa etária do paciente, existem causas predominantes. “É uma queixa que não é incomum no consultório médico, embora muitos pacientes tenham incontinência urinária e não procuram tratamento para isso”, fala o médico urologista Rommel Regadas.

Em contraste com o número de queixas, ainda observa-se que a procura por ajuda médica quando há perda de urina é muito baixa. Muitas vezes, diz a médica ginecologista e especialista em uroginecologia Sara Arcanjo, o consultório dela precisa realiza espécie de busca ativa para identificar pacientes afetadas pela condição.

"Perguntamos à pessoa sobre os sintomas, porque, às vezes, muitos se sentem constrangidos ou acham que perder urina é normal com a idade, que todo mundo perde; e é aí que começamos a informar que não, não é normal e que existe tratamento", afirma a médica.

"Começamos a informar que não, não é normal e que existe tratamento" Sara Arcanjo, médica ginecologista e especialista em uroginecologia

 

 

Tipos de incontinência urinária 

Incontinência urinária de esforço: é aquela perda de urina que acontece após um esforço realizado pela paciente, como, por exemplo, tossir, espirrar ou fazer uma atividade física.

Incontinência urinária de urgência: é quando ocorre a perda urinária associada a um sintoma de urgência. Ou seja, o paciente sente um desejo súbito de urinar que não dá para adiar. Em alguns momentos, ele não consegue chegar ao banheiro a tempo e acaba perdendo um pouco de urina.

Incontinência urinária mista: é a mistura dos dois tipos referidos anteriormente.

Existem também outros tipos de perda de urina associadas ao pós-cirúrgico e perdas de urina insensíveis que precisam ser avaliadas de maneira mais aprofundada.

 

 

O estigma atrelado à condição

Mauro Klein, 47 anos, relata que a ausência de controle urinário foi o que mais o incomodou após sofrer um acidente de moto há 22 anos. Com a queda, ele foi diagnosticado com um trauma raquimedular (TRM) — tipo de lesão da medula espinhal —, motivo pelo qual teve os movimentos da parte inferior do corpo comprometidos.

Ele percebeu que algo estava diferente ao observar as enfermeiras que o acompanhavam e os cuidados redobrados em perguntas direcionadas pela namorada. “O fato de não caminhar não me incomodava tanto. O que realmente me incomodava era não ter controle urinário e fecal”, diz.

 

incontinencia urinaria(Foto: DIVULGAÇÃO)
Foto: DIVULGAÇÃO incontinencia urinaria

 

Antes do acidente, Mauro nunca tinha ouvido falar em incontinência urinária. Logo após descobrir que não teria mais o controle da bexiga, a sua primeira reação foi o preconceito com o cateterismo ou sondagem, procedimento em que é inserido um cano flexível por dentro da uretra para realizar o esvaziamento da bexiga de forma artificial. “No começo, eu não queria me sondar. Fui convencido pelo meu médico, que me informou que, se eu continuasse esvaziando a bexiga apenas a pressionando, poderia ter problemas no futuro”, conta.

Hoje em dia, além da sondagem, ele também utiliza a aplicação de botox na bexiga a cada sete meses. A toxina botulínica paralisa o músculo do órgão urinário, impedindo-o de se contrair involuntariamente e, consequentemente, evitando as perdas de xixi.

Apesar do estigma que envolve a discussão sobre incontinência urinária, Mauro conta que o tópico é recorrente entre pessoas que adquiriram a condição após uma lesão medular. “Cada um ajuda o outro, falamos sobre sondagem e, em nosso meio, falar sobre isso é bem tranquilo. Mas, ao mesmo tempo, é uma das coisas que mais me incomodam”, ressalta.

 

 

Prevalência em pessoas com vagina 

Em questão de números, cerca de 45% das mulheres e 15% dos homens acima de 40 anos perdem urina de maneira involuntária, de acordo com a Sociedade Brasileira de Urologia (SBU); homens trans e pessoas não binárias com órgãos sexuais femininos também são mais afetados.

Para a ginecologista Sara Arcanjo, a prevalência da incontinência urinária em pessoas com características sexuais femininas se dá tanto por questões anatômicas da uretra feminina como por questões relacionadas ao parto e aos hormônios. "As mudanças que acontecem no corpo da mulher durante a gestação, durante o parto e durante a pós-menopausa favorecem o surgimento da perda de urina", explana a profissional.

 

incontinencia urinaria(Foto: DIVULGAÇÃO)
Foto: DIVULGAÇÃO incontinencia urinaria

 

Para além da idade, o histórico familiar de problemas de bexiga pode ser um fator genético associado à perda de urina. Aproximadamente 5% a 10% das mulheres apresentam algum tipo de incontinência urinária. Essa prevalência vai aumentando com o passar da idade, mas também existem alguns outros fatores de risco associados ao surgimento da doença. "Obesidade, constipação intestinal, tabagismo e pegar muito peso (em exercícios ou na vida cotidiano) são outras ações que também estão associadas ao surgimento desses sintomas", diz Arcanjo.

Os homens também podem apresentar incontinência urinária de esforço, mas isso normalmente ocorre em pacientes que foram submetidos a uma cirurgia de próstata, como a prostatectomia radical para retirada de um câncer, por exemplo. No caso da perda de urgência, a causa geralmente é a idade mais avançada ou uma hiperplasia prostática benigna que, em outras palavras, trata-se do aumento natural da próstata.

 

 

Tratamentos para incontinência

Em relação ao tratamento, as opções dependem de cada caso. De uma maneira geral, o processo vai requerer algumas mudanças comportamentais e alimentares, fisioterapia do assoalho pélvico, medicamentos e até mesmo cirurgia.

Durante o exame ginecológico especializado, os profissionais conseguem avaliar todo o trato genital e urinário de pessoas com vagina. Esse tipo de exame pode necessitar de complementação de um estudo urodinâmico que consegue descrever, de uma maneira mais aprofundada, o funcionamento da bexiga. “Nesse exame conseguimos detectar o tipo de incontinência e o grau. Sabendo desses detalhes, conseguimos decidir qual é o melhor tratamento para cada paciente”, diz a médica Sara Arcanjo.

Para homens, se a causa da perda urinária é por esforço, o tratamento inicia com fisioterapia. Se persistirem os sintomas, existe a indicação de fazer um tratamento cirúrgico para colocar um tipo de suporte para a uretra ou um esfíncter artificial. Já se a causa for uma perda urinária causada por hiperplasia prostática benigna, o tratamento indicado é o medicamentoso. "Se não houver uma boa resposta ao tratamento, também existe um tratamento cirúrgico minimamente invasivo de colocação de um tipo de chip parecido como um 'marca-passo de bexiga’ que controla essa urgência miccional", explica o médico Rommel Regadas, que também é professor das faculdades de medicina das universidades Federal (UFC) e Estadual (Uece) do Ceará.

 

 

Prevenção

Para a prevenção da incontinência, as dicas giram em todo de hábitos saudáveis, como:

  • Evitar o sobrepeso e o tabagismo;
  • Manter bons hábitos intestinais;
  • Exercitar os músculos do assoalho pélvico;
  • Controlar infecções urinárias;
  • Não prender o xixi por muito tempo;
  • Esvaziar a bexiga a cada duas ou três horas;
  • No caso de mulheres na pós-menopausa, utilizar creme vaginal com hormônio.

 

 

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