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Gêmeos digitais: pode a tecnologia ajudar na sustentabilidade do planeta?
Ciência e Saúde

Gêmeos digitais: pode a tecnologia ajudar na sustentabilidade do planeta?

Em meio à preparação para a COP 30, réplicas virtuais de biomas, alimentadas por dados em tempo real, prometem prever desastres e orientar políticas de sustentabilidade
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Torre de monitoramento na Amazônia (Foto: Divulgação/Programa LBA - INPA)
Foto: Divulgação/Programa LBA - INPA Torre de monitoramento na Amazônia

Em tempo de preparação para a COP 30, há uma preocupação: como a tecnologia digital pode ajudar no monitoramento do meio ambiente? Se, de um lado, há uma grande demanda por água e energia para alimentar data centers, de outro, podem ser criados novos instrumentos para gerar informações e tentar evitar catástrofes naturais.

Dentro deste contexto, um projeto ambicioso está sendo implantado na Floresta Amazônica e no Cerrado, com torres de monitoramento e a criação de "gêmeos digitais", ou seja: a implantação de réplicas virtuais de biomas complexos, com alta fidelidade. Esse projeto foi gerado por uma rede de cooperação técnica entre universidades e entidades, inspirada nas missões Apollo, realizadas pela NASA, que cunhou o termo "gêmeo digital" em 2010.

A ideia da criação do Gêmeo Digital da Terra, iniciativa da NASA, tinha a proposta de monitoramento em tempo real das mudanças climáticas para a tomada de decisões adaptativas. O trabalho no Brasil, ao simular cenários globais de uso da terra, energia e agricultura, pretende contribuir com governos e empresas para traçar caminhos mais sustentáveis.

O conceito de "gêmeos digitais" envolve a ideia de criação de réplicas virtuais de objetos, processos ou sistemas existentes no mundo concreto, alimentadas por dados de sensores em tempo real para monitorar, analisar e simular o comportamento de sua contraparte física. Para isso, são utilizados sensores, inteligência artificial (IA) e modelos preditivos para criarem representações virtuais de ambientes reais. Essa tecnologia permite analisar mudanças bioquímicas existentes na natureza e pode ajudar a prever possíveis catástrofes naturais.

As pesquisas combinam ciência, tecnologia e inovação, com a utilização de ferramentas digitais de monitoramento para avaliar as mudanças climáticas e evitar a degradação dos biomas. A professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Cristiane Pimentel, coordenadora do projeto Gêmeos Digitais, e membro sênior do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), destaca que as réplicas digitais permitem simular cenários, antecipar desastres e apoiar decisões em tempo real. O projeto foi apresentado durante o evento Futurecom, em São Paulo.

A implantação de gêmeos digitais possui três fases: a primeira é offline, com os dados inseridos manualmente; na segunda (chamada de shadow), sensores e algoritmos de IA internalizam e processam informações para apoiar a tomada de decisão; e a terceira fase corresponde ao Digital Twin completo, fazendo a integração entre mundos real e virtual.

Parcerias estratégicas estão sendo criadas para a aplicação da tecnologia: está em andamento um projeto com a Hidrelétrica Itaipu Binacional, com automação preditiva; programas para antecipar riscos de enchentes em grandes centros urbanos como São Paulo e Porto Alegre. Já em Curitiba, o sistema tem sido usado para planejamento urbano, com foco em transporte público e mobilidade sustentável.

Na avaliação da professora, a tecnologia pode ser estendida a áreas com desafios ambientais críticos, como o monitoramento do desmatamento na Amazônia. "Podem ser oferecidas análises preditivas de áreas sob risco de degradação", acrescenta. Cristiane conta que essa tecnologia pode ser aplicada em diferentes áreas. Em barragens, por exemplo, existem grupos de estudo trabalhando na perspectiva de evitar desastres como os que ocorreram em Minas Gerais. Nesse segmento, a exigência de gêmeos digitais passou a ser um tema de segurança no trabalho, assim como em questões para troca de equipamentos.

No Ceará, ela afirma haver projetos interessantes, desenvolvidos por grupos da Universidade Federal do Ceará (UFC) com usinas eólicas no Pecém, que geram créditos de carbono. Apesar dessas ações, segundo Cristiane, ainda há muito problema no entendimento do que é o gêmeo digital: "ele precisa ter três fases, e essa terceira, de integração, é a que mais demora a ser implementada", acrescenta.

A professora ressalta que a tecnologia não só pode ajudar o planeta, como deve ser utilizada para tal finalidade; assim, universidades, indústrias e governos precisam pensar suas estratégias. No caso do Rio Grande do Sul e São Paulo, por exemplo, depois dos problemas de enchentes, a tecnologia passou a ser aplicada para análises de esgotos e efluentes a fim de evitar alagamentos; em Curitiba, as iniciativas visam questões de mobilidade urbana. Enfim, há várias possibilidades de aplicação da tecnologia, que esbarram, normalmente, no custo para sua implantação e no tempo para o retorno efetivo dos projetos.

*A jornalista viajou a São Paulo a convite do IEEE.

 

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