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A busca por um novo recomeço
Ciência e Saúde

A busca por um novo recomeço

Edição Impressa
Tipo Notícia

Alegre, cativante e inspiradora, é assim que AS (preferimos usar apenas suas iniciais), de 41 anos, se define. Criada no bairro Bom Jardim, em Fortaleza, foi na gastronomia que ela encontrou o seu verdadeiro amor. Faz um pouco de tudo, e os seus biscoitos encantam a todos que os experimentam.

Por trás de todo esse talento e um sorriso cativante, AS está há seis anos se recuperando de uma dependência química. Foram 12 anos consumindo cocaína, relação essa que foi ficando mais intensa com o passar dos anos, tornando-se diária.

O primeiro contato com a droga aconteceu no seu aniversário de 22 anos, quando um amigo de infância a chamou para experimentar "algo novo e maneiro". A droga era barata, R$ 10. "Por que não?". O acesso também era fácil; aliás, "aqui no bairro é fácil de encontrar".

"Eu usava cocaína para preencher um vazio que nem eu sei qual é. A droga me trazia uma euforia, uma alegria que me fazia esquecer de tudo. Quando o efeito passava, a realidade voltava de uma vez", lembra.

Todo o dinheiro da cozinheira ia para o vício. Quando não tinha, ela chegou a roubar a sua mãe, irmã e seu pai. O momento de pedir ajuda foi quando AS percebeu que seu corpo não aguentava mais e que não havia mais espaço para a vontade de usar.

"Cheguei a gastar todo o meu décimo terceiro em um único dia, sem me importar com minha filha ou minha família. Eu me considerava uma 'noia caseira', pois usava sozinha, em casa, o que talvez tenha mascarado a gravidade por um tempo", enxerga.

O apoio inicial veio de sua mãe, mas foi só em uma comunidade terapêutica, que AS conseguiu largar o vício. A recuperação é diária e a abstinência foi muito forte, marcada por crises intensas. Durante esses últimos anos, ocorreram recaídas, muitas vezes ligadas a gatilhos.

"A dependência química é uma doença, como diabetes ou hipertensão, eu não posso usar nada. Nunca tive problemas com álcool, mas sei que se eu tomar uma cerveja hoje, o gatilho para a cocaína será ativado. Hoje busco me apegar à minha espiritualidade", explica.

Olhando para trás, AS se questiona o que a levou ao vício, mesmo relatando o local violento onde viveu, vendo amigos de infância que brincavam com ela se tornarem chefes de facção e, por consequência, serem presos ou mortos, ou os desafios diários marcados por sua raça e sexualidade.

"Minha mãe é católica, sempre fui à igreja e ela sempre me orientou sobre o certo e o errado. Tive uma boa estrutura familiar. Será que meu gatilho foi apenas a curiosidade apresentada por um amigo?", se questiona.

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